Qual é a avaliação que o senhor faz da
Europa Ocidental atual e, particularmente, da União Europeia?
Atualmente, todos os grandes partidos
políticos da Europa Ocidental, independentemente dos seus diferentes nomes e
programas partidários, estão essencialmente comprometidos com a mesma ideia: o
socialismo democrático.
Eles utilizam as eleições democráticas
para legitimar o ato de se tributar pessoas trabalhadoras e produtivas em
benefício das improdutivas. Eles
tributam aquelas pessoas que ganham seus salários (especialmente os mais
"ricos" dentre estes) e acumulam riqueza por meio da produção de bens
e serviços — os quais foram adquiridos voluntariamente por consumidores —, e depois
redistribuem o produto deste esbulho entre eles próprios, isto é, entre o
estado democrático que eles controlam e os seus diversos aliados políticos,
apoiadores e potenciais eleitores.
Eles não chamam essa política pelo seu
nome apropriado: punir os produtivos e a premiar os improdutivos. Isso não
soaria particularmente atrativo. Em vez
disso, eles recorrem ao sempre popular sentimento de inveja e alegam estar
tributando alguns poucos "ricos" para poder sustentar os vários
"pobres".
No entanto, a verdade é que, com essa
política, os partidos políticos fazem com que pessoas produtivas se tornem cada
vez mais empobrecidas ao mesmo tempo em que as pessoas improdutivas se tornam
cada vez mais ricas.
E a União Europeia?
Quando olhamos para a União Europeia, a
coisa fica ainda pior. A União Europeia é o primeiro passo para a criação de um
superestado europeu, o que, em última instância, levaria à criação de um único
governo mundial, controlado pelos EUA e por seu Banco Central, o Federal
Reserve System.
Desde os seus primórdios, e não obstante
todas as pomposas declarações em contrário, a União Europeia nunca teve nada a
ver com livre comércio e livre concorrência. Para se ter livre comércio, você
não precisa de dezenas de milhares de páginas estipulando regras e
regulamentações.
O propósito central da União Europeia,
apoiada pelos EUA desde os primórdios, sempre foi o enfraquecimento da Alemanha
como a potencia econômica da Europa. Para viabilizar isso, a Alemanha foi
arrastada para uma aparentemente infindável espiral de complexo de culpa
(acusada de ser a responsável pela Segunda Guerra Mundial, de ter obtido ganhos
com ela, de ter criado o nazismo, de ter criado Auschwitz etc.), sendo então
pressionada a transferir cada vez mais a sua já limitada soberania (em
comparação com os EUA) para a União Europeia em Bruxelas.
É especialmente válido notar que a
Alemanha abriu mão de sua soberania monetária e abandonou sua moeda
tradicionalmente "forte", o marco alemão, em favor de um euro
"fraco" emitido por um Banco Central Europeu (BCE) composto em sua
esmagadora maioria pelos banqueiros centrais oriundos de países que possuem
moedas tradicionalmente "fracas".
A União Europeia, portanto, se
caracteriza pelos três dos seguintes elementos:
Primeiro: uma harmonização da estrutura
de impostos e regulamentações para todos os países-membros, de modo a reduzir a
concorrência econômica e especialmente a concorrência tributária entre os
diferentes países, tornando todos igualmente não-competitivos.
Segundo: além dessa perversidade
econômica e moral dentro de cada país — com os produtivos sendo punidos e tendo
de subsidiar os improdutivos —, acrescentou-se outra camada de redistribuição
de renda e riqueza, agora em nível internacional: os países com melhor desempenho,
como a Alemanha e aqueles do norte da Europa, são punidos economicamente, tendo
de repassar dinheiro de impostos aos países de pior desempenho econômico. Consequentemente, estes países de pior
desempenho (a maioria do sul do continente) são recompensados economicamente
com o dinheiro de impostos oriundo dos países de melhor desempenho. A consequência inevitável desse arranjo
redistributivista é que o desempenho econômico de todos os países se torna
igualmente ruim, e de maneira contínua.
Terceiro, de importância cada vez maior,
especialmente durante a última década: de forma a superar a crescente
resistência, em diversos países, contra a transferência de sua soberania para
Bruxelas, algo que só vem aumentando, a União Europeia embarcou em uma cruzada com
o objetivo de erodir e, em última instância, destruir todas as identidades
nacionais e toda a coesão cultural e social existente nos diversos países.
A ideia de nação e de identidades
nacionais e regionais vem sendo ridicularizada, ao passo que o multiculturalismo
é aclamado como uma "benção" inquestionável. Igualmente, ao se promover a garantia de
privilégios legais e de "proteção especial" a todos, exceto aos
homens brancos, heterossexuais e, especialmente, aos homens casados e com
famílias (que são pintados como "opressores" históricos e portadores
de dívidas a serem quitadas para com suas "vítimas" históricas, que
são todas as outras pessoas) — políticas essas que são eufemisticamente
chamadas de "anti-discriminação" ou "afirmativas" —, a
ordem social natural vem sendo sistematicamente solapada.
