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quarta-feira, 31 de agosto de 2016

O Grande Terror - Os Expurgos de Stalin - por Robert Conquest

O socialismo na prática - o laboratório da morte 

Por Gary North

Você sabe qual foi ou qual é o experimento socialista mais longevo da história do mundo?  Você sabe qual foi o sucesso deste experimento?

Se alguém lhe pedisse para defender a ideia de que o socialismo fracassou, qual exemplo você forneceria?

Onde o formato moderno de socialismo começou?

Nos Estados Unidos.

É isso mesmo: na "terra da liberdade".  Mais especificamente, nas reservas indígenas, sob o comando da Agência de Questões Indígenas, subordinada ao Ministério do Interior.

As reservas indígenas foram inventadas com o intuito de controlar combatentes adultos.  Elas tinham como objetivo manter a população nativa pobre e impotente.

O sistema funcionou?  Pode ter certeza.

O experimento tem se mostrado um fracasso?  Muito pelo contrário, tem sido um sucesso total.

Quando foi a última vez que se ouviu a respeito de alguma insurreição dos índios americanos?

Eles são pobres?  Os mais pobres dos EUA.

Eles recebem auxílios do governo americano?  É claro que sim.

No ano passado, o Ministério da Agricultura dos EUA destinou US$21 milhões para subsidiar eletricidade para os moradores daquelas reservas indígenas cujas casas são as mais isoladas de empregos e oportunidades de trabalho.  Você pode ler mais a respeito aqui.  Como toda e qualquer medida assistencialista, esta é apenas mais uma para mantê-los continuamente pobres.  Eletricidade tribal significa impotência tribal. 

As tribos são dependentes.  Elas permanecerão dependentes.  O programa foi criado exatamente para este objetivo.

Por alguma razão, os livros-textos de economia não oferecem sequer uma página relatando a corrupção, a burocratização e a pobreza multigeracional criadas por este socialismo tribal.  Temos aqui uma série de exemplos de laboratórios sociais gerenciados pelo governo.  Quão exitosos eles têm se mostrado?  Onde estão as reservas que de maneira sistemática tiraram pessoas da pobreza?

A próxima será a primeira.

O paraíso dos trabalhadores

A União Soviética foi o paraíso socialista dos trabalhadores de 1917 a 1991.  Como resultado direto deste experimento, pelo menos 30 milhões de russos morreram.  Os números verdadeiros podem ser o dobro desta cifra.

Já o experimento chinês foi mais curto: de 1949 a 1978.  Talvez 60 milhões de chineses tenham morrido.  Há quem fale em 100 milhões.

O sistema foi incapaz de fornecer os bens prometidos.  Não consigo imaginar um tópico mais apropriado para se discutir em uma aula de economia do que o fracasso do socialismo.  O mesmo é válido para um curso sobre a história do mundo moderno.  Qualquer curso decente de ciência política deveria cobrir este fracasso em detalhes.

Mas isso não ocorre, é claro.  Nenhum curso menciona o mais fundamental desafio já proposto à teoria econômica socialista, o ensaio de Ludwig von Mises, escrito em 1920, O cálculo econômico sob o socialismo.  E por que não?  Porque a maioria dos cientistas sociais, economistas e historiadores nunca ouviu falar desta obra.  Entre aqueles com mais de 50 anos de idade, os poucos que já ouviram a respeito ouviram da boca de algum defensor do socialismo ou de algum entusiasta keynesiano, que apenas repetiu o que havia aprendido na sua pós-graduação: que tal ensaio havia sido totalmente refutado por Oskar Lange em 1936.

Mas o que eles nunca dizem é que, quando Lange, um devoto comunista, voltou à sua Polônia natal em 1947 para atuar no alto escalão da burocracia estatal, o governo comunista não pediu para que ele implementasse sua grande teoria do "socialismo de mercado".  Com efeito, nenhum país socialista jamais implementou sua teoria.

Durante 50 anos, poucos livros-textos de economia mencionavam Mises.  E, quando o faziam, era apenas para dizer que ele havia sido totalmente refutado por Lange.  Os acadêmicos do establishment simplesmente jogaram Mises no buraco orwelliano da memória.

No dia 10 de setembro de 1990, o multimilionário escritor, economista e socialista Robert Heilbroner publicou um artigo na revista The New Yorker intitulado "Após o Comunismo".  A URSS já estava em avançado processo de colapso.  Neste artigo, Heilbroner recontou a história da refutação de Mises.  Ele relata que, na pós-graduação, ele e seus pares foram ensinados que Lange havia refutado Mises.  Porém, agora, ele anunciava: "Mises estava certo".  No entanto, em seu best-seller, The Worldly Philosophers, um livro-texto sobre a história do pensamento econômico, ele em momento algum cita o nome de Mises.

Os fracassos visíveis

O fracasso universal do socialismo do século XX começou já nos primeiros meses após a tomada da Rússia por Lênin.  A produção caiu acentuadamente.  Ato contínuo, ele foi forçado a implementar um reforma marginalmente capitalista em 1920, a Nova Política Econômica (NEP).  Ela salvou o regime do colapso.  A NEP foi abolida por Stalin.

Durante as décadas seguintes, Stalin se entregou ao corriqueiro hábito de assassinar pessoas.  A estimativa mínima é de 20 milhões de mortos.  Tal prática era peremptoriamente negada por quase toda a intelligentsia do Ocidente.  Foi somente em 1960 que Robert Conquest publicou seu monumental livro O Grande Terror — Os Expurgos de Stalin.  Sua estimativa atual: algo em torno de 30 milhões.  O livro foi escarnecido à época.  O verbete da Wikipédia sobre o livro é bem acurado.

Publicado durante a Guerra do Vietnã e durante um surto de marxismo revolucionário nas universidades ocidentais e nos círculos intelectuais, O Grande Terror foi agraciado com uma recepção extremamente hostil.

A hostilidade direcionada a Conquest por causa de seus relatos sobre os expurgos foi intensificada por mais dois fatores.  O primeiro foi que ele se recusou a aceitar a versão apresentada pelo líder soviético Nikita Khrushchev, e apoiada por vários esquerdistas do Ocidente, de que Stalin e seus expurgos foram apenas uma "aberração", um desvio dos ideais da Revolução, e totalmente contrários aos princípios do leninismo. Conquest, por sua vez, argumentou que o stalinismo era uma "consequência natural" do sistema político totalitário criado por Lênin, embora reconhecesse que foram os traços característicos da personalidade de Stalin que haviam causado os horrores específicos do final da década de 1930.  Sobre isso, Neal Ascherson observou: "Àquela altura, todos nós concordávamos que Stalin era um sujeito muito perverso e extremamente diabólico, mas ainda assim queríamos acreditar em Lênin; e Conquest disse que Lênin era tão mau quanto Stalin, e Stalin estava simplesmente levando adiante o programa de Lênin".

O segundo fator foi a ácida crítica de Conquest aos intelectuais ocidentais, os quais ele dizia sofrerem de cegueira ideológica quanto às realidades da União Soviética tanto durante a década de 1930 quanto, em alguns casos, até mesmo ainda durante a década de 1960.  Personalidades da intelectualidade e da cultura da esquerda, como Sidney e Beatrice Webb, George Bernard Shaw, Jean-Paul Sartre, Walter Duranty, Sir Bernard Pares, Harold Laski, D.N. Pritt, Theodore Dreiser e Romain Rolland foram acusados de estúpidos a serviço de Stalin e apologistas de seu regime totalitário devido a vários comentários que fizeram negando, desculpando ou justificando vários aspectos dos expurgos.

A esquerda ainda odeia o livro, e continua até hoje tentando dizer que ele exagerou nos números e nos relatos.
E então veio o Livro Negro do Comunismo (1999), que coloca em 85 milhões a estimativa mínima de cidadãos executados pelos comunistas, deixando claro que cifras como 100 milhões ou mais são as mais prováveis.  O livro foi escrito por esquerdistas franceses e publicado pela Harvard University Press, de modo que ele não pôde simplesmente ser repudiado como sendo apenas mais um panfleto direitista.

A esquerda até hoje tenta ignorá-lo.

O blefe dos cegos

A resposta da academia tem sido, até hoje, a de considerar todo o experimento soviético como algo que foi meramente mal orientado, algo que se desencaminhou, e não como algo inerentemente diabólico.  O custo em termos de vidas humanas raramente é mencionado.  Antes de 1991, era algo ainda mais raramente mencionado.  Antes de Arquipélago Gulag (1973), de Solzhenitsyn, era considerado uma imperdoável falta de etiqueta um acadêmico fazer mais do que apenas mencionar muito discretamente e só de passagem toda a carnificina, devendo limitar qualquer crítica apenas aos expurgos do Partido Comunista comandados por Stalin no final da década de 1930, e praticamente quase nunca mencionar que a fome em massa havia sido adotada como uma política pública.  "Ucrânia?  Nunca ouvi falar."  "Kulaks?  O que são kulaks?"

