A guerra religiosa entre CIA
e KGB na América Latina
Como os EUA apoiaram o avanço protestante contra a
Teologia da Libertação promovida por bispos católicos e pela KGB
Julio Severo
A guerra de informação e desinformação da União
Soviética e Estados Unidos nos tempos da Guerra Fria não se limitou apenas à
esfera política na América Latina. De acordo com dois blogueiros católicos,
enquanto a União Soviética apoiava o avanço da Teologia da Libertação, os EUA
apoiavam o avanço dos evangélicos e pentecostais.
União Soviética via a Igreja Católica na América
Latina como aliada natural da ideologia marxista e os EUA viam as igrejas
evangélicas e pentecostais, que sempre tiveram uma tendência de resistência ao
marxismo, como os aliados naturais do governo americano.
Em seu artigo intitulado “La Expansión del
Protestantismo Fue Parte del Plan de Guerra de la CIA para América del Sur” (A
expansão do protestantismo foi parte do plano de guerra da CIA para a América
do Sul), o blogueiro católico Jorge Rondón Santos cita um memorando de 1969
dirigido ao presidente Richard Nixon. O memorando, escrito pelo político
republicano Nelson Rockefeller, evangélico batista e vice-presidente dos EUA, disse
sobre a América Latina: “A Igreja Católica deixou de ser um aliado de confiança
dos Estados Unidos.” Essa informação é confirmada por Wade Clark Roof, na
página 84 de seu livro “World Order and Religion” (Ordem Mundial e Religião),
publicado em 1991 por SUNY Press. Roof era então professor de religião e
sociedade no departamento de estudos religiosos da Universidade da Califórnia
em Santa Barbara, EUA.
Santos disse que Rockefeller e o governo americano apoiaram o avanço
protestante na América Latina. A estratégia deles era fazer oposição à Teologia
da Libertação promovendo igrejas protestantes que eram rivais da Igreja
Católica.
Santos usa como exemplo especial a Guatemala, que de acordo com ele será
o primeiro país de maioria evangélica da América Latina. Ele afirma que para
fazer oposição a um catolicismo revolucionário devocional, o plano do governo
americano foi impulsionar as missões protestantes, “que com um discurso de ‘pão
e dólar’ atraíram para si milhares de pessoas pobres nos campos e nas cidades
que buscavam poder espiritual.”
José Efraín Ríos Montt, ex-militar e ex-presidente da Guatemala, usava,
durante seu governo, a cadeia nacional de rádio e televisão aos domingos para
pregar e afirmar que o povo guatemalteco era o “povo eleito” e acusando a
Igreja Católica de ser “colaboradora do marxismo,” reclamou Santos. Montt era
membro da Igreja Pentecostal Verbo.
A ligação entre missões protestantes e CIA ficou mais exposta na década
de 1980, quando vários governos militares latino-americanos expulsaram o
Instituto Linguístico de Verão (ligado à Wycliffe Bible Translators), acusando
seus missionários de serem agentes da CIA. O governo militar brasileiro, apesar
de ser antimarxista e ser bastante pró-EUA, não queria tal intrusão de espiões
missionários, especialmente na região amazônica, desconfiando que esses
missionários, que eram financiados pelos Rockefellers (empresários capitalistas
inescrupulosos), estavam de olho nas riquezas naturais da Amazônia.
Na época, achei uma grande injustiça o governo militar expulsar os
missionários americanos e escrevi uma carta de apoio ao Instituto Linguístico
de Verão. Eu apoio ainda o trabalho deles, mas só anos mais tarde é que vim a
tomar conhecimento, mediante fontes americanas e brasileiras, de que de fato havia
e há no Brasil missionários americanos ligados à CIA.
Embora tenha sido muito útil o apoio financeiro, estratégico e logístico
de Nelson Rockefeller ao avanço evangélico e pentecostal na América Latina para
contra-atacar o avanço esquerdista religioso vindo da Igreja Católica, não se
pode deixar de notar também que ele estava por trás do infame NSSM 200, ou Relatório Kissinger,
documento secreto do governo dos EUA, elaborado em 1974, que tratava da
preservação dos recursos de outros países para os interesses dos EUA tendo como
foco a redução populacional desses países. O propósito dessa redução era
enfraquecer a oposição aos interesses dos EUA.
O efeito danoso da estratégia de Rockefeller no NSSM 200 é que a meta de
redução populacional não atingia somente católicos esquerdistas, mas também os
evangélicos e pentecostais que ele dizia apoiar e que foram igualmente vítimas
de propaganda e políticas de redução populacional disfarçadas de “planejamento
familiar.”
O único acerto de Rockefeller foi identificar a Teologia da Libertação
como ameaça. De acordo com o blogueiro católico americano
esquerdista Mike Rivage-Seul, em seu artigo “The First Religious War of the
21st Century” (A primeira guerra religiosa do século XXI): “O Relatório
Rockefeller de 1969 já identificava a Teologia da Libertação como uma ameaça à
segurança nacional dos Estados Unidos… O governo [de Ronald Reagan] deu atenção
ao aviso, e respondeu de forma tanto militar quanto ideológica.”
