Por Murray N.
Rothbard,
Karl Marx, como o
mundo sabe, nasceu em 1818 em Tréveris, uma venerável cidade na região da
Renânia, quando o local ainda pertencia à Prússia. Marx era filho de um
ilustre jurista e neto de um rabino. Efetivamente, o pai e a mãe de Marx
eram descendentes de rabinos. O pai de Marx, Heinrich, era um
racionalista liberal que não teve problema algum com sua conversão forçada ao
luteranismo, a religião oficial, em 1816. O que é pouco conhecido é que,
ainda criança, Karl Marx, já batizado, era um dedicado cristão.
Em
seus ensaios escritos 1835, época de sua formatura no Gymnasium, o jovem Marx já apresentava
indícios de como seria seu desenvolvimento futuro. Seu ensaio acerca do
tópico "Sobre a União dos Fieis a Cristo" apresentava um conteúdo
evangélico ortodoxo, mas também continha alusões ao fundamental tema da
"alienação" que mais tarde ele encontraria em Hegel. A discussão
de Marx sobre a "necessidade da união" a Cristo enfatizava que esta
união colocaria um fim à tragédia da suposta rejeição de Deus aos homens não
predestinados, como pregam os protestantes. Em outro ensaio,
"Reflexões de um Jovem Sobre a Escolha de uma Profissão", Marx
expressava preocupação quanto ao seu próprio "demônio da ambição", a
grande tentação que ele sentia em "atacar Deus com veemência e amaldiçoar
a humanidade".
Tendo
primeiro frequentado a Universidade de Bonn e depois a prestigiosa nova
Universidade de Berlim para estudar Direito, Marx rapidamente se converteu ao
ateísmo militante, mudou de curso para filosofia e se juntou a um Doktorklub
formado por jovens hegelianos (de esquerda), dos quais ele rapidamente se
tornou líder e secretário geral.
A
guinada ao ateísmo rapidamente deu ao "demônio da ambição" de Marx o
total controle sobre sua mente. Particularmente reveladores sobre o
caráter tanto do Marx jovem quanto do Marx adulto são os vários poemas que ele
escreveu, a maioria deles perdidos até serem recuperados em anos recentes.[1]
Quando os historiadores discutem estes poemas, eles tendem a desprezá-los como
sendo rudimentares anseios românticos; mas o problema é que estes poemas são
coerentes demais com as doutrinas sociais e revolucionárias de Marx para serem
negligentemente descartados. Seguramente temos aqui uma situação em que
um Marx unificado (o jovem e o velho) é revelado de maneira vívida e incisiva.
Assim, em seu poema "Sentimentos", dedicado à sua namorada de
infância e futura esposa Jenny von Westphalen, Marx expressava sua megalomania
e sua enorme sede de destruição:
O
paraíso eu abrangeria,
Traria
o mundo para mim;
Vivendo,
odiando, planejaria
Que
minha estrela brilhasse forte até o fim.
E
...
Mundos para sempre eu destruiria,
Já
que não posso criar nenhum outro mundo;
Já
que meu clamor ninguém perceberia.
Esta
é uma clássica expressão do suposto motivo do ódio e da rebeldia de Satanás
contra Deus.
Em
outro poema, Marx escreve sobre seu triunfo após ele ter destruído o mundo
criado por Deus:
Com
desdém lançarei meu desafio
Bem
na face do mundo,
E
verei o colapso desse pigmeu gigante
Cuja
queda não extinguirá meu ardor.
Então
vagarei semelhante a um deus,
Vitorioso,
pelas ruínas do mundo
E,
dando às minhas palavras uma força dinâmica,
Sentir-me-ei
igual ao Criador
E
em seu poema "Invocação de Alguém em Desespero",
Marx escreve:
Estabelecerei
o meu trono muito acima de todos
Frio
e monstruoso será o seu topo
O
pavor supersticioso será a sua base
E
a negra agonia será o seu condutor.[2]
O
tema satânico é explicitamente apresentado em seu poema "O Violinista", dedicado a seu pai:
Os
vapores infernais elevam-se
E
preenchem o meu cérebro
Até
eu enlouquecer e meu coração
Se
transformar dramaticamente.
