por Thomas Sowell
Quando adolescentes criminosos e assassinos são
rotulados de "jovens problemáticos" por pessoas que se identificam
como sendo de esquerda, isso nos diz mais sobre a mentalidade da própria
esquerda do que sobre esses criminosos violentos propriamente ditos.
Raramente há alguma evidência de que os criminosos sejam
meramente 'problemáticos', e frequentemente abundam evidências de que eles na
realidade estão apenas se divertindo enormemente ao cometer seus atos
criminosos sobre terceiros.
Por que então essa desculpa já arraigada? Por que rotular
adolescentes criminosos de "jovens problemáticos" e supor que
maníacos homicidas são meros "doentes"?
Pelo menos desde o século XVIII a esquerda vem se esforçando
para não lidar com o simples fato de que a maldade existe — que algumas pessoas
simplesmente optam por fazer coisas que elas sabem de antemão serem
erradas. Todo o tipo de desculpa, desde pobreza até adolescência infeliz,
é utilizada pela esquerda para explicar, justificar e isentar a maldade.
Todas as pessoas que saíram da pobreza ou que tiveram uma
infância infeliz, ou ambas, e que se tornaram seres humanos decentes e
produtivos, sem jamais praticarem atos violentos, são ignoradas pela esquerda,
que também ignora o fato de que a maldade independe da renda e das origens, uma
vez que ela também é cometida por gente criada na riqueza e no privilégio, como
reis, conquistadores e escravocratas.
Logo, por que a existência do mal sempre
foi um conceito tão difícil para ser aceito por muitos da esquerda? O objetivo
básico da esquerda sempre foi o de mudar as condições externas da
humanidade. Mas e se o problema for interno? E se o verdadeiro
problema for a perversidade dos seres humanos?
Rousseau negou esta hipótese no século
XVIII e a esquerda a vem negando desde então. Por quê?
Autopreservação. Afinal, se as coisas que a esquerda quer controlar —
instituições e políticas governamentais — não são os fatores definidores dos
problemas do mundo, então qual função restaria à esquerda?
E se fatores como a família, a cultura e
as tradições exercerem mais influência positiva do que as novas e iluminadas
"soluções" governamentais que a esquerda está constantemente
inventando? E se a busca pelas "raízes da criminalidade" não
for nem minimamente tão eficaz quanto retirar criminosos de circulação?
As estatísticas ao redor do mundo mostram que as taxas de homicídio estavam em
declínio durante as décadas em que vigoravam as velhas e tradicionais práticas
tão desdenhadas pela intelligentsia esquerdista. Já
quando as novas e brilhantes ideias da esquerda ganharam influência, no final
da década de 1960, a criminalidade e violência urbana dispararam.
O que houve quando ideias antiquadas
sobre sexo foram substituídas, ainda na década de 1960, pelas novas e brilhantes
ideias da esquerda, as quais foram introduzidas nas escolas sob a alcunha de
"educação sexual" e que supostamente deveriam reduzir a gravidez na
adolescência e as doenças sexualmente transmissíveis? Tanto a gravidez na
adolescência quanto as doenças sexualmente transmissíveis vinham caindo havia
anos. No entanto, esta tendência foi subitamente revertida na década de
1960 e atingiu recordes históricos.
Desarmamento
Uma das mais antigas e mais dogmáticas
cruzadas da esquerda é aquela em prol do desarmamento. Aqui, novamente, o
enfoque está nas questões externas — no caso, nas armas.
Se as armas de fato fossem o problema,
então leis de controle de armas poderiam ser a resposta. Mas se o
verdadeiro problema são aquelas pessoas malvadas que não se importam com a vida
de outras pessoas — e nem muito menos para as leis —, então o desarmamento, na
prática, fará apenas com que pessoas decentes e cumpridoras da lei se tornem
ainda mais vulneráveis perante pessoas perversas.
Dado que a crença no desarmamento sempre
foi uma grande característica da esquerda desde o século XVIII, em todos os países
ao redor do mundo, seria de se imaginar que, a esta altura, já haveria
incontáveis evidências dando sustentação a esta crença. No entanto,
evidências de que o desarmamento de fato reduz as taxas de criminalidade em
geral, ou as taxas de homicídio em particular, raramente são mencionadas por
defensores do controle de armas. Simplesmente se pressupõe, de passagem,
que é óbvio que leis mais rigorosas de controle de armas irão reduzir os
homicídios e a criminalidade.
No entanto, a crua realidade não dá
sustento a esta pressuposição. É por isso que são os críticos do
desarmamento que se baseiam em evidências empíricas, todas elas magnificamente
coletadas nos livros "More Guns, Less Crime", de John Lott, e
"Guns and Violence", de Joyce Lee Malcolm.
[Veja nossos artigos sobre desarmamento].
Mas que importância têm os fatos perante a visão inebriante e emotiva da
esquerda?