A situação decrépita de todas as economias socialistas, do início ao fim, não é mencionada.  Acima de tudo, não há nenhuma referência aos críticos do Ocidente que alertaram que estas economias eram vilarejos Potemkins em grande escala — cidades falsas criadas pelo governo para ludibriar os leais e românticos esquerdistas que iam à URSS ver o futuro.  E eles voltavam para seus países com relatos entusiásticos e incandescentes.

Há um livro sobre estas ingênuas e crédulas almas, que foram totalmente trapaceadas: Political Pilgrims: Travels of Western Intellectuals to the Soviet Union, China, and Cuba, 1928-1978 de Paul Hollander.  Foi publicado pela Oxford University Press em 1981.  Foi ignorado pela intelligentsia por uma década.

A melhor descrição que já li sobre estas pessoas foi fornecida por Malcolm Muggeridge, que trabalhou no início da década de 1930 como repórter do The Guardian em Moscou.  Tudo o que ele escrevia era censurado antes de ser enviado para a Inglaterra.  E ele sabia disso.  Ele não podia relatar a verdade, e o The Guardian não publicaria caso ele relatasse.  Eis um trecho do volume 1 de sua autobiografia, Chronicles of Wasted Time.

Para os jornalistas estrangeiros que residiam em Moscou, a chegada de ilustres visitantes era também uma ocasião de gala, mas por uma razão diferente.  Eles nos propiciavam nosso melhor — praticamente nosso único — momento de alívio cômico.  Por exemplo, ouvir [George Bernard] Shaw, acompanhado de Lady Astor (que havia sido fotografada cortando o cabelo de Shaw), declarar que estava encantado por descobrir, em meio a um banquete fornecido pelo Partido Comunista, que não havia escassez de comida na URSS, era algo de imbatível efeito humorístico.  Ou ouvir [Harold] Laski cantar glórias à nova Constituição Soviética de Stalin.

Jamais me esquecerei destes visitantes, e jamais deixarei de me assombrar com eles; de como eles discursavam pomposamente sobre as maravilhas do regime, de como eles iluminavam continuamente nossa escuridão, guiando, aconselhando e nos instruindo; em algumas ocasiões, momentaneamente confusos e envergonhados; mas sempre prontos para se reerguer, colocar seus capacetes de papelão, montar em seus Rocinantes, e sair galopando mundo afora em novas incursões em nome dos pobres e oprimidos.

Eles são inquestionavelmente uma das maravilhas de nossa época, e irei guardar para sempre na memória, com grande estima, o espetáculo que era vê-los viajando com radiante otimismo até as regiões famintas do país, vagueando em bandos alegres por cidades esquálidas e sobrepovoadas, ouvindo com inabalável fé as insensatezes balbuciadas por guias cuidadosamente treinados e doutrinados, repetindo, assim como crianças de colégio repetem a tabuada, as falsas estatísticas e os estúpidos slogans que eram incessantemente entoados para eles.

Eis ali, pensava eu ao ver estas celebridades, um ardoroso burocrata de alguma repartição local da Liga das Nações, eis ali um devoto Quaker que já havia tomado chá com Gandhi, eis ali um feroz crítico das exigências de comprovação de renda para se tornar apto a receber programas assistenciais do governo, eis ali um ferrenho defensor da liberdade de expressão e dos direitos humanos, eis ali um indômito combatente da crueldade contra animais; eis ali meritórios e cicatrizados veteranos de centenas de batalhas em prol da verdade, da liberdade e da justiça — todos, todos eles cantando glórias a Stalin e à sua Ditadura do Proletariado.  Era como se uma sociedade vegetariana se manifestasse apaixonadamente em defesa do canibalismo, ou como se Hitler houvesse sido indicado postumamente para o Prêmio Nobel da Paz.

Este fenômeno não acabou junto com a década de 1930.  Ele perdurou até o último suspiro da farsa econômica criada pelos soviéticos.  A falência intelectual e moral dos líderes intelectuais do Ocidente, algo que vinha sendo encoberto pela própria durabilidade do regime soviético, foi finalmente exposta em 1991, quando houve o reconhecimento mundial de que os regimes marxistas não apenas haviam falido economicamente, como também eram tiranias que o Ocidente havia aceitado como sendo uma alternativa válida para o capitalismo.

Não há exemplo melhor deste auto-engano intelectual do que o de Paul Samuelson, professor de economia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), o primeiro americano a ganhar o Prêmio Nobel de economia (1970), ex-colunista da revista Newsweek, e autor daquele que é, de longe, o mais influente livro-texto de economia do mundo pós-guerra (1948 — presente): pelo menos 3 milhões de cópias vendidas em 31 idiomas distintos.  Ele escreveu na edição de 1989 de seu livro-texto: "A economia soviética é a prova cabal de que, contrariamente àquilo em que muitos céticos haviam prematuramente acreditado, uma economia planificada socialista pode não apenas funcionar, como também prosperar."

Foi o economista Mark Skousen quem encontrou esta pérola.  E ele também descobriu esta outra, ainda mais condenatória.

O experimento soviético

Em sua autobiografia, Felix Somary recorda uma discussão que ele havia tido com o economista Joseph Schumpeter e com o sociólogo Max Weber em 1918.  Schumpeter foi um economista nascido na Áustria mas que não era da Escola Austríaca de economia.  Mais tarde, ele viria a escrever a mais influente monografia sobre a história do pensamento econômico.  Já Weber foi o mais prestigioso cientista social acadêmico do mundo até morrer em 1920.

Naquela ocasião, Schumpeter havia expressado alegria em relação à Revolução Russa.  A URSS seria o primeiro exemplo prático de socialismo.  Weber, por sua vez, alertou que o experimento geraria uma miséria incalculável.  Schumpeter retrucou dizendo que "Pode ser que sim, mas seria um bom laboratório."  E Weber respondeu: "Um laboratório entulhado de cadáveres humanos!".  E Schumpeter retrucou: "Exatamente igual a qualquer sala de aula de anatomia".[1]

Schumpeter era um monstro em termos morais.  Não vamos medir as palavras.  Ele foi um homem altamente sofisticado, mas, no fundo, um monstro moral.  Qualquer pessoa que menospreze a morte de milhões de pessoas desta forma é um monstro moral.  Weber saiu extremamente irritado da sala.  Não o culpo.

Weber morreu em 1920.  Foi neste ano que Mises lançou seu ensaio, O cálculo econômico sob o socialismo.  Weber o mencionou em uma nota de rodapé em sua obra-prima, publicada postumamente como Economia e Sociedade (página 107 na versão original).  Weber compreendeu sua importância tão logo leu este ensaio.  Já os economistas acadêmicos, não.  Até hoje, há poucas referências a esta obra de Mises.

Mises explicou analiticamente por que o sistema socialista é irracional: não há um mercado para os bens de capital.  Sendo assim, é impossível saber quanto cada coisa deveria custar.  Ele disse que um sistema socialista inevitavelmente se degeneraria em uma dessas duas alternativas: ou ele iria abandonar seu compromisso com um planejamento total ou ele fracassaria por completo.  Mises nunca foi perdoado por esta falta de etiqueta.  Ele estava certo, e os intelectuais, errados.  As sociedades socialistas entraram em colapso, com a exceção da Coréia do Norte e de Cuba.  Pior ainda, ele se mostrou correto em termos de simples teoria de mercado, algo que qualquer pessoa inteligente podia entender.  Exceto, aparentemente, os intelectuais do Ocidente.  E este seu ensaio é um testemunho para os intelectuais do Ocidente: "Não há pessoas mais cegas do que aquelas que se recusam a enxergar."

A prova do pudim

Mises acreditava que a real prova do pudim está em sua fórmula.  Se a pessoa que faz o pudim acrescentar sal em vez de açúcar, ele não será doce.  Você nem precisa experimentá-lo para saber disso.  Mas os acadêmicos estão oficialmente comprometidos a aceitar apenas coisas empíricas.  Eles creem que uma teoria tem de ser confirmada por testes estatísticos.  Mas os testes ocorreram durante décadas.  As economias socialistas fracassavam seguidamente, mas divulgavam estatísticas falsificadas.  E todos sabiam disso.  Mas, mesmo assim, os intelectuais do Ocidente insistiam na crença de que o ideal socialista era moralmente sólido.  Eles insistiam que os resultados iriam, no final, provar que a teoria estava certa.

Nikita Kruschev ficou famoso por haver dito isso a Nixon no famoso "debate da cozinha", em 1959.  Ele era um burocrata que havia sobrevivido aos expurgos de Stalin por ter supervisionado o massacre de dezenas de milhares de pessoas na Ucrânia.  Ele disse a Nixon: "Vamos enterrar vocês."  Ele estava errado.

