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Suponha que você é
um grande empreiteiro. Sua maior fonte de lucro advém das obras que você
faz para o governo. São obras de grande porte e a fonte pagadora não
utiliza o dinheiro próprio, mas sim o dinheiro que confiscou de terceiros via
impostos. Trata-se de um arranjo que já começa propenso ao descuido e ao
desperdício por parte do contratante.
Você, como
contratado, sabe disso e irá se esforçar para encarecer ao máximo o preço de
seus serviços oferecidos ao governo. Por que não? Além de o governo
não trabalhar com dinheiro próprio, ele também não opera dentro do mercado, o
que significa que ele não tem de se preocupar com o sistema de lucros e
prejuízos. Tampouco ele é capaz de precificar corretamente o valor que
deve pagar por suas obras.
Suponha agora que
você é um político que está no comando de uma grande estatal do setor
petrolífero. Trata-se de um setor que está constantemente fazendo obras
vultosas para sua expansão, seja para construir novas plataformas marítimas,
seja para desenvolver novos maquinários ou construir novas refinarias.
Você tem de contratar empreiteiras para fazer esses serviços.
E aí acontece o
casamento perfeito.
O político irá se
aproximar do empreiteiro e ocorrerá o seguinte diálogo:
Político: Estou no comando de uma grande
estatal do setor petrolífero e vamos fazer uma vultosa obra para expandir as
operações. Vamos construir uma refinaria.
Empreiteiro: Ótimo, sou o homem certo para o
serviço. Minha empresa é conceituada e, como o senhor deve se lembrar,
fez generosas doações de campanha para o seu partido.
Político: Não me esqueci dessa bondade.
E, exatamente por isso, farei com que a sua empreiteira vença a licitação para
fazer o serviço. E a estatal irá pagar a vocês um preço bem acima do de
mercado para a construção da refinaria. Porém, como vou ter de me esforçar
para fazer com que a sua empreiteira vença a licitação, quero ganhar algo nesse
meu trabalho.
Empreiteiro: Estou ouvindo.
Político: Pensei em um arranjo que será
excelente para nós dois; um arranjo em que nós dois ganharemos e muito.
Empreiteiro: Continuo ouvindo ansioso.
Político: Eis o esquema: vou utilizar meu
tráfico de influência para fazer com que sua empreiteira ganhe a licitação para
a obra, a estatal que eu comando irá lhe pagar um valor bem acima do de mercado
pelas suas obras (aquilo que a mídia golpista chama de 'superfaturamento') e,
em troca dessa minha gentileza, você coloca um "troquinho" no meu
bolso, uma pequena porcentagem do valor total da obra. Como todo o
dinheiro está saindo da estatal, você não arcará com absolutamente nada.
Apenas uma pequena fatia que iria para a sua empreiteira vai parar no meu
bolso.
Empreiteiro: Acho justo. Mas isso não vai
afetar o caixa da estatal, seu patrimônio líquido e, consequentemente,
prejudicar o superfaturamento de obras futuras?
Político: Não se preocupe. Qualquer
zebra, o Tesouro cobre. Afinal, as estatais são do povo — no caso, apenas
os passivos.
Empreiteiro: kkk!
Político: kkk!
Empreiteiro: Magnífico. Quando começamos?
Político: Já começamos.
Esse esquema entre estatais e
empreiteiras, envolvendo superfaturamento, fraudes em licitações e desvio de
recursos das estatais para o pagamento de propina a políticos é tão antigo e
tão básico, que é impressionante que apenas agora as pessoas demonstrem
surpresa com ele.
Toda a esquisitice já começa em um
ponto: por que os políticos disputam acirradamente o comando das
estatais? Por que políticos reivindicam a diretoria de operações de uma
estatal? Que políticos comandem ministérios, vá lá. Mas a diretoria
de operações de estatais é um corpo teoricamente técnico. Por que
políticos? Qual a justificativa?
Quem acompanha o jornalismo político
já deve ter percebido que os partidos políticos que compõem o governo federal
não se engalfinham tanto na disputa de ministérios quanto se engalfinham na
disputa para a diretoria de estatais. É óbvio. É nas estatais que
está o butim. As obras contratadas por estatais são mais vultosas do que
obras contratadas por ministérios. O dinheiro de uma estatal é muito mais
farto. E, quanto mais farto, maior a facilidade para se fazer
"pequenos" desvios.