A normalidade é punida e as anomalias e
os desvios, recompensados.
Podemos então dizer que os políticos que
estão no parlamento da União Europeia são ainda piores do que aqueles que
operam apenas em nível nacional?
Sim e não.
Por um lado, todos os políticos
democraticamente eleitos, sem exceção, são demagogos moralmente desinibidos. O
título de um de meus livros em alemão é A competição dos escroques, o que capta
a essência do que a democracia e os partidos políticos democráticos realmente
são. Por este aspecto, há muito pouca ou
nenhuma diferença entre as elites políticas de Berlim, Paris, Roma etc. e
aquelas que estão comandando o show em Bruxelas. Com efeito, as elites da União Europeia são
tipicamente compostas de políticos profissionais, com a mesma mentalidade dos
seus pares domésticos, que estão em busca de salários extremamente
extravagantes, de benefícios e de pensões nababescas garantidas pela UE.
Por outro lado, é claro, as elites da UE
são piores que os seus pares nacionais no sentido de que as suas decisões e
regulamentações prejudicam um número significativamente maior de pessoas.
Então qual é a sua previsão para o
futuro da UE?
A União Europeia e o Banco Central
Europeu são uma monstruosidade econômica e moral; uma violação do direito
natural e das leis da economia.
Você não pode punir de forma contínua a
produtividade e o sucesso e premiar a inércia e o fracasso sem causar um
desastre.
A UE irá passar por diversas crises
econômicas, sucessivamente, e, por fim, irá quebrar e se fragmentar. O Brexit,
que acabou de ocorrer, é apenas o primeiro passo desse inevitável processo de
desconcentração e descentralização política.
Há algo que um cidadão comum possa fazer
nesta situação?
Em primeiro lugar, em vez de engolir a
ladainha pomposa dos políticos sobre "liberdade",
"prosperidade", "justiça social" etc., ele tem de aprender
a enxergar a UE como ela realmente é: uma gangue composta por parasitas que
aumentam o seu poder e sua riqueza à custa de pessoas produtivas.
Em segundo lugar, as pessoas devem
aprender a desenvolver uma visão clara quanto à alternativa ao lamaçal atual: a
solução não é um super-estado europeu, nem mesmo uma federação de estados
nacionais, mas sim uma Europa formada por centenas de Liechtensteins e cantões
suíços, unidos entre si por meio do livre comércio e em concorrência direta uns
com os outros pare ver quem oferece as condições mais atrativas para que
pessoas produtivas ali permaneçam ou se mudem para lá.
O senhor poderia traçar um paralelo
entre os EUA e a situação atual da Europa?
A diferença entre a situação da Europa
Ocidental e a dos EUA é muito menor do que geralmente se considera de cada lado
do oceano Atlântico.
Em primeiro lugar, os acontecimentos na
Europa desde o fim da Segunda Guerra Mundial foram observados de perto,
conduzidos e manipulados, por meio de ameaças veladas ou mediante subornos
diretos, pelas elites políticas de Washington, a capital dos EUA. Com efeito, a Europa tornou-se em sua
essência um vassalo, um satélite, um protetorado dos EUA.
Isso pode ser comprovado, por um lado,
pelo fato de que, até hoje, tropas americanas estão posicionadas por toda a
Europa, até a fronteira russa. Por outro, pode-se observar a contínua romaria
das elites políticas européias em direção a Washington — realizada de forma
mais regular e mais zelosa do que qualquer peregrinação muçulmana até Meca —,
com o objetivo de receber as bênçãos de seus mestres.
Isso ocorre de maneira mais explícita
com a elite política alemã, cujo complexo de culpa neste meio tempo ascendeu a
uma condição que beira a doença mental. Os políticos alemães se destacam por
sua covardia, subserviência e servidão.
Já em relação aos assuntos domésticos
dos EUA, tanto os europeus quanto os americanos veem tudo de maneira
errada. Os europeus ainda, e com grande
frequência, enxergam os EUA como a "terra da liberdade", do
individualismo áspero e do capitalismo sem barreiras ou entraves. Enquanto isso,
os americanos — ao menos aqueles conhecem, ou ao menos alegam conhecer, alguma
coisa do mundo fora dos EUA — frequentemente imaginam a Europa como um local de
socialismo desenfreado e coletivista, completamente alheio ao seu próprio
"american way". Com efeito, não existe uma grande diferença entre o
assim chamado "capitalismo democrático" dos EUA e o "socialismo
democrático" europeu.
É verdade que os EUA sempre tiveram mais
defensores vocais do capitalismo de livre mercado. E é verdade que o país ainda é capaz de
atrair muitos dos melhores e mais brilhantes cérebros do mundo. E, com efeito, a carga tributária americana
em relação ao PIB ainda é menor que a da maioria dos países europeus — mas nem
tanto assim. Na realidade, a carga tributária americana é mais alta que a da
Suíça, país que não é membro da UE, por exemplo. E, no que diz respeito à dívida do governo
americano como porcentagem do PIB, esta é mais alta do que a da maioria dos
países europeus, colocando os EUA na mesma categoria econômica de países como a
Grécia, por exemplo.