Estudantes universitários não são ensinados nem sobre a teoria do socialismo nem sobre a magnitude de seus fracassos.  Nem economicamente nem demograficamente.  Na era pré-1991, tal postura era mais fácil de ser mantida do que hoje.  A intelligentsia hoje já admite que o capitalismo é mais produtivo que o socialismo.  Sendo assim, a tática agora é dizer que o capitalismo é moralmente deficiente.  Pior, que ele ignora a ecologia.  Foi exatamente esta a estratégia recomendada por Heilbroner em seu artigo de 1990.  Ele disse que os socialistas teriam de mudar de tática, parando de acusar o capitalismo de ineficiência e desperdício, e passar a acusá-lo de destruição ambiental.

Conclusão

A natureza abrangente do fracasso do socialismo não é ensinada nos livros-textos universitários.  O tópico é atenuado e minimizado sempre que possível.  Era mais fácil impor sanções contra qualquer um que se atrevesse a escrever em jornais acadêmicos ou na imprensa antes de 1991.

Deng Xiaoping anunciou sua versão da Nova Política Econômica de Lênin em 1978.  Mas isso, na época, não ganhou muita publicidade.

Em 1991, a fortaleza soviética desmoronou.  Gorbachev presidiu o último suspiro do regime em 1991.  Ele recebeu da revista Time o título de "Personalidade da Década" em 1990.  Em 1991, ele se tornou um ex-ditador desempregado.  O socialismo fracassou — totalmente.  Mas a intelligentsia ainda se recusa a aceitar a filosofia social de livre mercado de Mises, o homem que previu todas as falhas do socialismo e que forneceu todos os argumentos em prol de sua condenação universal.

É exatamente por isso que é uma boa ideia sempre prever o fracasso de políticas econômicas ruins em qualquer análise que se faça sobre elas.  Poder dizer "Eu avisei que isso iria ocorrer, e também expliquei por quê" é uma postura superior e mais respeitável do que apenas dizer "Eu avisei".

[1] Felix Somary, The Raven of Zurich (New York: St. Martin's, 1986), p. 121.

Gary North , ex-membro adjunto do Mises Institute, é o autor de vários livros sobre economia, ética e história. Visite seu website



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segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Como o laissez-faire enriqueceu a Suécia

Por Johan Norberg
Uma vez eu fiquei interessado em teorias sobre o desenvolvimento econômico, porque eu estudei um país pobre, mais pobre que o Congo, que comparado com a média dos países em desenvolvimento, tinha metade da expectativa de vida e índices de mortalidade infantil três vezes mais altos.

Este país foi onde eu nasci, a Suécia – há menos de 150 anos.

Naquela época a Suécia era incrivelmente pobre – e faminta. Quando havia problemas na colheita, meus ancestrais no norte do país, em Ångermanland, misturavam cascas de árvore ao pão para amenizar a fome. A vida em vilas e cidades não era mais fácil. O superpovoamento aliado à falta de serviços de saúde, saneamento e sistema de coleta de lixo provocavam mortes todo dia. No início do século XX, uma típica família de trabalhadores com cinco ou mais filhos provavelmente estaria vivendo em uma casa com um quarto e uma cozinha, que também serviam como sala de jantar e dormitório. Várias pessoas moravam com outras famílias. Estatísticas mostram que na Estocolmo de 1900, algo em torno de 1400 pessoas viviam em um único edifício com 200 apartamentos de um quarto. Em condições como essa, não é difícil imaginar que doenças eram abundantes. Os cidadãos tinham muitos filhos não somente pela falta de métodos contraceptivos, mas também pelo risco de que muitos deles não sobrevivessem por muito tempo.

Como Vilhelm Moberg, nosso maior autor, salientou quando escreveu a história do povo sueco: “De todas as maravilhosas histórias do povo sueco, nenhuma é mais extraordinária e admirável que essa: ele sobreviveu a todas.”.

Contudo, em um século, tudo mudou. A Suécia teve o maior e mais rápido desenvolvimento econômico e social que seu povo já experimentou, e um dos mais velozes que o mundo já viu. Entre 1850 e 1950 a renda média dos suecos aumentou oito vezes, enquanto a população dobrou. A mortalidade infantil diminuiu de 15 para 2%, e a expectativa de vida aumentou em inacreditáveis 28 anos. Uma nação de camponeses pobres se tornou um dos países mais ricos do mundo.

Muitos estrangeiros pensam que essa transformação foi uma vitória dos sociais-democratas suecos, que teriam, de alguma forma, achado o perfeito caminho centrista para taxar, gastar, regular e distribuir igualmente a riqueza sueca – sem destruir a capacidade de cria-la que geralmente acompanha essas políticas. Foi assim que a Suécia – um pequeno país de nove milhões de habitantes no norte da Europa – transformou-se em uma fonte de inspiração para todos aqueles que acreditam no papel do governo na criação e distribuição de riquezas.

No entanto, há algo errado com essa interpretação. Em 1950, quando a Suécia era conhecida mundialmente por sua história de sucesso, os impostos e os gastos públicos eram menores que no resto da Europa e nos Estados Unidos. Até aquele momento os políticos do país não tinham iniciado os programas de altos impostos e massiva distribuição da renda. O maior desenvolvimento social e econômico aconteceu quando a Suécia ainda possuía uma economia laissez-faire, com a igualdade social precedendo o estado de bem-estar social.

Essa é a história do que aconteceu. É a história que deveria ser ensinada por países que querem chegar onde a Suécia está hoje, porque se eles querem alcançar essa meta, eles precisam fazer o que o país fez naquela época, não o que uma já rica Suécia faz agora.

O pai do liberalismo sueco

Em 1763 Anders Chydenius, um jovem pastor de Österbotten, na Finlândia (nessa época parte da Suécia), sentou-se para escrever sua contribuição para uma competição de redações. A questão que ele iria responder era uma das mais debatidas na Suécia daquele período: “Por que tantas pessoas deixam a Suécia?”. A emigração aumentara e era vista como um grande problema. A interpretação mais comum era a de que as pessoas eram preguiçosas e gananciosas, e, em vez de assumirem responsabilidades e trabalharem duro, elas eram tentadas por promessas de uma vida mais fácil no exterior.

A resposta de Chydenius foi o oposto. Não há nada de errado com a emigração, ele escreveu. O problema é o opressivo e corrupto sistema que torna impossível as pessoas continuarem na Suécia e construírem uma boa vida no país. Ao detalhar todos os abusos, regulamentações e impostos que destruíam oportunidades, Chydenius esquematizou com base no laissez-faire uma radical crítica  ao governo sueco. Ele mostrou que privilégios, licenças e proibições ao comércio protegiam uma pequena e preguiçosa aristocracia e impedia dedicados trabalhadores de criarem o seu próprio destino. Altos impostos confiscavam qualquer coisa que o povo conseguia criar; um sistema de justiça corrupto tornava impossível se ganhar dos poderosos; e restrições à liberdade de imprensa faziam com que fosse ilegal reclamar disso. “Pátria sem liberdade e mérito é uma palavra forte com um significado fraco”, ele comentou.

Chydenius era um pastor moderno, influenciado pelos ideais do Iluminismo. Ele espalhou a ciência e a medicina na sua região e ajudou fazendeiros a melhorarem a produção agrícola implementando métodos mais modernos de cultivo na região. Ele também era familiarizado com as ideias dos fisiocratas franceses. Contudo, a maior parte da sua visão de mundo sobre política e economia veio da sua experiência em primeira mão com o sofrimento do seu povo. Alguns pensavam que que os pobres eram preguiçosos e sem esperanças, na melhor das hipóteses a “natureza” dos pobres deveria ser motivo de piedade. Chydenius mudou essa perspectiva para: Os pobres são inteligentes e trabalham duro – eles tiveram que ser assim para sobreviver em condições geográficas e econômicas tão adversas. O problema é que eles tem que devotar a maior parte de suas energias e trabalho evitando regulamentações, impostos e corrupção. Como consequência disso, algo que ele batalhou persistentemente contra era a legislação trabalhista, que forçava os pobres a trabalharem para os aristocratas e grandes fazendeiros, e evitavam que eles mudassem de empregador ou negociassem seus salários.