Isso, e apenas isso, já é o
suficiente para entender por que políticos e sindicalistas são contra a
privatização de estatais. Estatais fornecem uma mamata nababesca.
Quando políticos e sindicalistas
gritam "o petróleo é nosso", "o minério de ferro é nosso",
"a telefonia é nossa", "a Caixa é nossa", saiba que eles
estão sendo particularmente honestos: aquele pronome possessivo
"nosso" se refere exclusivamente a "eles", os únicos que
ganham com todo esse arranjo.
Por que estatais são ineficientes
Mas a necessidade de privatização das
estatais não está apenas no campo ético. Há também argumentos técnicos e
econômicos.
Em primeiro lugar, em qualquer
empresa que tenha como seu maior acionista o Tesouro nacional, a rede de
incentivos funciona de maneiras um tanto distintas. Eventuais maus
negócios e seus subsequentes prejuízos ou descapitalizações serão prontamente
cobertos pela viúva — ou seja, por nós, pagadores de impostos, ainda que de
modos rocambolescos e indiretos.
Os problemas de haver empresas nas
mãos do estado são óbvios demais: além de o arranjo — como explicado acima —
gerar muito dinheiro para políticos, burocratas, empreiteiras ligadas a
políticos, sindicatos e demais apaniguados, a teoria também diz que uma empresa
ser gerida pelo governo significa apenas que ela opera sem precisar se sujeitar
ao mecanismo de lucros e prejuízos.
Todos os déficits operacionais serão
cobertos pelo Tesouro, que vai utilizar o dinheiro confiscado via impostos dos
desafortunados cidadãos. Uma estatal não precisa de incentivos, pois não sofre
concorrência financeira — seus fundos, oriundos do Tesouro, em tese são
infinitos.
Por que se esforçar para ser
eficiente se você sabe que, se algo der errado, o Tesouro irá fazer aportes?
Uma empresa que não é gerida
privadamente, que não está sujeita a uma concorrência direta, nunca terá de
enfrentar riscos genuínos e nunca terá de lidar com a possibilidade de
prejuízos reais. Logo, é como se ela operasse fora do mercado, em uma dimensão
paralela.
O interesse do consumidor — e até
mesmo de seus acionistas, caso a estatal tenha capital aberto — é a última
variável a ser considerada.
Como mostram os esquemas de propinas
em licitações, estatais não operam de acordo com os sinais de preços emitidos
pelo mercado. Elas não operam segundo a lógica do sistema de lucros e
prejuízos. Se uma empresa genuinamente privada se dispusesse a pagar um
preço mais alto que o de mercado para contratar empreiteiras para fazer obras,
seu capital (patrimônio líquido) seria destruído, seus acionistas se desfariam
de suas ações, o valor de mercado da empresa despencaria e, na melhor das
hipóteses, ela teria de ser vendida para outros controladores "a preço de
banana".
Por não ter uma racionalidade, uma
preocupação com lucros e prejuízos, as estatais sempre acabam seguindo os
caprichos do governo do momento, cujos políticos do partido estão em seu
comando. Consequentemente, estatais sempre estarão sob os auspícios de
uma gente cujo horizonte temporal é de no máximo quatro anos, e inevitavelmente
se transformarão em fábricas de desperdício, ineficiência, confusão e
ressentimento.
Já nas empresas privadas que operam
em ambiente de livre concorrência a situação é diferente. Os sinais de
preços emitidos pelo mercado, bem como a preocupação em ter lucros e evitar
prejuízos, comandam as decisões. O sistema de lucros e prejuízos mostra
como os recursos escassos estão sendo empregados. Se corretamente, os
consumidores recompensam as empresas propiciando-lhes grandes lucros; se
erroneamente, os consumidores punem as empresas impondo-lhes prejuízos.
Uma expansão ou um corte nos
investimentos é algo que será guiado pelo balancete das empresas. Não
interessa se a empresa é grande ou micro: ela estará sempre em busca da
lucratividade. E a lucratividade sempre será, em última instância,
determinada pela decisão voluntária dos consumidores.
