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terça-feira, 13 de setembro de 2016

O mercado não resolve problemas – as pessoas resolvem

Por Louis Rouanet


É erradamente aceito por muitos liberais (isto é, libertários) que a maioria, se não todos, os problemas sociais podem ser lassiez-faireresolvidos pelo mercado. Mas é claro que o “mercado” não pode resolver magicamente todos os nossos problemas.

Que fique claro, desde já, que não há dúvida de que a melhor maneira de obter progresso social é ter uma economia de livre mercado. No entanto, o livre mercado não é uma solução para os problemas, por si só, mas sim o que nos dá a oportunidade de encontrar as nossas próprias soluções para os nossos próprios problemas, procurando sempre o caminho com maior retorno.

Frédéric Bastiat escreveu na sua obra, A Lei, que: “Em qualquer parte do horizonte científico em que coloque o ponto de partida das minhas investigações, invariavelmente chego ao seguinte: a solução do problema social está na liberdade”

Ao falar sobre as virtudes do mercado, tendemos a esquecer que os mercados não têm virtudes, apenas as pessoas as têm. Como Murray Rothbard escreveu, “É esquecido que o mercado não é um tipo de entidade viva que toma boas ou más decisões, mas sim um rótulo para pessoas e as suas interações voluntárias. […] O mercado é ação individual.

 “A tendência para “O que deve Governo fazer?”

Em todas as crises, os políticos e intelectuais presumiram sistematicamente que se devia fazer alguma coisa. Assim, quando os liberais enfatizam a importância de não intervir violentamente na ordem do livre mercado por causa das consequências prejudiciais, mas ainda assim invisíveis, de intervenção do Estado, são muitas vezes acusados de favorecer a inação. Esta é uma concepção errada do argumento liberal. O livre mercado não é superior porque oferece soluções. É superior porque tem por base a liberdade, que permite aos indivíduos encontrar novos caminhos que se encontram em harmonia com os interesses dos seus semelhantes. Claro que existem muitos problemas e abusos com o mercado, mas os empresários – se não forem impedidos de entrar no mercado pelos governos – procuram resolver estes problemas na procura de lucros. Através destes empresários, o mercado torna-se um processo que tende a satisfazer as necessidades mais urgentes dos consumidores.

Para que fique claro, o liberalismo – usado aqui para denotar a filosofia do laissez-faire – não deve ser considerado como o oposto utópico do socialismo. Não é uma receita mágica que garante sempre soluções perfeitas para todos os problemas. Os socialistas gostam de imaginar que os liberais acreditam que o livre mercado é remédio para todos os males. Por outras palavras, acham que o liberalismo é um reflexo de espelho do socialismo. Não é. O verdadeiro liberalismo não promete a perfeição, nem sequer promete uma solução. Existirão sempre problemas. O nosso objetivo deve ser encontrar a melhor maneira de melhorar uma situação, não alcançar uma fantasia ideal. Quando surge um problema social e alguém pergunta a um liberal o que deve ser feito, ele instintivamente responde que devemos libertar os mercados das mãos do estado, que devemos liberalizar, ou que devemos promover a desregulamentação. Mas essas propostas não são soluções para os nossos problemas de forma alguma, são apenas um passo necessário para permitir que as pessoas sejam livres de resolver problemas. Fingindo que “o mercado” é a solução que “nós” devemos adotar, muitos liberais são vítimas da falácia das decisões top-down (de cima para baixo) e negam a natureza policêntrica dos mercados. Ao chamar “o mercado” uma solução, criamos a ilusão de que o livre mercado é apenas um outro tipo de política governamental, onde os governantes nos oferecem uma solução. Mas as verdadeiras soluções são oferecidas por indivíduos livres, pelo inovador livre, o trabalhador livre, o capitalista livre, e o empresário livre. Soluções para problemas não são oferecidas pelo mercado, são oferecidas no mercado. Como o economista William Easterly escreveu:

A indústria do “o que devemos fazer?” não mostra quaisquer sinais de poder vir a “fechar portas”. Dá-nos, intelectuais públicos, algo para fazer e dá a políticos algo para recomendar. De forma bem mais positiva, activa o idealismo, muito bem-vindo, de altruístas que querem fazer do mundo um lugar melhor. Mas os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável podem ser a melhor demonstração, até agora, de que os planos de acção não conduzem necessariamente à acção, “nós” não somos necessariamente os mais acertados para agir, e que existem caminhos alternativos para atingir o progresso. O progresso global tem muito mais a ver com a defesa do ideal de liberdade humana do que com planos de ação.