Chydenius observou casos particulares de opressão, estendendo sua crença na liberdade humana para novas áreas e universalizando isso para criar um consistente sistema de crenças libertárias. Ele queria um Estado Mínimo que garantisse “a segurança de nossas vidas e propriedades”, com as únicas funções de prevenir o povo da “violência do exterior e a opressão doméstica”. Fora dessas atribuições, o governo não deveria intervir. O tamanho do governo e dos impostos deveria ser drasticamente reduzido. Mercados e comércio deveriam ser completamente livres. Ele se opunha a subsídios até mesmo para setores econômicos que ele próprio apreciava, como a atividade agrícola e a pesca. De acordo com Chydenius, até mesmo o governo deveria ser obrigado a cumprir o Sétimo Mandamento – não roubar. Fazendeiros deveriam receber todos os direitos sobre suas terras, e até os mais pobres camponeses deviam ter o controle do seu labor. O país deveria abrir as fronteiras e permitir às pessoas transitarem livremente entre a Suécia e a Finlândia. O povo deveria ser livre para discutir ideias e chegar as suas próprias conclusões. Até mesmo em questões religiosas ela pensava que o governo deveria ser liberal e dar os mesmos direitos para todas as crenças. “Eu falo exclusivamente para a pequena, mas abençoada palavra: liberdade”, ele concluiu.

Drama no Parlamento

O que fez Chydenius uma crucial figura na história política da Suécia foi o fato dele também ser um ativista, e não apenas um teórico. Sua defesa dos direitos dos fazendeiros locais de comerciarem livremente o fizeram popular, e os pastores de sua região elegeram-no para o parlamento. Em 1765-66 ele viajou para Estocolmo, onde deixou um duradouro legado em seu país. Isso aconteceu durante um pequeno período em que a Suécia possuía uma monarquia fraca e um parlamento forte. Em 1765, o partido antirrusso “Partido do Chapéu” [N.R.: No original em inglês Hat Party] perdeu poder para os “gorros” [N.R.: caps], que eram um pouco mais interessados na paz e em restringir os gastos do governo, mas não tinham uma ideologia coerente: Chydenius lhes deu uma. (A ala do parlamento que era mercantilista e pró-guerra nomeou os seus oponentes como “Gorros”, e, por contraste, começaram a se chamar de “Chapéus”. Os nomes pegaram.)

Por causa de sua habilidade política e uma série de panfletos bem feitos que ele publicou no parlamento, Chydenius  se tornou o líder da ala não-aristocrática do “Partido do Gorro”. Isso o levou a uma bem sucedida vitória parlamentar na liberalização do comércio, redução de subsídios e diminuição de impostos. Mais importante que isso, Chydenius conseguiu ganhar apoio para um estatuto que permitisse liberdade de imprensa, abolindo a censura na Suécia. Como resultado, as decisões das autoridades tornaram-se públicas. Isso era único no mundo em 1766, e a Suécia logo ganhou reputação por ser um país onde o debate era livre.

Um panfleto que Chydenius publicou foi mais importante que os outros. O Ganho Nacional foi um curto, mas forte, argumento a favor da liberdade econômica. Nele Chydenius explicou que um livre mercado se autorregula com base nos lucros e no mecanismo de preços que nos mantêm estimulados para ajudar os outros na produção de bens e serviços que eles mais querem:

Todo indivíduo espontaneamente tenta achar o lugar e o comércio no qual ele melhor incrementa o Ganho Nacional, se as leis não o impedirem de fazer isso.

Todo homem busca seu próprio ganho. Essa inclinação é tão natural e necessária que todas as comunidades do mundo são fundadas nesse princípio. De outra forma, leis, punição e recompensa não existiriam e a humanidade logo pereceria junta. O trabalho que tem o maior valor é sempre a mais bem pago, e o que é mais pago é o mais desejado

Esse conceito do Ganho Nacional, embora pareça rígido para as nossas novas empresas, é, mesmo assim, simples e fácil por si só.

Isso dá liberdade para todas as trocas legais, mas sem prejudicar os outros. Isso protege os empreendimentos dos mais pobres, encoraja a dedicação e o livre comércio.

Considera todos nas mesmas escalas, e ganho é a medida certa que mostra quem deveria ter a preferência.

Isso livra o governo de milhares de preocupações nada fáceis, estatutos e supervisões, quando os ganhos privados e nacionais tornam-se um só interesse, e o egoísta prejudicial, que sempre tenta se cobrir em baixo dos estatutos, pode ser, certamente, controlado pela competição mútua.

Isso permite a um sueco exercer o maior e mais prezado direito que a Natureza do Todo-Poderoso deu-lhe, como apoiar a si mesmo no suor de sua testa da forma que ele achar ser a melhor.

Isso tira toda a preguiça dos ombros daqueles que, graças a seus privilégios, podem agora dormir dois terços de seu tempo de forma segura. Todos os expedientes para viver sem trabalhar serão removidos e nada, senão os diligentes, poderão viver bem.

Isso gera uma desejável redução nas ações judiciais. Os inúmeros estatutos, suas explicações, exceções e aplicações, as quais limitam o comércio de uma forma ou outra, serão então desnecessárias e silenciadas, e quando a lei for anulada, sua quebra não significará nada.

Nossas simples observações do poder do mecanismo de preços e da auto-regulamentação do livre mercado, Chydenius construiu sua visão do liberalismo econômico. Isso foi a mão invisível onze anos antes d’”A Riqueza das Nações“, e Chydenius fora, de fato, chamado de “o Adam Smith nórdico”. De acordo com Eli Heckscher, um dos mais famosos economistas suecos do século XX, o panfleto provavelmente iria ter uma grande repercussão internacional se, naquela época, tivesse sido traduzido para alguma língua com maior número de falantes.

O radicalismo de Chydenius alienou a nobreza dentro de seu próprio partido, e ele foi na verdade descartado do parlamento pelo partido por causa de sua crítica aberta às políticas monetárias. Contudo, sua influência continuou a crescer, parcialmente porque as políticas monetárias levaram a uma crise, justamente como ele advertira. Muitas das mais importantes figuras da elite cultural, que eram próximas ao rei Gustaf III, foram fortemente influenciadas pelos pensamentos de Chydenius. Isso vale para Nil Von Rosenstein, um defensor do iluminismo que liderou a Academia Sueca; e o famoso poeta Johan Henrik Kellgren, que atacou o misticismo religioso e os conservadores em suas obras e poemas, e explicou por que o mercado deveria ser liberalizado em ensaios econômicos. Von Rosenstein e Kellgren até mesmo iniciaram uma organização, com eles como os únicos membros, para debochar as ocultas e supersticiosas organizações do final do século XVIII na Suécia. Era chamada “Pro sensu communi” (For Common Sense) e respeitava o dia 29 de agosto – aniversário de John Locke – como feriado. A visão deles era a de que seres humanos eram criaturas racionais que necessitavam pensar por si mesmos para entender o mundo e decidir como viver, por isso, a coerção deveria ser abolida na medida que nos impelia contra nossas decisões racionais.

O próprio rei assinou uma proposta de liberdade religiosa, elaborado por Chydenius, que garantiu aos judeus o direito de se morarem na Suécia. Ele também deu aos fazendeiros mais controle sobre suas terras e liberalizou o comércio agrícola. Contudo, o rei também deu fim à era do parlamento forte e centralizou o poder em torno de si mesmo. Depois que ele foi morto em 1792 por uma estranha conspiração entre nobres que lutaram por seus privilégios e alguns que foram inspirados pela Revolução Francesa, seu filho, Gustaf IV Adolf, usou esses poderes para censurar o debate político e suspender o parlamento. Contudo, as ideias liberais não estavam mortas. Georg Adlesparre, um oficial que chamou suas crenças na liberdade individual e direitos de propriedade como “liberais” já em 1804, publicou uma controversa revista iluminista chamada Leituras em Temas Mistos. E eles eram mistos, de fato. Poemas e estudos filosóficos eram publicados próximos a artigos sobre liberalização da indústria de álcool e a primeira tradução de A Riqueza das Nações para o sueco. Adlersparre adicionou uma nota de rodapé para explicar como as ideias de Smith poderiam ser implementadas na Suécia.

Uma nova oposição

Quando as políticas do rei levaram o país à estagnação e conflitos com a Rússia, Dinamarca e França, os suecos ficaram cada vez mais hostis ao seu poder. Além disso, tributação e inflação aumentaram o fardo que o povo tinha que carregar. No final de 1808, os militares suecos tiveram que abandonar o leste do território – a Finlândia – para tropas russas. O ressentimento contra o rei que não conseguia suprir o exército, mas se recusava a procurar a paz, cresceu até mesmo em círculos militares. Nesse momento, Adlesparre, que agora liderava o exército sueco do oeste, publicou uma proclamação dizendo que os conflitos militares e a opressão estavam prestes a destruir a Suécia. Foi um manifesto revolucionário: para salvar o país, o exército deveria agir contra o rei. Adlesparre e suas tropas começaram uma popular marcha para Estocolmo. Por isso, o rei decidiu fugir para o sul, mas foi preso por pessoas ligadas à burocracia da capital. Para deixar claro que isso geraria mudanças políticas concretas, Adlesparre continuou a marcha e o exército ocupou Estocolmo até que um novo parlamento fosse formado e as reformas começassem a ser implementadas.

Essa foi a Revolução de 1809 – a única revolução violenta da história moderna da Suécia, e foi iniciada por um oficial e editor liberal inspirado por Adam Smith.

