É erradamente
aceito por muitos liberais (isto é, libertários) que a maioria, se não todos,
os problemas sociais podem ser lassiez-faireresolvidos pelo mercado. Mas é
claro que o “mercado” não pode resolver magicamente todos os nossos problemas.
Que fique
claro, desde já, que não há dúvida de que a melhor maneira de obter progresso
social é ter uma economia de livre mercado. No entanto, o livre mercado não é
uma solução para os problemas, por si só, mas sim o que nos dá a oportunidade
de encontrar as nossas próprias soluções para os nossos próprios problemas, procurando
sempre o caminho com maior retorno.
Frédéric
Bastiat escreveu na sua obra, A Lei, que: “Em qualquer parte do horizonte
científico em que coloque o ponto de partida das minhas investigações,
invariavelmente chego ao seguinte: a solução do problema social está na
liberdade”
Ao falar sobre
as virtudes do mercado, tendemos a esquecer que os mercados não têm virtudes,
apenas as pessoas as têm. Como Murray Rothbard escreveu, “É esquecido que o
mercado não é um tipo de entidade viva que toma boas ou más decisões, mas sim
um rótulo para pessoas e as suas interações voluntárias. […] O mercado é ação
individual.
“A
tendência para “O que deve Governo fazer?”
Em todas as
crises, os políticos e intelectuais presumiram sistematicamente que se devia
fazer alguma coisa. Assim, quando os liberais enfatizam a importância de não
intervir violentamente na ordem do livre mercado por causa das consequências
prejudiciais, mas ainda assim invisíveis, de intervenção do Estado, são muitas
vezes acusados de favorecer a inação. Esta é uma concepção errada do argumento
liberal. O livre mercado não é superior porque oferece soluções. É superior
porque tem por base a liberdade, que permite aos indivíduos encontrar novos
caminhos que se encontram em harmonia com os interesses dos seus semelhantes.
Claro que existem muitos problemas e abusos com o mercado, mas os empresários –
se não forem impedidos de entrar no mercado pelos governos – procuram resolver
estes problemas na procura de lucros. Através destes empresários, o mercado
torna-se um processo que tende a satisfazer as necessidades mais urgentes dos
consumidores.
Para que fique
claro, o liberalismo – usado aqui para denotar a filosofia do laissez-faire –
não deve ser considerado como o oposto utópico do socialismo. Não é uma receita
mágica que garante sempre soluções perfeitas para todos os problemas. Os
socialistas gostam de imaginar que os liberais acreditam que o livre mercado é
remédio para todos os males. Por outras palavras, acham que o liberalismo é um
reflexo de espelho do socialismo. Não é. O verdadeiro liberalismo não promete a
perfeição, nem sequer promete uma solução. Existirão sempre problemas. O nosso
objetivo deve ser encontrar a melhor maneira de melhorar uma situação, não
alcançar uma fantasia ideal. Quando surge um problema social e alguém pergunta
a um liberal o que deve ser feito, ele instintivamente responde que devemos
libertar os mercados das mãos do estado, que devemos liberalizar, ou que
devemos promover a desregulamentação. Mas essas propostas não são soluções para
os nossos problemas de forma alguma, são apenas um passo necessário para
permitir que as pessoas sejam livres de resolver problemas. Fingindo que “o
mercado” é a solução que “nós” devemos adotar, muitos liberais são vítimas da
falácia das decisões top-down (de cima para baixo) e negam a natureza
policêntrica dos mercados. Ao chamar “o mercado” uma solução, criamos a ilusão
de que o livre mercado é apenas um outro tipo de política governamental, onde
os governantes nos oferecem uma solução. Mas as verdadeiras soluções são
oferecidas por indivíduos livres, pelo inovador livre, o trabalhador livre, o
capitalista livre, e o empresário livre. Soluções para problemas não são
oferecidas pelo mercado, são oferecidas no mercado. Como o economista William
Easterly escreveu:
A indústria do
“o que devemos fazer?” não mostra quaisquer sinais de poder vir a “fechar
portas”. Dá-nos, intelectuais públicos, algo para fazer e dá a políticos algo
para recomendar. De forma bem mais positiva, activa o idealismo, muito
bem-vindo, de altruístas que querem fazer do mundo um lugar melhor. Mas os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável podem ser a melhor demonstração, até agora,
de que os planos de acção não conduzem necessariamente à acção, “nós” não somos
necessariamente os mais acertados para agir, e que existem caminhos
alternativos para atingir o progresso. O progresso global tem muito mais a ver
com a defesa do ideal de liberdade humana do que com planos de ação.