Vê
esta espada?
O
príncipe das trevas
Vendeu-a
para mim.
E
Com
Satanás fiz meu acordo,
Ele
escreve as partituras e marca o compasso;
Eu
toco e canto a marcha da morte
Com
rapidez e desembaraço.
Particularmente
instrutivo é o inacabado e longo drama poético escrito por Marx em sua
juventude, chamado Eulanem, uma Tragédia. No decorrer
deste drama, o herói, Eulanem, realiza um notável monólogo, verbalizando
prolongadas invectivas e exsudando ódio pelo mundo e pela humanidade, um ódio à
criação e uma apologia à total destruição do mundo.
Eis
como o protagonista Eulanem verbaliza sua fúria:
Arruinado,
arruinado. Meu tempo esgotou-se.
O
relógio parou, a casa do pigmeu desmoronou.
Breve
apertarei a eternidade ao peito,
E
breve bradarei gigantescas maldições sobre a humanidade.
Ah!
Eternidade! Ela é a nossa eterna mágoa ?
Nós
próprios automatizados, cegamente mecânicos,
Feitos
para sermos o calendário louco do Tempo e do Espaço,
Não
tendo propósito, a não ser o de acontecer, o de sermos arruinados,
Para
que haja algo para ser arruinado ?
Se
existe algo que nos devora,
Entregar-me-ei
para ser engolido por ele, embora deixando o mundo em ruínas —
Este
mundo que se avoluma entre mim e o Abismo,
Eu
o reduzirei a pedaços com as minhas contínuas maldições.
Lançarei
meus braços ao redor da sua rude realidade:
Abraçando-me,
o mundo morrerá silenciosamente.
E
então mergulhará no nada absoluto,
Extinto,
sem qualquer vida — isso sim seria realmente viver!
E
...
o mundo plúmbeo nos aprisiona,
E
nós estamos acorrentados, despedaçados, vazios, apavorados,
Eternamente
acorrentados a este bloco de mármore do Ser ...
e
nós —
Nós
somos os macacos de um Deus frio.[3]
Tudo
isso revela aquele espírito que frequentemente parece animar o ateísmo
militante. Ao contrário do ateísmo não-militante, o qual expressa uma
simples descrença na existência de Deus, o ateísmo militante parece crer
implicitamente na existência de Deus, tendo como objetivo supremo odiá-Lo e
iniciar uma guerra para destruí-Lo. Tal espírito foi claramente revelado
na resposta do ateu militante Bakunin ao famoso comentário teísta do deísta
Voltaire: "Se Deus não existisse, seria necessário criá-Lo." Ao
qual o lunático Bakunin respondeu: "Se Deus existisse, seria necessário
destruí-Lo". Foi este ódio a Deus como sendo criador maior do que
ele próprio o que aparentemente inspirou Karl Marx.
Outra
característica desenvolvida por Marx logo cedo em sua juventude e por ele
jamais abandonada — e que apresentava indícios do que ele viria a se tornar —
era sua desavergonhada parasitagem sobre amigos e parentes. Já em 1837,
Heinrich Marx, repreendendo o estilo desmesuradamente gastador do jovem Karl,
escreveu-lhe dizendo que "a partir de um certo momento ... você
espertamente descobriu ser conveniente manter um silêncio aristocrático; estou
me referindo à torpe questão do dinheiro." Com efeito, Marx pegava
dinheiro de qualquer fonte disponível: seu pai, sua mãe e, durante toda a sua
vida adulta, de seu resignado amigo e abjeto discípulo Friedrich Engels.