O caminho para a liberdade não seria tão direto quanto os liberais esperavam naquele tempo. O parlamento restaurou a liberdade de imprensa, levou adiante algumas reformas econômicas e reduziu privilégios aristocráticos. Mas os liberais, agora unidos no Partido Liberal, estavam desapontados – e ficaram ainda mais quando a Suécia teve um novo rei. Sempre desejando fazer amigos com as potências do redor, o Parlamento Sueco escolheu um dos generais de Napoleão, Jean-Baptiste Bernadotte – que logo seria Carlos XIV João da Suécia – como o novo rei. Ele surpreendeu a todos ao dar a fim a guerra com a Rússia (ele abandonou a Finlândia, mas conquistou a Noruega da Dinamarca), e também ao tomar atitudes hostis ao Iluminismo e a as propostas de se realizar mais reformas. Os liberais novamente estavam na oposição. Todavia, o fato da revolução ter restaurado a liberdade de expressão de Chydenius significava que o debate era relativamente livre e um movimento liberal genuíno poderia ser formado.

Influências da França e da Inglaterra continuaram a dar suporte para ideias libertárias no começo do século XIX. Reformas agrárias deram aos fazendeiros direitos de propriedade sobre suas terras. A produção agrícola tornou-se mais eficiente, enquanto muitas pessoas tiveram que deixar a terra. Os desempregados e os pobres mudaram-se para as cidades apenas para se depararem com indústrias que tinham muito potencial empregatício, mas estavam paradas graças a leis antiquadas. Guildas locais controlavam profissões urbanas e tomavam todas as decisões sobre quem tinha o direito de trabalhar, com qual qualidade e por qual preço. Leis e regulamentações impediram que as indústrias de ferro e de madeira expandissem-se, e uma grande quantidade de importações e exportações eram proibidas.

Um grupo cada vez maior de nobres também começou a ver problemas com uma sociedade construída em cima de privilégios e hierarquias. Ao mesmo tempo, a classe média começou a emergir. Fazendeiros que ficaram ricos com o aumento de produção, comerciantes que mostraram algum progresso econômico e serventes civis que não eram nem nobres, nem comerciantes, não se sentiam confortáveis com a antiga estrutura ou o parlamento corporativista que era dividido em quatro estados: nobres, clero, comerciantes e fazendeiros. Membros de todos esses grupos detinham capital, mas não podiam investi-lo livremente. Eles tinham ideias, mas não eram livres para implementá-las.

O arquiteto da mudança

Esses grupos começaram a achar uns aos outros no início do século XIX. E o homem que fez tudo isso acontecer foi um alto, ruivo e jovem jornalista radical, Lars Johan Hierta. Ele era um empresário de sucesso, sempre fascinado pelas últimas tecnologias, e no final tornou-se um dos homens mais ricos da Suécia graças às suas aventuras empresariais. Ele também era um político, sempre tentando criar uma aliança oposicionista no Parlamento. Mas o mais importante, em 1830 ele fundou o Aftonbladet – O Jornal Vespertino -, o primeiro jornal moderno da Suécia, um bastião do liberalismo sueco e o primeiro jornal a atacar não apenas o abuso de poder, mas sim o próprio poder político.

Hierta inaugurou Aftonbladet com o resto do dinheiro que tinha – se falhasse estaria arruinado. Mas foi um tremendo sucesso. O revolucionário Adlesparre foi o seu primeiro patrocinador. Foi o primeiro jornal sueco a combinar notícias e propagandas, e, como um periódico vespertino, podia reportar as notícias que chegavam com as correspondências matinais. Por causa do senso de humor de Hierta, o jornal era satírico e divertido mesmo tendo um forte criticismo. No Aftonbladet, a crescente classe média podia ler as primeiras “reportagens sociais” de como o país estava indo: a destituição em áreas rurais; as terríveis condições em superpovoados centros urbanos. Entretanto, eles também podiam ler sobre as soluções – liberalização e industrialização. Aftonbladet apontou para países mais liberais como exemplos: Noruega, Inglaterra, França e Estados Unidos. Em sua parede, Hierta tinha uma cópia da pintura de Trumbull da assinatura da Declaração de Independência Americana – uma declaração a qual Hierta chamava “a mais bonita fundação e verdade para uma sociedade”.

Com seu liberalismo iluminista urbano, Hierta transformou-se na voz da emergente classe média. Sua primeira proposta no Parlamento – lidando com o consumo público de álcool – diz muito sobre sua visão de mundo. Nessa época, era ilegal beber em público. Hierta pensava que isso era legislação de classe, uma vez que só os pobres eram pegos pela polícia. Ele argumentava que estar bêbado não deveria ser ilegal enquanto o bêbado não ameaçasse qualquer pessoa ou propriedade. A carreira política de Hierta foi dedicada a expandir os princípios libertários para novas esferas. Ele acreditava em total liberdade de expressão, sufrágio universal e direitos iguais para as mulheres. Seu princípio básico era que a nenhum grupo deveria ter permissão para “tirar dinheiro do bolso dos outros”, além de sempre tentar controlar os gastos governamentais. Também acreditava que todos deveriam ser livres para começar um empreendimento, incluindo um banco, e comerciar sem impedimentos.

A frase sobre não pegar dinheiro do bolso dos outros foi constantemente repetida em círculos liberais. Chydenius tinha uma expressão similar: A ninguém deveria ser permitido apoiar-se nos ombros dos outros. Isso resumia o ponto central da ideologia liberal – igualdade perante a lei, o governo não pode tomar lados. Todos os privilégios que garantiam ou negavam a certas pessoas uma posição ou comércio deveriam ser abolidos. Todos deveriam ter os mesmos direitos e serem tratados igualmente. Isso também definiu um limite natural ao tipo de intervenção que poderia ser aceita. Tudo que beneficiava um grupo à custa dos outros era rejeitado. Ao invés disso, o governo deveria lidar com os bens públicos que beneficiavam à sociedade inteira. Lei e ordem eram algo que todos concordavam. A maioria dos liberais acreditava também que o governo deveria garantir educação básica, dizendo que isso era algo que beneficiava a sociedade como um todo. Alguns, que a infraestrutura também deveria ser incluída. Alguns liberais – apesar de não o liberais radicais como Hierta – apoiavam que o governo financiasse um sistema nacional de ferrovias. Mas mesmo esses diziam que isso só porque beneficiava o país inteiro; as rotas locais de trem que beneficiavam determinadas regiões ou cidades deveriam ser financiadas privadamente.

O liberalismo de Hierta era baseado nos direitos naturais expostos por John Locke e as Revoluções Americana e Francesa, mas ele frequentemente combinava essa abordagem com os argumentos utilitários de Jeremy Bentham e dos liberais clássicos. Autores que que combinaram essas duas abordagens, como o economista francês Frédéric Bastiat; além de Richard Cobden e John Bright da Escola de Manchester; eram especialmente populares com Hierta, e ele introduziu suas ideias no Aftonbladet. O liberalismo sueco é distinto porque aproximou duas tradições ao invés de seguir apenas uma linha de pensamento – alguns diriam que isso é característico da mentalidade sueca.

O liberalismo sueco era um tipo de “liberalismo harmonioso” que afirmava que a luta entre diferentes grupos era uma ilusão. Todos os grupos e classes poderiam progredir juntos caso os privilégios fossem abolidos e às pessoas fosse permitido sustentar-se e lucrar servindo uns aos outros pelo livre mercado. Essa era a versão política do Iluminismo em progresso, e ganhou ajuda da economia clássica. Quando Adam Smith explicou que não era da benevolência do açougueiro que esperamos carne boa e barata, mas sim do seu próprio interesse, era mais que uma afirmação econômica, era também uma visão de mundo, uma maneira de dizer que o açougueiro não é meu inimigo. Se todas as trocas fossem voluntárias, nós não entraríamos em nenhum acordo a não ser que ambas as partes esperassem beneficiar-se. Juntos, nós podemos progredir e melhorar o mundo.

Liberais suecos tinham essa visão otimista de como lidar com problemas sociais. As antigas relações de segurança das guildas apenas deram segurança a um grupo pequeno. Quando elas foram abolidas, os liberais queriam ver grupos de ajuda mútua nos quais trabalhadores e famílias voluntariamente organizassem poupança para os doentes e desempregados, fundos de pensão e educação. Isso faria não apenas as pessoas melhores financeiramente, mas também ajudaria a desenvolver um senso de responsabilidade e uma habilidade de lidar com os próprios problemas.