De acordo com Rivage-Seul, havia um acordo em que Ronald Reagan ajudaria
o Papa João Paulo II na campanha contra o comunismo na Polônia e, em troca, o
papa ficaria em silêncio com relação às campanhas americanas contra os
católicos esquerdistas latino-americanos. A colaboração papal aconteceu também
com a substituição gradual de bispos pró-Teologia da Libertação por bispos
conservadores. Mas passadas mais de três décadas, grande ainda é o número de
bispos católicos pró-Teologia da Libertação. As substituições foram insuficientes.
A própria luta anticomunista de João Paulo II era imperfeita, pois ele
era grande apoiador de Yasser Arafat, fundador da Organização para a Libertação
da Palestina (OLP), entidade islâmica de caráter terrorista que lutava contra o
Estado de Israel. Nessa luta, o Vaticano estava mais à vontade com a OLP, que
promovia uma versão palestina da Teologia da Libertação.
Hoje, o Vaticano sob o Papa Francisco está muito mais alinhado com a
ideologia esquerdista, tendo autorizado o processo de beatificação de Dom Hélder
Câmara, fundador da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil)
e patrono da esquerda católica no Brasil.
Como se não bastasse o esquerdismo predominante no catolicismo
brasileiro, missionários católicos americanos que vinham ao Brasil traziam a
mesma ideologia. Em 2005, foi assassinada no Brasil a freira americana
Dorothy Stang, que era adepta da Teologia da Libertação. Alegadamente, ela foi
assassinada por atividades políticas e ambientalistas no Brasil desde a década
de 1970.
Diante do cenário de guerra religiosa durante a Guerra Fria em que a
União Soviética usava os católicos e os EUA usavam os evangélicos e
pentecostais, estranha-me então que um blogueiro católico brasileiro tenha dito que
“o marxismo é produto do protestantismo,” quando a realidade é que a região
mais católica do mundo, a América Latina, tem sido em grande parte um celeiro e
aliado do marxismo, enquanto o protestantismo, especialmente as versões
pentecostais, tem em grande parte resistido ao marxismo.
Outro católico brasileiro afirma que a primeira sociedade totalitária
(de linha marxista) da Idade Moderna foi o protestantismo em Genebra sob
Calvino.
Contudo, ao considerar o crescimento populacional latino-americano,
especialmente do Brasil, como ameaça à segurança nacional dos EUA, Nelson
Rockefeller e o governo dos EUA, conforme evidenciado no NSSM 200, prejudicaram
tanto católicos pró-marxismo quanto evangélicos antimarxismo.
O NSSM 200 foi produzido por um governo republicano dos EUA, o governo
de Richard Nixon, durante o qual o aborto foi nacionalmente legalizado nos EUA
desde a concepção até o parto, em 1973. Aliás, Rockefeller também era do
Partido Republicano, que supostamente é conservador e não quer intromissão nos
assuntos internos das outras nações.
Embora tenha trazido grandes benefícios para os evangélicos e
pentecostais da América Latina (não na questão de controle populacional), a
luta desses republicanos de mentalidade mundana em nada ajudou a mudar o
destino dos EUA, que têm como atual presidente Barack Obama, muçulmano de
criação e posteriormente discipulado numa igreja protestante negra da Teologia
da Libertação.
Além disso, o governo americano não deu apoio somente a protestantes (e
também católicos) antimarxistas. Durante o governo de Jimmy Carter, que era
batista progressista (esquerdista), grande foi o apoio americano ao Conselho
Mundial de Igrejas (composto de protestantes esquerdistas) e bispos católicos
brasileiros. Documentos colhidos pelo governo de Carter contra o
governo militar brasileiro foram usados dois anos atrás pelo governo de Obama
para ajudar Dilma Rousseff no fortalecimento de seu governo socialista contra
tentativas militares de desestabilizá-la. Mas a desestabilização, e
principalmente o impeachment dela, está vindo exatamente de pentecostais,
inimigos tradicionais do marxismo e amigos e aliados de governos americanos que
sejam honestamente conservadores.
Aliás, pentecostais podem ser amigos e aliados de qualquer governo,
independente se americano ou não, que seja honestamente conservador. Se um
governante de hoje ousar resistir à tendência politicamente correta de
valorizar abortos e “casamentos” gays, ele terá apoio de cristãos
conservadores, especialmente pentecostais.
A guerra religiosa de hoje não é mais entre CIA e KBG. Não é mais entre
União Soviética e EUA. Agora, é entre valores pró-vida e imposições pró-aborto;
valores pró-família e imposição de “casamentos” gays. Os pentecostais estão
mais que dispostos a apoiar o lado certo dessa guerra.
Mas os católicos do Brasil, o maior país católico do mundo, continuam
confusos ao serem liderados há décadas por uma maioria de bispos pró-Teologia
da Libertação.
Os tempos mudaram. Não há mais uma União Soviética. Mas o governo dos
EUA, sob Obama, poderia estar mais do que disposto a tirar vantagem da confusão
deles, uma confusão que está também tragando os pentecostais cada vez mais
hipnotizados pelas versões protestantes da Teologia da Libertação.
Versão em
inglês deste artigo: The Religious War
between CIA and KGB in Latin America
Fonte: www.juliosevero.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente! Boa parte dos conhecimentos surgiu dos questionamentos.
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.