Todos eles aditivavam a capacidade de Marx de gastar dinheiro como água.[4]
Um
insaciável gastador do dinheiro alheio, Marx seguidamente reclamava de sua
escassez de meios financeiros. Ao mesmo tempo em que parasitava Engels,
Marx continuamente se queixava com seus amigos de que a generosidade de Engels
nunca era o suficiente. Assim, em 1868, Marx reclamou que não conseguiria
sobreviver com uma renda anual menor do que £400-£500, uma soma fenomenal
quando se considera que os 10% mais ricos da população da Inglaterra naquele
período ganhavam uma renda média de apenas £72 por ano. Com efeito, Marx
era tão esbanjador que, em 1864, ele rapidamente exauriu uma herança de £824
legada por um discípulo alemão, bem como uma contribuição de £350 dada por
Engels naquele mesmo ano.
Ou
seja, Marx conseguiu dilapidar a magnânima quantia de quase £1.200 em dois
anos, e, dois anos depois, aceitou outra doação de £210 de Engels para pagar
suas recém-acumuladas dívidas. Finalmente, em 1868, Engels vendeu todas
as suas ações da fábrica de algodão da família e combinou com Marx uma "pensão"
anual de £350 a partir dali. Ainda assim, as seguidas queixas de Marx
sobre sua "falta de dinheiro" não diminuíram.[5]
Assim
como ocorreu com vários outros parasitas e pedintes ao longo da história, Karl
Marx afetava ódio e desprezo pelo exato recurso material que ele estava tão
ávido para mendigar e usar tão impulsivamente. A diferença é que Marx
criou toda uma filosofia acerca de sua atitude depravada em relação ao dinheiro.
O homem, bradava Marx, estava dominado pelo "fetichismo" do
dinheiro. O problema era a existência dessa coisa maléfica, e não as
atitudes voluntariamente adotadas por algumas pessoas em relação a ela. O
dinheiro era vilipendiando por Marx como sendo "a proxeneta entre ... a
vida humana e os meios de sustentação", "a prostituta
universal". A utopia do comunismo era uma sociedade em que este
flagelo, o dinheiro, seria abolido.
Karl
Marx, o autoproclamado inimigo da exploração do homem por outro homem, explorou
seu devoto amigo Friedrich Engels não apenas financeiramente, como também
psicologicamente. Apenas três meses depois da esposa de Marx, Jenny von
Westphalen, ter dado à luz sua filha Franziska em março de 1851, sua empregada
Helene ("Lenchen") Demuth, que morava com eles e a qual Marx havia
"herdado" da família aristocrática de Jenny, também deu à luz o filho
ilegítimo de Marx, Henry Frederick. Desesperadamente preocupado em manter
o alto nível das aparências burguesas e em salvar seu casamento, Marx jamais
reconheceu seu filho. Em vez disso, ele persuadiu Engels, um notório
mulherengo, a assumir a paternidade do menino.
Tanto
Marx quanto Engels tratavam o infeliz Henry com total desprezo, sendo que o
ressentimento de Engels por estar sendo utilizado desta maneira torpe
presumivelmente fornecia a ele uma boa desculpa para o mau trato. Marx
frequentemente colocava o menino Henry para fora de casa, e jamais permitiu que
ele visitasse sua mãe. Como declarou Fritz Raddatz, biógrafo de Marx, "se
Henry Frederick Demuth era filho da Karl Marx, o exortador da nova humanidade
viveu uma mentira que durou quase uma vida, além de ter desprezado, humilhado e
repudiado seu único filho."[6]
Engels,
é claro, ficou com a tarefa de arcar com as despesas da educação de
Henry. Mas o menino, no entanto, foi treinado para assumir seu lugar na
classe operária, longe do estilo de vida de seu pai verdadeiro, o
quase-aristocrático líder do oprimido proletariado mundial.[7]
O
gosto pessoal de Marx pela aristocracia durou toda a sua vida. Quando
jovem, ele se afeiçoou ao seu vizinho, o Barão Ludwig von Westphalen, pai de
Jenny, e dedicou sua tese de doutorado ao barão. Naturalmente, o esnobe
proletário comunista sempre insistiu que Jenny estampasse "nascida von
Westphalen" em seu cartão de visita.
