Por
Fabio Ostermann
Para
Aécio Neves, Lula é de Direita e FHC de Esquerda. Para o PSOL, PSTU, PCO, todos
eles seriam pertencentes à Direita. Para o editor de uma revista semanal
conhecida por ser, digamos, simpática ao governo petista, Joseph Stalin (ele
mesmo) era de Direita. Mas para a imensa maioria da imprensa, da Academia e da
opinião pública, o ditador soviético seria o paradigma da “Extrema Esquerda”.
Do lado oposto, Hitler seria de “Extrema Direita”, ao lado de Mussolini, Le
Pen, Nigel Farage, Angela Merkel e Putin. Mas Putin é aliado dos governos de
Cuba e do Brasil, além de ser antiamericano. Então, Putin, na verdade, deve ser
de Esquerda. Mas ele é nacionalista e antigays. O regime cubano também. Seria,
então, Fidel Castro de Direita?
Os
conceitos de Direita e Esquerda, apesar de onipresentes, trazem certa confusão
e nunca estiveram tão pouco claros e discerníveis entre si como hoje. Questões
pós-modernas que vão muito além da oposição capital/trabalho ou
liberdade/igualdade colocam sua validade em cheque diariamente. Há no ar fortes
sinais de esgotamento mundo afora desta escala unidimensional como parâmetro de
análise de posicionamentos político-ideológicos. Será que ainda faz sentido
utilizá-la?
Antes
de ganhar significado político, a dicotomia Direita-Esquerda já se encontrava
presente na cultura de diferentes povos. Para os maoris, por exemplo, o lado
direito seria o “lado da vida” (ou da força), enquanto a esquerda representaria
o “lado da morte” (ou da fraqueza). Na Roma Antiga, tinha-se o costume, em
ocasiões especiais, de posicionar um escravo na entrada das casas com o
propósito de confirmar se os convidados entravam com o pé certo (o direito).
Mais contemporaneamente, o principal aliado de uma pessoa é geralmente referido
como seu “braço direito”, nunca “braço esquerdo”. Além disso, na maioria das
línguas europeias a palavra “Direita” é sinônimo de certo, reto, correto,
íntegro, hábil, enquanto a palavra “Esquerda” está ligada à ideia de errado,
torto, inábil, desviante etc.
No que
diz respeito especificamente à política, a origem da dicotomia Direita-Esquerda
remete ao final do século XVIII, especificamente à Assembleia Nacional
francesa, onde eram deliberados os passos seguintes do processo revolucionário.
Nela, os membros mais moderados em seu viés reformista (chamados Feuillants,
sucedidos pelos Girondinos) sentavam-se à Direita, enquanto aqueles imbuídos de
uma perspectiva mais radical dos rumos futuros da Revolução (Jacobinos) e mais propensos
a aliarem-se às camadas populares (sans-culottes) sentavam-se à Esquerda.
Era um
período fundamentalmente polarizado, em que a divisão em dois grupos com
perspectivas antagônicas fazia sentido. Ou se era da Direita, ou da Esquerda.
Mas os tempos mudaram e seguimos utilizando esta mesma dicotomia para explicar
posições político-ideológicas dotadas de um grau de complexidade muito maior do
que os revolucionários franceses poderiam sequer imaginar.
O caso
do Liberalismo é exemplar em descrever essas limitações nos dias de hoje.
Liberais são favoráveis ao livre mercado e a uma intervenção mínima do governo
na economia. Estariam, portanto, à Direita. Mas também se posicionam
favoravelmente a liberdades civis e sociais que são caras à Esquerda, como o Estado
laico, a união homossexual e a legalização das drogas. Estaria o Liberalismo no
“Centro” do espectro político? Entre PMDB e PSDB?!
O
exato oposto do Liberalismo também é um desafio para a dicotomia. Como
posicionar como extremos opostos doutrinas e visões de mundo tão
fundamentalmente parecidas quanto o fascismo (à Extrema-Direita) e o comunismo
(à Extrema-Esquerda). Por mais que ambos sejam retratados como diametralmente
opostos, o mais adequado seria defini-los como irmãos gêmeos que se odeiam e gostam
de cores diferentes, mas que contam com o mesmo DNA totalitário e coletivista.
Suas práticas sempre foram similares: o controle total da sociedade e da
economia por meio do poder estatal. O lema do fascismo em sua versão italiana
mostra sua profunda afinidade com seus congêneres soviéticos: “Tudo para o
Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”. E, nunca é demais lembrar,
o partido nazista na verdade se chamava “Partido Nacional Socialista dos
Trabalhadores Alemães”.
Não é
de hoje que cientistas políticos e filósofos têm debatido potenciais
alternativas à dicotomia Direita-Esquerda. Alguns exemplos mais notórios são as
formulações de Hayek (1960), Bryson & McDill (1967) e Nolan (1971).
É
importante resguardar o papel histórico dos conceitos de Direita e Esquerda e
sua importante função em ilustrar realidades pretéritas, onde as clivagens
políticas eram bem menos complexas do que as de hoje em dia. A discussão sobre
modelos alternativos de análise do posicionamento de atores no espectro político
precisa, portanto, avançar para que possamos melhor compreender as ideias
políticas, seus atores e seu lugar na história.
Fonte:
IL
Texto
originalmente publicado na Revista Voto.
Extrema esquerda:Comunismo: Sem propriedade privada igualdade total sem nenhuma desigualdade (população igualmente pobre e governante não) e liberdade econômica entre 0 e 20 (coreia do norte)
ResponderExcluirEsquerda:Socialismo: Desigualdade social pequena, sem propriedade privada e liberdade econômica entre 20 e 40 (cuba, Venezuela e congo)
Centro esquerda:Social Democracia: propriedade privada com regulação governamental alta, programas sociais de distribuição aos mais pobres e liberdade econômica entre 40 e 50 (zimbabue, Moçambique e bolivia)
Centro:Keynesianismo: propriedade privada com regulação media do governo e programas sociais de distribuição, liberdade econômica entre 50 e 60 (Brasil, Argentina e Serra Leoa)
Centro direita:Capitalismo Social: propriedade privada com baixa regulação governamental e sem programas de distribuição de renda, mas com programas de bolsas escolares, liberdade econômica entre 60 e 70 (México, Indoneisa e Portugal)
Direita:Capitalismo: propriedade privada sem regulação e poucos direitos de trabalhadores, salario mínimo baixo, sem programas de auxilio e sem distribuição de renda com liberdade econômica entre 70 e 90 (Estados Unidos, Islândia e Noruega)
Extrema direita:Liberalismo: Propriedade privada sem regulação nenhuma, sem direitos de trabalhadores e sem salario mínimo, liberdade econômica entre 90 e 100 (Hong Kong)