Para aqueles que não dão a importância que a
Nossa senhora merece, é bom ler este artigo, melhor seria se lessem esse livro
inteiro: Os sermões
Por Padre
Antônio Vieira
De qua natus
est Jesus. (Da qual nasceu Jesus)
... Aquela
mulher prodigiosa do Apocalipse, que S. João viu com as asas estendidas, toda a
Igreja reconhece que era a Virgem Maria. E nós podemos acrescentar que era a
Virgem debaixo do nome e invocação de Senhora da Luz. A mesma luz o dizia e o
mostrava, que da peanha até a coroa toda era luzes: a peanha lua, o vestido
sol, a coroa estrelas; toda luzes e toda luz. E pois a Senhora da Luz está com
as asas abertas; metamo-nos debaixo delas, e muito dentro delas, para que
sejamos filhos da luz. Dum lucem habetis, credite in lucem ut filii lucis
sitis, diz Cristo (Jo. 12,36). Enquanto se vos oferece a luz, crede na luz,
para que sejais filhos da luz. Sabeis, cristãos, por que não acabamos de ser filhos
da luz? É porque não acabamos de crer na luz. Creiamos na luz, e creiamos que
não há maior bem no mundo que a luz, e ajudem-nos a esta fé os nossos mesmos
sentidos.
Por que estimam
os homens o ouro e a prata, mais que os outros metais? Porque têm alguma coisa
de luz. Por que estimam os diamantes e as pedras preciosas mais que as outras
pedras? Porque têm alguma coisa de luz. Por que estimam mais as sedas que as
lãs? Porque têm alguma coisa de luz. Pela luz avaliam os homens a estimação das
coisas, e avaliam bem, porque quanto mais têm de luz, mais têm de perfeição.
Vede o que
notou Santo Tomás: Neste mundo visível, umas coisas são imperfeitas, outras
perfeitas, outras perfeitíssimas; e nota ele com sutileza e advertência
angélica, que as perfeitíssimas têm luz, e dão luz; as perfeitas não têm luz
mas recebem luz; as imperfeitas nem têm luz, nem a recebem.
Os planetas, as
estrelas e o elemento do fogo, que são criaturas sublimes e perfeitíssimas, têm
luz e dão luz; o elemento do ar e o da água, que são criaturas diáfanas e
perfeitas, não têm luz mas recebem luz; a terra e todos os corpos terrestres,
que são criaturas imperfeitas e grosseiras, nem têm luz, nem recebem luz, antes
a rebatem e deitam de si. Ora, não sejamos terrestres, já que Deus nos deu uma
alma celestial; recebamos a luz, amemos a luz, busquemos a luz, e conheçamos
que nem temos, nem podemos, nem Deus nos pode dar bem nenhum que seja
verdadeiro bem, sem luz.
Ouvi umas palavras
admiráveis do apóstolo S. Tiago na sua epístola: Omne datum optim um, et omne
donum perfectum de sursum est, descendens a Patre luminum (Tg. 1,17): Toda
dádiva boa, e todo dom perfeito descende do Pai dos lumes. Notável dizer! De
maneira que quando Deus nos dá um bem que seja verdadeiramente bom, quando Deus
nos dá um bem que seja verdadeiramente perfeito, não se chama Deus pai de
misericórdias, nem fonte das liberalidades: chama-se pai dos lumes e fonte da
luz, porque no lume e na luz, que Deus nos dá com os bens, consiste a bondade e
a perfeição deles. Muitos dos que nós chamamos bens de Deus, sem luz são verdadeiramente
males, e muitos dos que nós chamamos males, com luz são verdadeiros bens.
Os favores sem
luz são castigos, e os castigos com luz são favores; as felicidades sem luz são
desgraças, e as desgraças com luz são felicidades; as riquezas sem luz são pobreza,
e a pobreza com luz são as maiores riquezas; a saúde sem luz é doença, e a
doença com luz é saúde. Enfim na luz ou falta de luz consiste todo o bem ou mal
desta vida, e todo o da outra.
Por que cuidais
que foram santos os santos, senão porque tiveram a luz que a nós nos falta?
Eles desprezaram o que nós estimamos, eles fugiram do que nós buscamos, eles
meteram debaixo dos pés o que nós trazemos sobre a cabeça, porque viam as
coisas com diferente luz do que nós as vemos. Por isso Davi em todos os salmos,
por isso os profetas em todas suas orações, e a Igreja nas suas, não cessam de
pedir a Deus luz e mais luz.
Esse é o dia,
cristãos, de despachar estas petições. Peçamos hoje luz para nossas trevas,
peçamos luz para nossas escuridades, peçamos luz para nossas cegueiras, luz com
que conheçamos a Deus, luz com que conheçamos o mundo, e luz com que nos conheçamos
a nós. Abramos as portas à luz para que alumie nossas casas; abramos os olhos à
luz, para que alumie nossos corações; abramos os corações à luz, para que more
perpetuamente neles. Venhamos, venhamos a buscar luz a esta fonte de luz, e
levemos daqui cheias de luz nossas almas. Com esta luz saberemos por onde havemos
de ir; com esta luz conheceremos donde nos havemos de guardar; com esta luz,
enfim, chegaremos àquela luz onde mora Deus, a que o apóstolo chamou luz
inacessível: Qui lucem inhabitat inaccessibilem (I Tim. 6,16), que só por meio
da luz que hoje nasce, se pode chegar à vista do sol que dela nasceu: De qua
natus est Jesus.
Biblioteca Subversiva: Dicas de livros
Muito obrigado por compartilhar essa maravilha!
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