Quanto
a Engels, este se recusou a se casar com sua amante, Mary, porque ela era de
origens "humildes". Após a morte de Mary, sua irmã Lizzie se
tornou a amante de Engels. Engels generosamente se casou com Lizzie no
leito de morte dela "para conceder a ela seu 'último prazer'."
Este artigo foi extraído de
trechos do livro Economic
Thought Before Adam Smith — An Austrian Perspective on the History of Economic
Thought.
[1] Os poemas foram
majoritariamente escritos em 1836 e 1837, em seus primeiros meses em
Berlim. Dois destes poemas constituíam a primeira obra publicada de Marx,
o Berlin Atheneum, de 1841. Quase todos os outros foram perdidos.
[2] Richard
Wurmbrand, Era Karl Marx um Satanista? (Westchester, 111: Crossway Books, 1986), pp. 12-13.
[3] Para a tradução completa do texto de Eulanem, ver Robert Payne, The Unknown Karl Marx (New York: New York University Press, 1971), pp. 81-3. Também excelente
na análise tanto dos poemas quanto do fato de Marx ser fundamentalmente um
messiânico é Bruce Mazlish, The Meaning of Karl Marx (New York: Oxford
University Press, 1984).
O
pastor Wurmbrand (ver nota 2) chama atenção para o fato de que Eulanem é um
anagrama de Emanuel, o nome bíblico de Jesus, e que tais inversões de nomes
santos são práticas comuns em cultos satânicos. No entanto, não há
nenhuma evidência de que Marx tenha sido membro de cultos desse tipo.
Wurmbrand, op. cit., note 45, pp. 13-14 e passim.
[4] Friedrich Engels
(1820—95) era filho de um proeminente industrial fabricante de algodão, que
também era um convicto pietista, da área de Barmen,
na Renânia. Barmen era um dos principais centros do pietismo na Alemanha,
e Engels teve uma criação estritamente pietista. Ateu e hegeliano já em
1839, Engels foi parar na Universidade de Berlim e na Juventude Hegeliana em
1841, em seguida passando a frequentar os mesmos círculos de Marx, de quem ele
rapidamente se tornou amigo em 1844.
[5] Ver os esclarecedores cálculos em Gary North, Marx's Religion of Revolution:
The Doctrine of Creative Destruction (Nutley, NJ: Craig Press, 1968), pp. 26-8. Ver também ibid. (2nd
ed., Tyler, Texas: Institute for Christian Economics, 1989), pp. 232?56.
[7] O zelo de Marx em
esconder sua imprudência foi comparável apenas ao zelo dos historiadores do
establishment marxista em suprimir a verdade sobre Henry Frederick Demuth até
bem recentemente. Embora a verdade já fosse conhecida por marxistas
proeminentes, como Bernstein e Bebel, a notícia sobre a paternidade ilegítima
de Marx só foi divulgada em 1962 no livro Marx, de Werner Blumenberg. Ver em particular W.O. Henderson, The Life of Friedrich
Engels (London: Frank Cass,
1976), II, pp. 833-4. Alguns marxistas leais ainda se recusam a aceitar os
fatos inquietantes. Veja o amoroso e dedicado trabalho do falecido líder
da ala "draperita" do movimento trotskista, Hal Draper Marx-Engels Cyclopedia (3 vols, New York:
Schocken Books, 1985).
Murray N. Rothbard (1926-1995)
foi um decano da Escola Austríaca e o fundador do moderno libertarianismo.
Também foi o vice-presidente acadêmico do Ludwig von Mises Institute e do
Center for Libertarian Studies.
Fonte: Mises
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