Outros jornais oposicionistas podiam ser silenciados por suborno ou ameaças, mas o regime entendia que o Aftonbladet era diferente, um potencial líder das anteriormente dispersas forças oposicionistas. No parlamento, fazendeiros e comerciantes usavam os argumentos do Aftonbladet para incentivar reformas. Como resultado, em 1835 o governo usou uma lei antiga da última guerra para censurar esse veículo de comunicação. Contudo, com a ajuda de outros indivíduos, Hierta conseguiu a permissão para começar outro jornal. Assim, quando o Aftonbladet fechou, ele simplesmente abriu O Novo Aftonbladet. E quando esse foi fechado, ele criou O Mais Novo Aftonbladet. Esse, por sua vez, foi seguido pelo O Quarto Aftonbladet, e o quinto, o sexto, e assim foi.

O episódio deu ao Aftonbladet um grande estímulo, e Hierta tornou-se celebridade e herói para muitos. Os conservadores mais radicais diziam que a única forma de impedi-lo era atacar com força e tornar ilegais novos jornais, mas o governo não tinha coragem de fazer isso devido à popularidade de Hierta. Depois de mais de três anos de “jogos de gato e rato”, Hierta ameaçou abrir outro jornal se o atual fosse fechado. Temendo uma violenta reação do público, o governo silenciosamente derrubou a antiga lei sem nem mesmo uma decisão do parlamento. A liberdade de imprensa estava mais uma vez garantida, e todos podiam ver que o governo podia ser vencido.

Um movimento

Passo a passo, a força da oposição cresceu. Ela ganhou apoio de poetas e autores como C. J. L. Almqvist, que também escreveu agressivos artigos liberais no Aftonbladet; Fredrika Bremer, que explicou que Jesus foi o primeiro liberal, uma vez que ele era favorável a direitos individuais; e E. G. Geijer, o famoso conservador que abandonou os amigos em 1838, explicando que o mundo moderno, com seu comércio, industrialização e liberdade de expressão, parecia um milagre, e que com mais democracia e livre mercado, ele poderia ser levado a todos. Autores como Bremer e Geijer introduziram valores religiosos ao liberalismo sueco. Em contraste, pessoas como Hierta eram ateístas que não defendiam muito liberdade de crença uma vez que isso era majoritariamente superstição. A nova geração de liberais, contudo, via a liberdade religiosa como uma das mais importantes reformas.

Visões libertárias sempre foram fortes entre os fazendeiros do parlamento. Ao lutar por um sistema mais democrático, segurança nos direitos de propriedade da terra e liberdade para comerciar, eles naturalmente acabaram no lado liberal. Por um tempo, oponentes chamaram a maioria dos membros do estado dos fazendeiros como “os economistas políticos”, acusando-os de serem mais interessados na economia teórica liberal do que em políticas práticas.

No estado dos comerciantes, a cena era mista. Um novo grupo de empreendedores que queriam liberdade econômica para competir e desafiar a antiga organização, que protegia o comércio da competição. A medida que o tempo passou, o novo grupo cresceu e logo controlava o estado.

Os nobres e o clero, na maioria das vezes, rejeitavam propostas para a liberalização, deixando os votes dos estados seguidamente empatados em 2-2, bloqueando reformas. Mas entre os nobres o jeito de pensar também estava começando a mudar. Um grupo chamado de “liberais moderados” ganhou mais influência à medida que a opiniões no país transformou-se na medida em que os suecos aprenderam os positivos resultados da industrialização em outros países. Gradualmente, mas constantemente, maiorias liberais foram formadas para abolir proibições de comércio e permitir a abertura de novas indústrias.

Os liberais moderados – “os cinzas” – tornaram-se ainda mais influentes após 1848. A revolução na França assustou o rei, Oscar I, e a nobreza. Isso os ajudou a entenderem que os problemas do desenvolvimento estavam pressionando e alguma coisa tinha que ser feita para evitar uma revolução na Suécia. Entretanto, a todo custo eles queriam evitar tanto o laissez-faire radical quanto o emergente socialismo. Eles acharam sua solução nos liberais moderados, que queriam liberalização para modernizar o país, mas eles advogavam reformas, em vez de revolução, e não eram hostis à monarquia. Em 1848, o seu mais proeminente membro no parlamento, o jovem Johan Augusut Gripenstedt, foi apontado como Ministro, mas sem receber uma pasta para comandar.

Um tenente aristocrata, sempre vestido de casaco preto com um cachecol branco, Gripenstedt era de princípios, no que tangia objetivos, mas oportunista, quanto aos meios. Ele viajou para a França e descobriu as ideias de Bastiat, que se tornaram uma importante influência na sua luta pelo livre comércio e livre mercado. Além disso, ele era completamente imerso na tradição de liberalismo harmonioso, acreditando em um largo programa liberal de emancipação feminina, liberdade religiosa e mais democracia no parlamento. Contudo, ele era um estrategista. Quando o “clima” mudava para uma direção conservadora, ele não pressionava a implementação de suas ideias e não reclamava publicamente quando liberais eram forçados a deixar o governo.

Contudo, Gripenstedt estava esperando seu tempo. Ele era um político habilidoso, que sabia como fazer alianças e lidar com eventos difíceis. Ele fez a si mesmo indispensável para o governo e para o rei, e, quanto mais o forte movimento liberal crescia, mais importante era para o regime ter um forte político liberal no governo. Além disso, o rei também favorecia a proposta de Gripenstedt para um sistema de rede ferroviária na Suécia, o que muitos liberais se opunham. Em 1856, o próximo rei, Carlos XV, promoveu Gripenstedt a Ministro das Finanças.

Os liberais trabalhavam em duas frentes. No governo, Gripenstedt forçava reformas sempre que tinha chance. Além disso, ele também se opunha ao rei, promovia suas próprias ideias e frustrava planos reais de aventuras militares no exterior. Quanto mais forte Gripenstedt ficava, mais riscos ele podia tomar. Ele ainda possuía forte apoio do popular Handelstidningen (O Jornal do Comércio), em Gothemburgo, sobre a editoria efetiva de S. A. Hedlund. Ao mesmo tempo, fora do governo, Hierta e os liberais mais radicais constantemente lutavam por mais e reclamavam que Gripenstedt e o governo não liberalizavam ainda mais. Isso dava a Gripenstedt mais espaço para agir, usando a ameaça de fora do governo contra o rei e as forças mais conservadoras do governo. Reformas brandas levaram a uma melhora na economia e mais empregos, o que levou a uma aceitação a novas reformas. Logo o governo também tinha um primeiro ministro liberal moderado, Louise de Geer. Juntos, de Geer e Gripenstedt viram mudanças dramáticas na política sueca, graças as suas habilidades e a pressão externa.

Não é exagero dizer que a Suécia experimentou uma revolução liberal entre 1840 e 1865. O sistema de guildas foi abolido, e agora qualquer um poderia começar um empreendimento e competir livremente. As regulamentações que travavam o desenvolvimentos das indústrias de madeira e ferro foram suspensas. A Suécia desde 1848 tem uma lei de Sociedade Anônima. Bancos foram liberados e as taxas de juros eram desregulamentadas. Imigração e emigração se tornaram livres (e aproximadamente mais de um milhão de suecos foram para os EUA). As antigas escolas que tinham como missão fazer das crianças das elites pastores e servos civis foram trocadas por educação útil para todos. A liberdade de imprensa e religiosa foram drasticamente aumentadas. Mulheres ganharam direitos para ter e herdar propriedades, ter uma educação e uma carreira.

E logo antes de Gripenstedt deixar o governo por problemas de saúde – provavelmente malária, ele certificou-se que suas reformas seriam duradouras. Depois que os comerciantes livres conseguiram abolir as proibições de comércio e diminuir dramaticamente as tarifas, Gripenstedt ajeitou as coisas para que a Suécia entrasse em um acordo de livre comércio com França e o Reino Unido, em 1865 – um acordo com a cláusula da nação mais favorecida, na qual cada participante possuía máximo acesso ao mercado dos outros. Barreiras comerciais caíram por toda a Europa. Gripenstedt foi também fundamental na abolição do antigo parlamento com quatro estados e na criação de um novo, e mais democrático, parlamento.

O resultado

Quando Gripenstedt saiu do governo, seus críticos disseram que ele era um covarde que saiu justamente quando as pessoas veriam as destrutivas consequências de suas políticas liberais. Eles conjecturaram que os competidores internacionais destruiriam a indústria sueca e, sem o controle governamental do mercado, haveria enormes problemas quanto à qualidade dos produtos e à coordenação da produção. Quando às pessoas foi permitido abrir lojas em áreas rurais, os críticos do liberalismo disseram que as cidades estariam perdidas porque os fazendeiros não teriam motivos para ir até elas para comprar.

Raramente uma previsão foi tão embaraçosamente errada. Dois séculos depois da primeira aparição de Chydenius, a Suécia era um dos países mais ricos do planeta, e no momento em que Gripenstedt saiu do governo foi o exato momento que essa transformação começou. A renda real de um trabalhador da indústria cresceu cerca de 25 por cento por década entre 1860 e 1910, enquanto a expectativa de vida aumentou em cerca de 12 anos. Ao total, a renda real do cidadão sueco aumentou em 170% cinquenta anos, muito mais rápido que os 110% dos próximos cinquenta anos. Além disso, no final do século, o gasto público na Suécia era de cerca de 6 por cento da renda nacional.