Assim, o livre mercado é uma espécie de metasolução. É a solução para o problema de encontrar soluções. E é notável que o liberalismo possa ser a única filosofia política sem um plano minucioso para uma sociedade ideal.

O Mito do “Mercado fornece incentivos”

Como o mercado não é uma solução, o mercado não dá incentivos. Os importantes economistas institucionais Acemoglu e Robinson, no seu livro Porque Falham as Nações, focaram-se principalmente nos “incentivos.” Enquanto que – Moderadamente – valorizam o capitalismo como uma “instituição inclusiva”, criticam “instituições extrativas”, porque “não conseguem proteger os direitos de propriedade ou fornecer incentivos para a atividade económica”. Escreveram ainda:

Como as instituições influenciam o comportamento e incentivos na vida real, elas forjam o sucesso ou o fracasso das nações. … Bill Gates, como outras figuras lendárias da indústria de tecnologia da informação … tinha imenso talento e ambição. Mas, em ultima análise respondeu a incentivos.

Não há dúvida alguma de que Porque Falham as Nações é, em grande parte, um bom livro. No entanto, o apreço de Robinson e Acemoglu por incentivos parece ser problemático. Em primeiro lugar, assumem que as instituições devem fornecer “incentivos”. Mas isso é uma falácia construtivista, para usar o conceito de Hayek. Implicitamente supõe que alguma força externa deve orientar as ações humanas. Além disso, dá demasiada importância ao top-down approach. Acemoglu, assim como muitos outros economistas, parece acreditar que alguma coisa – por exemplo, o governo – deveriam incentivar. Mas o que significa isto de dizer que o governo, direitos de propriedade ou instituições dão incentivos? Na verdade, quando usado de forma errada, o termo “incentivo” parece invocar determinismo. É por isso que Acemoglu escreve que as pessoas ,”em última análise, respondem a incentivos”, como se uma força misteriosa chamada “incentivo” influenciasse as escolhas que cada um de nós toma. Incentivos não são algo que possa ser entendido como independente dos indivíduos, é algo puramente subjectivo.

Um incentivo só pode ser entendido como a descoberta correta das preferências subjectivas de um indivíduo, a fim de levá-lo a agir como deseja. Por essa razão incentivos não são algo que se possa “dar”, mas sim algo que se tem de descobrir. O livre mercado não “fornece” um incentivo para trabalhar, mas permite que se trabalhe livremente. O livre mercado não “fornece” um incentivo para investir, mas permite que um indivíduo use as suas poupanças, com o objectivo de lucrar servindo o consumidor. Não existe um deus chamado “mercado” que oferece incentivos para se ser produtivo. No entanto, o mercado é o melhor enquadramento institucional para criar harmonia entre os planos de um vasto número de indivíduos – daí o título da magnum opus de Frédéric Bastiat Harmonies Economiques.

Por serem livres, as pessoas conseguem entender as preferências de terceiros. Só desta forma é que as pessoas “dão um incentivo” umas às outras, com o objectivo de comprometer-se a trocar e melhorar a sua situação. Portanto, as instituições não dão incentivos, as pessoas é que dão. A frase “o mercado fornece incentivos” contém o mesmo problema que a frase “o mercado é a solução.” Não é isso, de todo. O mercado é apenas um quadro institucional em que as pessoas podem planear livremente. Como Hayek diz numa paródia rap “a pergunta que eu faço é quem planeia para quem, eu planeio para mim, ou deixo isso para ti? Quero planos por muitos, não por poucos”.

Conclusão

O Estado moderno pode ser definido como a instituição que finge ter o monopólio de soluções para os problemas sociais. Mas visto que o estado funciona como um monopólio, também se comporta como um monopólio e, por essa razão, explora as pessoas que tem o intuito de servir. Na verdade, os defensores da acção governativa estão, implicitamente, a afirmar que os membros da sociedade civil não são capazes de encontrar as suas próprias soluções, nem capazes de identificar os problemas. Mas os homens mais competentes não precisam do Estado para responder aos problemas – precisam , unicamente, de liberdade. Quando surge um problema, a pergunta certa não é “o que pode o governo ou o mercado fazer?”, a pergunta certa é “o que posso EU fazer?”.

Tradução: João Pedro de Barros Gomes Almeida - 2016-02-09 - Mises Portugal
Fonte original: https://mises.org/library/market-doesnt-solve-problems-people-do

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