Por que as estatais devem ser
privatizadas
Empresas privadas obtêm seus fundos
por meio de investidores que estão atrás de lucro (inclusive bancos) e de
consumidores que voluntariamente optam por consumir seus bens e serviços.
É essa alocação de fundos feita por consumidores e investidores, guiados por
sua presciência e preferência temporal, que vai direcionar os recursos para as
mais lucrativas — e, portanto, mais úteis — aplicações.
Empresas privadas podem adquirir seus
fundos somente por meio de consumidores e investidores; em
outras palavras, elas podem arrecadar fundos somente daquelas pessoas que
valorizam e compram seus serviços, e daqueles investidores que estão dispostos
a arriscar seu capital poupado investindo-o em algo que acreditam poder gerar
algum lucro futuro.
Ou seja: no mercado, pagamento e
serviços são coisas indissoluvelmente complementares.
Já uma estatal, que tem como
principal acionista o governo, pode conseguir o tanto de dinheiro que
quiser. O governo não possui rédeas sobre si mesmo; ele não está sob a
exigência de satisfazer o teste de lucros e prejuízos que mede a qualidade do serviço
ofertado a seus consumidores, algo que, no mercado, é o que permite a uma
empresa obter fundos.
Empresas privadas — aquelas que
operam em um ambiente de genuína livre concorrência, sem receber subsídios,
benefícios e proteções do governo — podem adquirir seus fundos apenas de
consumidores satisfeitos e de investidores guiados pelo mecanismo de lucro e
prejuízo.
Já uma estatal pode adquirir seus
fundos de acordo com a vontade dos políticos que estão no governo.
Uma vez que não há rédeas, deixa de
haver também qualquer chance de o governo alocar recursos racionalmente.
Assim como o governo não é capaz de saber se deve construir a estrada A ou a
estrada B, ou se deve "investir" em uma estrada ou em uma escola, ele
também não sabe se deve produzir mais eletricidade, ou se deve prospectar mais
petróleo, ou se deve alterar seu serviço de entrega de cartas.
Com efeito, não há como o governo
saber o quanto deve gastar em todas as suas atividades em que
está envolvido. Simplesmente não há maneira racional de o governo alocar
fundos ou mesmo decidir o quanto ele deve ter.
O sistema de lucros e prejuízos serve
como guia crítico para direcionar o fluxo de recursos produtivos. Tal
guia não existe para o governo, que não possui uma maneira racional de
decidir o quanto de dinheiro ele deve gastar, seja no total ou
em algum setor em específico.
Defensores de empresas estatais podem
contra-argumentar dizendo que o governo poderia simplesmente dizer a seus
burocratas para agirem como se estivessem em uma empresa em busca
de lucros e que operassem da mesma maneira que uma empresa privada. Mas
há dois defeitos nessa teoria.
Primeiro, é impossível brincar de
empresa. Empreender significa arriscar o próprio dinheiro em um
investimento. Burocratas e políticos não têm incentivo real em
desenvolver habilidades empreendedoriais, em se ajustar de fato às demandas do
consumidor. Eles não arriscam a perda do próprio dinheiro no
empreendimento.
Segundo, fora a questão dos
incentivos, mesmo os mais ávidos administradores estatais não poderiam operar
como se fossem empreendedores privados. Independente do tratamento
concedido ao empreendimento após ela já ter se estabelecido, a criação da
empresa é feita com dinheiro de impostos — portanto, por meio da tributação
coerciva. Essa empresa estatal já nasceu com um grave defeito
"enraizado" em seus órgãos vitais.
Ademais, quaisquer gastos futuros
poderão ser feitos utilizando-se de novos aportes do Tesouro ou de receitas
tributárias, o que faz com que as decisões dos administradores estejam sujeitas
aos mesmos vícios. A facilidade de se obter dinheiro irá inevitavelmente
distorcer as operações da empresa estatal.
Conclusão
Por tudo isso, investimentos feitos
por uma estatal nunca poderão ser feitos da maneira correta, seus serviços
nunca serão prestados de maneira satisfatória, e sempre haverá desperdício de
recursos, gritante ineficiência e corrupção. Esta é uma realidade
inevitável. Não se trata de ideologia; é pura ciência econômica.
A solução? Privatize tudo.
Fonte:
Mises Brasil
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