O liberalismo transformou completamente a Suécia. De uma sociedade que era rigorosamente controlada – na qual todas as ocupações eram detalhadamente reguladas e o comércio com outros países era praticamente proibido – subitamente abriu as comportas da criatividade que estavam cerradas por séculos. A criatividade era agora recompensada, não punida. Mercados abertos e regulações mínimas significavam que o capital poderia alocar-se para as melhores ideias e as companhias eram livres para contratar e demitir. Os antigos comércios foram mecanizados, e a Suécia agora podia exportar o que fazia de melhor para o Reino Unido e outros países em troca de importações daquilo que o país não podia produzir tão bem.

Fazendeiros que adquiriram a propriedade de suas terras começaram a investir em uma melhor e mais eficiente agricultura. A indústria florestal, que agora podia exportar seu produto, tornou sua madeira – “ouro verde” – em bens de madeira serrada e pasta. As fábricas, agora desreguladas, faziam ferro e aço dos minérios que por gerações as pessoas meramente caminhavam por cima. Artesãos, libertados do antigo sistema de guildas, começar a competir por novas soluções, novos bens, novos modelos e menores preços. A produção foi “eletrificada” nas fábricas que agora podiam produzir em massa bens que até mesmo os pobres podiam comprar. Quando os bancos e as corporações eram permitidas, o capital era alocado para os mais eficientes produtores, e o suecos começaram a investir em novas máquinas e métodos capazes de produzir mais e melhores bens.

O período laissez-faire criou um bom ambiente para criadores e empreendedores. Ele engendrou uma das mais amáveis expressões suecas, snilleindustrierna – as “indústrias geniais”, significando negócios fundados ao redor de uma invenção engenhosa, ou o desenvolvimento de uma, produzindo em massa para exportação. Uma vez que se estava livre para alugar, contratar, produzir e vender, o caminho de uma ideia para um empreendimento, da genialidade para a indústria genial, se tornou bem curto.

Em certos casos, as indústrias eram estabelecidas por pessoas que eram tanto inventores quanto líderes industriais. Esses conseguiram sucesso tanto em criar algo novo quanto em levar isso aos consumidores. Lars Magnus Ericsson inventou uma central telefônica automatizada e fundou a L. M. Ericsson. Sven Wingquist inventou um rolamento autocompensador de esferas e criou a SKF. Alfred Nobel inventou a dinamite e criou a Nitroglycerin Ab (mais tarde Dyno Nobel), e Gustaf Dalén inventou um dispositivo de flash para os faróis e fundou a AGA. Alguns empreendedores comercializavam as ideias de outras pessoas: Axel Wenner-Gren, por exemplo, construiu a Electrolux ao introduzir aspiradores e refrigeradores nas casas suecas.

Foi nesse estágio que as “rodas” na qual a Suécia “rolou” para o futuro começaram a rodar. Um sucesso “vinha forte nos calcanhares” do outro.  O país agora crescera e poderia fazer mais. Água corrente e saneamento foram instalados nas casas as pessoas, as ruas e as casas eram servidas com luz elétrica.

Em 1857, Gripenstedt deu dois discursos dramáticos explicando que, com mercados livres, acesso a mercados externos e infraestrutura moderna, a Suécia, um dos mais pobres países europeus, podia se tornar um dos mais ricos. Ele foi ridicularizado pelos oponentes, que chamaram seus discursos de ingênuas “pinturas de flores”. Mas Gripenstedt riu por último. Como notado, entre 1850 e 1950, a renda per capta dos suecos aumentou oito vezes, enquanto a população dobrou. A mortalidade infantil caiu de 15 para 2%, e a expectativa de vida aumentou em incríveis 28 anos.

 “Todos são liberais hoje em dia”

O movimento liberal logrou êxito, mas estava prestes a ser vítima do próprio sucesso. Em janeiro de 1867, com um novo e mais democrático parlamento sem a divisão em estados, o liberalismo parecia triunfante. Lars Johan Hierta, o mais velho membro do parlamento, fez um discurso de boas-vindas em que ele celebrava as reformas e avisava os membros para não chegarem com novas ideias de como tirar dinheiro das pessoas. Um comentarista disse: “Agora, não existem mais partidos. Todos são liberais hoje em dia”.

Contudo, de certa forma, isso apresentava problemas para os liberais clássicos. Parecia que eles tinham terminado suas agendas. A coalizão, que antes trouxera as ideias ao trunfo, agora tinha outros interesses. Isso podia ser visto na formação de novos partidos no Parlamento. Pessoas envolvidas com o velho governo liberal começaram um Partido Ministerial, com o objetivo de defender as reformas já feitas, mas impedir novas. Um grupo menor começou o Partido Neoliberal, o qual era economicamente liberal e queria estender seus princípios quanto à cultura e aos problemas políticos, incluindo mais direitos para as mulheres, um mais extensivo Estado de Direito e mais democracia. Enquanto isso, o dominante novo partido era o Partido dos Homens do Campo, um partido para fazendeiros que tinha elementos liberais e queria redução de tarifas e descentralização do poder de Estocolmo.

De forma assustadora, os liberais se dividiram entre todos esses partidos. Gripenstedt e os liberais moderados se juntaram ao Partido Ministerial. Por um momento, Hierta e os liberais radicais se juntaram ao Partido Neoliberal, enquanto Hedlund e muitos liberais de fora de Estocolmo juntaram-se ao Partido Campestre. Isso significava que todos os partidos eram influenciados pelo liberalismo, e um governo liberal ainda comandava – mas isso também significava que o liberalismo não era mais coerente, não era mais uma força efetiva trabalhando em prol de um objetivo.

Quando os liberais e comerciantes livres perderam uma longa e agressiva campanha sobre tarifas nos grãos no final dos anos 1880s, e um novo governo conservador se formou, novas alternativas políticas emergiram. Economicamente, as tarifas não significavam muito. Elas não eram ajustadas pela inflação e se tornaram cada ano menores em termos reais, e a contínua redução nos custos de transporte mais que compensavam a perda com as tarifas. As exportações e importações da Suécia continuaram a crescer anualmente. No entanto, as tarifas tiveram consequências políticas mais sérias.

O problema era que o liberalismo harmonioso se rompeu quando um lado começou a tirar dinheiro do bolso dos outros. Todos, então, tinham um interesse em tentar conseguir recompensas e privilégios para si mesmos. Qualquer um que permanecesse um liberal e tentasse manter-se neutro veria seu bolso roubado pelos outros. Um comentador explanou que “Depois da vitória pelo protecionismo, o parlamento estava imergido em uma onda de sugestões que tinham em comum querer que o governo fosse ativo aqui e ali.”.

O movimento liberal começou a mudar como resultado. A simpatia natural de muitos era com os pobres e os trabalhadores. Agora que o governo havia os traído, ao aumentar o preço de seus pães, eles tinham que contra-atacar. No momento parecia mais importante estender as concessões, uma vez que as pessoas queriam livre comércio, mas o tinham perdido para um parlamento não democrático. Alguns liberais, contudo, tiraram outra conclusão: Visto que o governo beneficiava produtores com tarifas, agora era o momento de contra-atacar em prol dos consumidores. Alguns queriam importar as ideias de segurança-social de Bismarck e se tornaram “sociais liberais”.

Ao mesmo tempo, a alternativa conservadora, a qual tinha sido vista como morta há mais de 20 anos, era renascida em uma versão mais moderna, pró-empresas e pró-tarifas. Onde uma vez fora dito que apenas um governo forte e intervencionista poderia parar o desenvolvimento, agora era dito que apenas um governo assim poderia criar o desenvolvimento.

O que os sociais-democratas fizeram

Contudo, a mais forte nova frente era a dos socialistas, que, interessantemente, estavam organizados em uma plataforma de livre comércio. Em 1889, o Partido Social-Democrata foi fundado, e uma das suas demandas era “Nenhuma Tarifa para a Fome”. Eles reclamavam que a elite chamara o governo para destruir a igualdade ante à lei ao ajudar empresas e fazendas, e, desse modo, os trabalhadores não podiam ficar contentes em apenas esperar o crescimento econômico. Também deveriam ter os seus privilégios junto ao governo.

