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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Os economistas e a escassez

Autor Steven Horwitz

Em um mundo no qual as preocupações com o meio ambiente e os recursos naturais dominam a discussão política e são, para pessoas como Al Gore, “uma missão de geração [que fornece] um propósito moral” às nossas vidas, é fundamental pensarmos com clareza sobre questões como essas. A economia pode contribuir para essa discussão, fornecendo a sua perspectiva sobre palavras como “escassez” e “recursos”, que são com freqüência contestadas ou mal compreendidas.

Porém, a forma como os economistas usam essas palavras é vulnerável à má compreensão. Por exemplo, alguns ambientalistas acreditam que certos economistas negam a existência da escassez quando argumentam que nós não estamos verdadeiramente esgotando nossos recursos ou que a tecnologia pode solucionar qualquer problema relacionado a essa questão. Os tipos de argumentos criticados pelos ambientalistas estão mais ligados ao trabalho do falecido Julian Simon, em particular em sem livro The Ultimate Resource 2 [O recurso definitivo 2]. Entretanto, as críticas revelam uma profunda má compreensão das visões de Simon e de outros economistas pró-mercado.

É absolutamente verdadeiro que os recursos não-renováveis são limitados em termos físicos. Da perspectiva do geólogo, não há mais do que uma certa quantidade de petróleo a ser extraída.

Entretanto, da perspectiva do economista, o que importa não é a quantidade física, mas a eficiência com que um recurso satisfaz as necessidades humanas. Valorizamos o petróleo porque desejamos energia. Se através de novas tecnologias pudermos criar a mesma energia ou mais com menos petróleo, teremos sob certo aspecto mais petróleo do que tínhamos anteriormente. A quantidade existente de petróleo poderá então servir a uma quantidade maior de necessidades humanas. Além disso, a queda dos preços da extração também pode nos levar a encontrar novos campos ou à extração de recursos já conhecidos anteriormente, mas cujo alcance tinha um custo muito alto.

Então, os avanços tecnológicos realmente importam, não por abolirem a escassez, mas porque nos possibilitam prolongar os recursos que temos para que se tornem funcionalmente menos escassos do que eram antes.

Quando falamos de avanços tecnológicos, na verdade queremos dizer formas novas e mais eficientes de alcançarmos os fins para os quais os recursos antigos eram meios. Uma nova tecnologia pode nos possibilitar o uso de um recurso já existente, como o petróleo, de forma mais eficiente, mas também pode nos possibilitar soluções novas para o mesmo problema. Por décadas, a voz humana e dados foram transmitidos por cabos de cobre. Com o tempo, o preço do cobre subiu a um patamar que incentivou os empreendedores a encontrar outra forma para o fornecimento do mesmo serviço. Assim, eles desenvolveram um cabo de fibra ótica, tendo a areia como base, que pode transportar uma quantidade de dados milhares de vezes maior, por uma fração do custo do cobre. O desenvolvimento de embalagens de bebidas – caixas de suco – tem uma história similar, e vale a pena perceber que a diminuição de seu peso também reduziu o consumo de gasolina.

Quando os economistas dizem que “nunca esgotaremos os nossos recursos”, o que geralmente querem dizer é que ao nos depararmos com a crescente escassez de um recurso, nós sempre encontraremos novas soluções para o problema que aquele recurso solucionava originalmente. É importante perceber que o recurso econômico real não era o cobre, mas “a capacidade de se transportar voz e dados”. E esse recurso se tornou “menos escasso” com a substituição pela areia. Isso ilustra a idéia de Simon de que o “recurso fundamental” é a criatividade humana que encontra maneiras novas e melhores de utilizar os recursos físicos.

Embora a tecnologia possa consertar coisas, ela não existe no vácuo. As soluções tecnológicas emergem porque as instituições econômicas corretas estão a postos. O mercado dá sinais que informam às pessoas que um recurso está ficando mais escasso e fornece incentivos para que o problema seja solucionado. Mesmo alguns críticos dos argumentos ambientalistas se esquecem desse ponto. O papel das instituições fica mais claro quando analisamos questões em que a tecnologia não impediu o esgotamento dos recursos, como no caso da pesca excessiva, ocorrida em razão da ausência da propriedade privada e do aumento do preço dos peixes, que criou a “tragédia dos comuns”. A tragédia ocorre quando ninguém tem incentivo algum para poupar o recurso. E isso não é uma falha da tecnologia, mas é uma falta de instituições apropriadas. Se os comuns fossem privatizados, existiriam incentivos para o desenvolvimento de tecnologias para a conservação dos recursos.