Também é verdade que, nos EUA, você
ainda pode dizer quase tudo o que quiser sem ter de temer um processo criminal,
ao passo que tomar tal liberdade na maior parte da Europa pode muito
perfeitamente lhe mandar para a cadeia.
No entanto, a doença do
"politicamente correto", da "não-discriminação" e da
"ação afirmativa", que está atualmente se alastrando no mundo
ocidental como uma epidemia, começou realmente nos EUA, com a chamada
"legislação dos direitos civis" da década de 1960. E foi lá mesmo nos EUA que ela tomou maior
vulto, chegou ao paroxismo e alcançou seus maiores excessos e graus de
absurdez.
Portanto, embora dizer uma coisa
politicamente "incorreta" não necessariamente fará com que você vá
para a cadeia nos EUA, você muito provavelmente também terá a sua carreira
destruída, assim como em qualquer país europeu.
Quanto à política externa americana, ao
mesmo tempo em que as elites políticas dos EUA começaram a convidar o terceiro
mundo para ir para os EUA, bem antes de essas mesmas e desastrosas políticas
"multiculturais" terem sido adotadas também na Europa, essas mesmas
elites americanas conduziram uma política agressiva de "invadir o
mundo" e atacaram, apenas nas décadas mais recentes, Afeganistão,
Paquistão, Iraque, Líbia, Síria, Sudão, Somália e o Iêmen, causando a morte de
centenas de milhares de civis inocentes e gerando uma onda de terrorismo
islâmico, em grande parte custeada pela Arábia Saudita, com quem as elites
políticas alimentam uma relação de extrema cordialidade.
Por fim, como o senhor avalia o sucesso
econômico dos antigos países comunistas, como a China, que combinam ditaduras
de um partido único com mercados parcialmente livres?
O sucesso econômico de um país depende
de três fatores inter-relacionados: a segurança da propriedade privada e dos direitos
de propriedade, a liberdade de contrato e de comércio, e a liberdade de
associação e desassociação — e, é claro, da diligência, inteligência e
engenhosidade de seu povo.
Qualquer país do mundo, uma vez que
depende do confisco de dinheiro dos seus cidadãos para o seu próprio
financiamento, incorre na violação desses três requisitos. Porém, essa violação
pode ser maior ou menor e mais ou menos abrangente. Isso explica o relativo
sucesso de alguns países e o fracasso de outros.
A organização interna de um estado, seja
ela uma ditadura de um partido único ou uma democracia pluripartidária, é
essencialmente irrelevante neste aspecto.
Com efeito, como o exemplo recente da Venezuela nos demonstra
vividamente, a democracia e as eleições democráticas podem muito bem levar à
quase completa abolição dos direitos de propriedade privada, da livre
iniciativa e da liberdade de comércio, resultando em um estrondoso colapso
econômico.
Da mesma forma, uma comparação entre o
desempenho econômico da China e da Índia é muito instrutiva. Ao passo que a Índia moderna, já há 70 anos,
é governada democraticamente, a China moderna foi, durante esse mesmo período,
governada pela ditadura de um único partido: metade do tempo, na era de Mao
Tsé-Tung, por um partido comunista ortodoxo; na segunda metade, por um regime
reformista-comunista "liberal".
O resultado? Ambos os países ainda estão
desesperadamente pobres de acordo com os padrões ocidentais, indicando que
ambos os governos mostraram pouco ou nenhum respeito à propriedade privada e
seus direitos. Porém, embora a situação econômica fosse igualmente
desesperadora em ambos os países até o início dos anos 1980, desde então, com o
surgimento do "comunismo reformista" na China, o PIB per capita
chinês ultrapassou e se manteve significativamente acima do PIB per capita da
Índia, indicando, comparativamente, uma maior liberdade econômica na China ou
uma população chinesa que é, na média, mais brilhante e mais diligente.
Como conclusão, portanto, não confie em
uma democracia. Tampouco confie em uma
ditadura. Confie, isso sim, em uma
descentralização política radical. A
maior esperança para a liberdade vem justamente da emulação de países pequenos,
como Mônaco, Andorra, Liechtenstein, e até mesmo Suíça, Hong Kong, Cingapura,
Bermuda etc. Quem preza a liberdade
deveria torcer e fazer de tudo pelo surgimento de dezenas de milhares destas
entidades pequenas e independentes.
Hans-Hermann
Hoppe é um membro sênior do Ludwig von Mises Institute, fundador e presidente
da Property and Freedom Society e co-editor do periódico Review of Austrian
Economics. Ele recebeu seu Ph.D e fez seu pós-doutorado na Goethe University em
Frankfurt, Alemanha. Ele é o autor, entre outros trabalhos, de Uma Teoria sobre
Socialismo e Capitalismo e The Economics and Ethics of Private Property.
Fonte:
Istituto Mises Brasil
Biblioteca Subversiva: Dicas de livros - leia "Democracia - 0 deus que falhou" deste mesmo autor.
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