Esses diversos interesses significam que, no geral, o sistema liberal continuava vivo. Tanto conservadores quanto sociais democratas lutavam pela propriedade privada e conservadorismo fiscal, colaborando para manter a Suécia longe do socialismo. E quando os sociais democratas tomaram o poder, em 1932, eles rapidamente abriram mão dos planos de socializar as empresas. Os seus líderes pensaram que um aumento na produção era essencial para pagar por seus programas de reforma e ficaram impressionados com a efetividade que a economia liberal trazia para esses meios. Eles também eram fortemente influenciados por uma geração de liberais independentes como Gustaf Cassel e Eli Heckscher, os quais consideravam Chydenius como mentor intelectual. De forma interessante, muitos sociais democratas estavam, na verdade, entre os mais consistentes economicamente liberais e pró-livre comércio na Suécia.

Muito mais que outros países, a Suécia manteve um livre comércio, o que era necessário para uma pequena economia dependente de importações e exportações. Os sociais democratas e os sindicatos permitiam que setores antigos, como agricultura, transporte e indústria têxtil ficassem livres desde que novos empregos fossem criados. Eles mantiveram uma política cautelosa de manter o mercado livre para criar riqueza, permitindo ao processo de criação destrutiva fazer seu trabalho, e apenas depois distribuir –uma crescente – parte dessa riqueza. Eles sabiam que um partido socialista não seria capaz de manter seu poder na Suécia. Ao invés disso, eles criam um sistema de seguridade social que dava maiores pensões e auxílios-desemprego, licença paternidade e doença para aqueles com altos salários. A maioria dos benefícios era proporcional à quantia paga, assim a razoavelmente rica classe média poderia ter interesse em apoiar o sistema.

As regulamentações eram flexibilizadas para beneficiar as grandes indústrias – por exemplo, à medida que as leis trabalhistas eram introduzidas, exceções podiam ser feita se os sindicatos concordassem, o que eles constantemente faziam quando se tratava de grandes companhias exportadoras. Em negociações coletivas os salários de companhias pequenas e menos produtivas eram equiparados aos salários de grandes companhias, o que impunha um custo maior para as pequenas empresas. Quando a taxação era aumentada, era geralmente no consumo e, logo, regressiva, assim não interferiria nos incentivos à produção.

Tudo isso começou com políticas cautelosas. Em 1950, a Suécia era um dos países mais ricos do mundo. O total de impostos representavam 19% do PIB – mais baixo que o dos Estados Unidos e de outros países europeus. Esse número não passou de 30% até 1965. Foi uma economia aberta com um governo pequeno que produziu esses maravilhosos resultados, com uma pequena ajuda de ter se mantido fora de duas guerras mundiais.

Na sua história das políticas econômicas na Suécia, o economista Johan Myhrman concluiu que, apesar do crescimento no governo, essas políticas continuaram:

No período de 1950 a 1970, a Suécia ainda tinha uma política liberal no comércio, o que significava baixas tarifas e uma benevolente atitude perante empresas, por exemplo, com uma política tributária que admitia generosas deduções de custos de capital.

Sim, a Suécia hoje tem outra reputação. Mas isso veio depois. Nos anos 1970, com os cofres enchidos pelas grandes companhias e as cabeças cheias de ideias vindas de uma virada internacional para a esquerda, os sociais democratas começaram a expandir os benefícios e regulamentar o mercado de trabalho. Os gastos públicos quase dobraram entre 1960 e 1980, aumentando de 31 para 60% do PIB, e altos impostos os acompanharam.

Por um tempo, os sociais democratas podiam viajar o mundo e dizer como eles tinham, ao mesmo tempo, um grande governo e uma alta renda – mas apenas por um tempo, porque esse também foi o momento que o modelo começou a apresentar problemas.  O crescimento médio diminuiu para 2% nos anos de 1970, diminuindo ainda mais nos anos 80s, e isso foi antes da grande crise dos anos 90s. A moeda teve de ser desvalorizada cinco vezes para manter a indústria competitiva, sendo desvalorizada em um total de 45 por cento. Em 1990, o ano antes dos problemas econômicos sérios na Suécia, a iniciativa privada não havia criado um único emprego desde 1950, entretanto o setor público tinha ganho um milhão de novos funcionários.

Enquanto as áreas econômicas de educação e serviços tornou mais importante investir em capital humano, maiores impostos marginais sobre a renda reduziram os incentivos para indivíduos investirem nas suas habilidades e educação. Generosos benefícios aos que não trabalhavam erodiram a ética do trabalho, e um país com uma das mais saudáveis populações tornou-se um dos países com mais pessoas doentes incapazes de trabalhar.

A aliança entre o governo grande, as grandes empresas e o grande sindicalismo fez a Suécia menos flexível. Encorajar investimentos em grandes empresas funcionava bem, desde que fosse necessária pouca inovação. Quando isso mudou, o sistema apresentou problemas e a falta de crescentes pequenas e médias empresas tornou-se um problema real. As companhias que existiam não cresciam, em parte por casa dos riscos e dos custos das leis que os faziam evitar demitir empregados.

As mais importantes empresas suecas ainda são as que foram criadas durante o período laissez-faire antes da Primeira Guerra Mundial. Em 2000, apenas uma das maiores 50 companhias suecas foi fundada após 1970. Enquanto isso, serviços que podiam ter se tornado novas fontes de crescimento do setor privado, como educação e saúde, foram monopolizadas e financiadas pelo governo.

Entre 1975 e 2000, enquanto a renda per capta aumentou 72 por cento nos Estados Unidos e 64 por cento no Oeste Europeu, ela não cresceu mais do que 43 por cento na Suécia. Em 1970, a Suécia era o quarto país mais rico no ranking da OECD. Em 2000, o país já estava em 14º lugar.

Como o Ministro das Finanças Social Democrata, Bosse Ringholm, explicou em 2002:

Se a Suécia tivesse crescido à mesma taxa que a média da OECD desde 1970, nossos recursos seriam maiores em cerca de 20.000 SEK – Coroas Suecas, o equivalente a cerca de 7340 reais – a mais por mês para cada casa.

Epílogo

Não foram políticas socialistas que tornaram a Suécia um dos países mais ricos do mundo. Quando a Suécia tornou-se rica, ela tinha uma das economias mais abertas e desreguladas do mundo, e os impostos eram mais baixos que os dos Estados Unidos e da maioria do Ocidente. Os sociais democratas mantiveram a maioria das políticas intactas até os anos 70s, quando eles pensaram que essas excelentes fundações – riqueza sem precedentes, forte ética do trabalho, força de trabalho educada, indústrias mundiais de exportação e uma burocracia relativamente honesta – eram tão estáveis que o governo poderia taxar, gastar e montar um generoso sistema de bem-estar social que fosse do berço ao túmulo.

Eles não podiam. Ao menos, não sem custos. Porque o sistema de bem-estar começou a erodir as condições que outrora fizeram o modelo viável. E o quarto mais rico país tornou-se o décimo quarto dentro de três décadas.

Contudo, desde então, as coisas melhoraram um pouco para esse pequeno país nórdico. Nos anos 90s a Suécia teve um importante novo período de reformas em resposta a um crescimento “preguiçoso” e uma severa crise bancária. Tanto sociais democratas quanto partidos de centro-direita contribuíram para que os impostos marginais fossem reduzidos; mercados foram desregulamentados; o Banco Central tornou-se independente; o sistema de pensões foi reformado parcialmente com contas pessoais; fornecedores privados de saúde e cuidados geriátricos foram aceitos; e um sistema de vouchers para as escolas foi introduzido. Durante os últimos anos, os governos suecos reduziram impostos substancialmente, de 52 para 44 por cento do PIB, e aboliram impostos em presentes, heranças e propriedades.

A Suécia novamente aumentou suas exportações, criou empregos no setor privado e teve um crescimento econômico maior que o resto da Europa. A Suécia conseguiu passar pela crise de forma muito mais suave que outros países, e a dívida pública está em cerca de 30 por cento do PIB. Mas essa é outra história – apesar de não inteiramente, porque as liberalizações e os liberalizadores constantemente foram inspirados pela história de indivíduos suecos, reformas alcançadas 150 anos atrás, e uma prosperidade sem precedentes que elas produziram. Uma estátua de Lars Johan Hierta foi erigida no centro de Estocolmo e um orador social democrata do parlamento proclamou Anders Chydenius como um dos maiores pioneiros da história do Parlamento Sueco. Na parede da sala do Ministro das Finanças Anders Borg há um quadro de Gripenstedt e Chydenius – “os pais da prosperidade sueca”, de acordo com Borg.

Quando a Suécia liberalizar novamente, ela estará indo de volta ao futuro. O contexto – e o esse futuro – são as mais importantes lições que o resto do mundo pode tirar da Suécia.

Como Anders Chydenius escreveu há mais de 250 anos, nessa competição de ensaios que deu ao liberalismo sueco um impressivo começo: “Que aquilo que nosso tempo pisoteia, a posteridade pegará, e o que agora é chamado de coragem será honorado em nome da verdade.”.

Esse ensaio foi distribuído pela AtlasOne, um projeto da Atlas Network.

Fonte: Portal Liberal