A preocupação central da economia

O que é absurdo nas críticas aos economistas por não se importarem com a escassez dos recursos naturais é que o problema da escassez – e como lidar com ela – está no centro da disciplina. Toda a idéia dos livres mercados se baseia na alocação mais eficiente de recursos para fazer a escassez recuar e na comunicação eficiente quando um recurso se torna tão escasso que é preciso limitar seu uso e encontrar substitutos. É isso que os preços de mercado determinados através da troca de propriedade privada fazem. Também é por isso que muitos economistas têm preocupações quanto às mudanças institucionais defendidas por muitos ambientalistas. As limitações sobre a possibilidade de se possuir propriedades minam exatamente os processos que resolveriam muitos dos problemas que eles identificam.

Podemos provar que a tecnologia sempre fornecerá uma alternativa quando um recurso se tornar muito escasso? De maneira realista, não. Podemos citar vários argumentos teóricos e históricos, mas não podemos dar 100% de certeza. Entretanto, as evidências e a teoria predominantemente indicam que esgotamos os recursos quando as instituições de mercado estão em seus lugares e as pessoas são mais ou menos livres. Certamente os mercados não solucionam os problemas de forma perfeita, mas as imperfeições não fazem as instituições alternativas serem melhores. Elas poderão muito bem ser piores.

A escassez é como a gravidade: é onipresente e grande parte da nossa vida é gasta na luta para encontrarmos formas de vencê-la. A existência de elevadores e aviões não é evidência de que a gravidade é apenas um mito. Eles são nossas tentativas de desafiar exatamente essa realidade. Os elevadores melhoram nossas vidas ao nos fornecer uma forma de resistirmos à gravidade e reduzirmos as formas pelas quais ela pode frustrar nossos esforços.

As instituições do mercado nos permitem resistir à escassez tanto quanto possível, da mesma forma que os elevadores fazem com a gravidade, e, ao fazerem isso, tornam consideravelmente mais fácil para os indivíduos atingirem seus objetivos.

Alguns críticos dos argumentos econômicos em favor dos mercados também sugerem que os economistas fazem pouco da escassez quando afirmam que os mercados são “jogos” de soma positiva. É verdade que os economistas compreendem que as trocas criam riqueza para todas as partes, enquanto os críticos parecem acreditar que quaisquer ganhos são compensados por perdas ou mesmo que a riqueza de alguns causa a pobreza do resto. À primeira vista, alguém pode perceber porque essa crítica pode ser válida: como o comércio cria riqueza a partir do nada? Será que isso não parece sugerir que nós estamos negando a escassez?

De jeito nenhum. A curto prazo, o comércio – seja ele entre duas pessoas ou um ato de produção que comercialize insumos por produtos – melhora a vida das pessoas. Isso não resulta na criação de mais matéria física, mas no rearranjo do que já existia para fazer disso algo de mais valor para os seres humanos. Enquanto cada um de nós pensar que obteremos vantagens a partir da realização de uma troca, os benefícios mútuos não necessitarão da negação da escassez; pelo contrário, o comércio é mais uma forma de se afastá-la.

Esse benefício mútuo reforça a idéia de que o valor é um produto da mente humana e não do mundo físico objetivo. Na verdade, nós nem podemos compreender o conceito “recurso” sem reconhecer essa idéia. Durante a maior parte da história humana, o petróleo foi um incômodo. As pessoas não queriam terras com petróleo, porque ele poluía o solo. Entretanto, uma vez que as mentes humanas compreenderam que ele poderia ser convertido em energia, o petróleo se tornou um recurso, e à medida que começamos a buscar substitutos, como aconteceu com os cabos de cobre, ele se tornará cada vez menos um recurso. A partir de uma perspectiva econômica, o que faz algo ser um recurso e o que determina a sua escassez é a interação entre a sua quantidade física e a percepção da mente humana de que ele pode satisfazer as nossas necessidades.

A longo prazo, os benefícios do comércio, quando combinados com as instituições do mercado, criam a riqueza que as pessoas poderão poupar para financiar os investimentos que gerarão produtos melhores e mais baratos para ser comercializados. O crescimento econômico real, tangível, acontece não apenas para os ricos, mas para todos. Mais uma vez, nós estendemos ainda mais os recursos que temos.

Deixando de lado a teoria, também seria difícil negar que vários séculos de mercados mais ou menos livres produziram um aumento imenso nos padrões de vida dos mais pobres no ocidente. O mesmo está começando a acontecer em outros lugares. Argumentar que a riqueza dos ricos é a causa da pobreza dos pobres (o argumento de que “alguns ganham à custa dos outros”) contraria os fatos históricos.

A pobreza e a mortalidade infantil foram normais durante a história. O poder da propriedade privada, do livre comércio e dos mercados para mudar essa norma foi a maior força do progresso na história humana. A escassez é real e causa grandes sofrimentos para os homens, e é por isso que nós precisamos de instituições de mercado genuínas para continuarmos a reduzir os seus efeitos, principalmente sobre aqueles que mais sofrem.

Fonte: Ordem Livre

 Clique aqui para ler o artigo original em inglês.

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