Assim, o livre
mercado é uma espécie de metasolução. É a solução para o problema de encontrar
soluções. E é notável que o liberalismo possa ser a única filosofia política
sem um plano minucioso para uma sociedade ideal.
O Mito do “Mercado fornece incentivos”
Como o mercado
não é uma solução, o mercado não dá incentivos. Os importantes economistas
institucionais Acemoglu e Robinson, no seu livro Porque Falham as Nações,
focaram-se principalmente nos “incentivos.” Enquanto que – Moderadamente –
valorizam o capitalismo como uma “instituição inclusiva”, criticam
“instituições extrativas”, porque “não conseguem proteger os direitos de
propriedade ou fornecer incentivos para a atividade económica”. Escreveram ainda:
Como as
instituições influenciam o comportamento e incentivos na vida real, elas forjam
o sucesso ou o fracasso das nações. … Bill Gates, como outras figuras lendárias
da indústria de tecnologia da informação … tinha imenso talento e ambição. Mas,
em ultima análise respondeu a incentivos.
Não há dúvida
alguma de que Porque Falham as Nações é, em grande parte, um bom livro. No
entanto, o apreço de Robinson e Acemoglu por incentivos parece ser
problemático. Em primeiro lugar, assumem que as instituições devem fornecer
“incentivos”. Mas isso é uma falácia construtivista, para usar o conceito de
Hayek. Implicitamente supõe que alguma força externa deve orientar as ações
humanas. Além disso, dá demasiada importância ao top-down approach. Acemoglu,
assim como muitos outros economistas, parece acreditar que alguma coisa – por
exemplo, o governo – deveriam incentivar. Mas o que significa isto de dizer que
o governo, direitos de propriedade ou instituições dão incentivos? Na verdade,
quando usado de forma errada, o termo “incentivo” parece invocar determinismo.
É por isso que Acemoglu escreve que as pessoas ,”em última análise, respondem a
incentivos”, como se uma força misteriosa chamada “incentivo” influenciasse as
escolhas que cada um de nós toma. Incentivos não são algo que possa ser
entendido como independente dos indivíduos, é algo puramente subjectivo.
Um incentivo só
pode ser entendido como a descoberta correta das preferências subjectivas de um
indivíduo, a fim de levá-lo a agir como deseja. Por essa razão incentivos não
são algo que se possa “dar”, mas sim algo que se tem de descobrir. O livre
mercado não “fornece” um incentivo para trabalhar, mas permite que se trabalhe
livremente. O livre mercado não “fornece” um incentivo para investir, mas
permite que um indivíduo use as suas poupanças, com o objectivo de lucrar
servindo o consumidor. Não existe um deus chamado “mercado” que oferece
incentivos para se ser produtivo. No entanto, o mercado é o melhor
enquadramento institucional para criar harmonia entre os planos de um vasto
número de indivíduos – daí o título da magnum opus de Frédéric Bastiat
Harmonies Economiques.
Por serem
livres, as pessoas conseguem entender as preferências de terceiros. Só desta
forma é que as pessoas “dão um incentivo” umas às outras, com o objectivo de
comprometer-se a trocar e melhorar a sua situação. Portanto, as instituições
não dão incentivos, as pessoas é que dão. A frase “o mercado fornece
incentivos” contém o mesmo problema que a frase “o mercado é a solução.” Não é
isso, de todo. O mercado é apenas um quadro institucional em que as pessoas
podem planear livremente. Como Hayek diz numa paródia rap “a pergunta que eu
faço é quem planeia para quem, eu planeio para mim, ou deixo isso para ti?
Quero planos por muitos, não por poucos”.
Conclusão
O Estado
moderno pode ser definido como a instituição que finge ter o monopólio de
soluções para os problemas sociais. Mas visto que o estado funciona como um
monopólio, também se comporta como um monopólio e, por essa razão, explora as
pessoas que tem o intuito de servir. Na verdade, os defensores da acção
governativa estão, implicitamente, a afirmar que os membros da sociedade civil
não são capazes de encontrar as suas próprias soluções, nem capazes de
identificar os problemas. Mas os homens mais competentes não precisam do Estado
para responder aos problemas – precisam , unicamente, de liberdade. Quando
surge um problema, a pergunta certa não é “o que pode o governo ou o mercado
fazer?”, a pergunta certa é “o que posso EU fazer?”.
Tradução: João Pedro de Barros Gomes
Almeida - 2016-02-09 - Mises Portugal
Fonte original: https://mises.org/library/market-doesnt-solve-problems-people-do
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