Pobres
A esquerda sempre se arrogou a função de
protetora dos "pobres". Está é uma de suas principais
reivindicações morais para adquirir poder político. Porém, qual a real
veracidade desta alegação?
É verdade que líderes de esquerda em
vários países adotaram políticas assistencialistas que permitem aos pobres
viverem mais confortavelmente em sua pobreza. Mas isso nos leva a uma
questão fundamental: quem realmente são "os pobres"?
Se você se baseia em uma definição de
pobreza inventada por burocratas, como aquela que inclui um número de
indivíduos ou de famílias abaixo de algum nível de renda arbitrariamente
estipulado pelo governo, então realmente é fácil conseguir estatísticas sobre
"os pobres". Elas são rotineiramente divulgadas pela mídia e
gostosamente adotadas por políticos. Mas será que tais estatísticas têm
muita relação com a realidade?
Houve um tempo em que
"pobreza" tinha um significado concreto — uma quantidade insuficiente
de comida para se manter vivo, ou roupas e abrigos incapazes de proteger um
indivíduo dos elementos da natureza. Hoje, "pobreza" significa
qualquer coisa que os burocratas do governo, que inventam os critérios estatísticos,
queiram que signifique. E eles têm todos os incentivos para definir
pobreza de uma maneira que abranja um número suficientemente alto de pessoas,
pois isso justifica mais gastos assistencialistas e, consequentemente, mais
votos e mais poder político.
Em vários países do mundo, não são
poucas as pessoas que são consideradas pobres, mas que, além de terem acesso a
vários bens de consumo que outrora seriam considerados luxuosos — como
televisão, computador e carro —, são também muito bem alimentadas (em alguns
casos, até mesmo apresentam sobrepeso). No entanto, uma definição
arbitrária de palavras e números concede a essas pessoas livre acesso ao
dinheiro dos pagadores de impostos.
Esse tipo de "pobreza" pode
facilmente vir a se tornar um modo de vida, não apenas para os
"pobres" de hoje, mas também para seus filhos e netos.
Mesmo quando esses indivíduos
classificados como "pobres" têm o potencial de se tornar membros
produtivos da sociedade, a simples ameaça de perder os benefícios
assistencialistas caso consigam um emprego funciona como uma espécie de
"imposto implícito" sobre sua renda futura, imposto este que, em
termos relativos, seria maior do que o imposto explícito que incide sobre o
aumento da renda de um milionário.
Em suma, as políticas assistencialistas
defendidas pela esquerda tornam a pobreza mais confortável ao mesmo tempo em
que penalizam tentativas de se sair da pobreza. Exceto para aqueles que
acreditam que algumas pessoas nascem predestinadas a serem pobres para sempre,
o fato é que a agenda da esquerda é um desserviço para os mais pobres, bem como
para toda a sociedade. Ao contrário do que outros dizem, a enorme quantia
de dinheiro desperdiçada no aparato burocrático necessário para gerenciar todas
as políticas sociais não é nem de longe o pior problema dessa questão.
Se o objetivo é retirar pessoas da pobreza,
há vários exemplos encorajadores de indivíduos e de grupos que lograram este
feito, e nos mais diferentes países do mundo.
Milhões de "chineses
expatriados" emigraram da China completamente destituídos e quase sempre
iletrados. E isso ocorreu ao longo dos séculos. Independentemente
de para onde tenham ido — se para outros países do Sudeste Asiático ou para os
EUA —, eles sempre começaram lá embaixo, aceitando empregos duros, sujos e
frequentemente perigosos.
Mesmo sendo frequentemente mal pagos,
estes chineses expatriados sempre trabalhavam duro e poupavam o pouco que
recebiam. Era uma questão cultural. Vários deles conseguiram, com
sua poupança, abrir pequenos empreendimentos comerciais. Por trabalharem
longas horas e viverem frugalmente, eles foram capazes de transformar pequenos
negócios em empreendimentos maiores e mais prósperos. Eles se esforçaram
para dar a seus filhos a educação que eles próprios não conseguiram obter.
Já em 1994, os 57 milhões de chineses
expatriados haviam criado praticamente a mesma riqueza que o bilhão de pessoas
que viviam na China.
Variações deste padrão social podem ser
encontradas nas histórias de judeus, armênios, libaneses e outros emigrantes
que se estabeleceram em vários países ao redor do mundo — inicialmente pobres,
foram crescendo ao longo de gerações até atingirem a prosperidade.
Raramente recorreram ao governo, e quase sempre evitaram a política ao longo de
sua ascensão social.
Tais grupos se concentraram em desenvolver
aquilo que economistas chamam de "capital humano" — seus talentos,
habilidades, aptidões e disciplina. Seus êxitos frequentemente ocorreram
em decorrência daquela palavra que a esquerda raramente utiliza em seus
círculos refinados: "trabalho".
Em praticamente todos os grupos sociais
e étnicos, existem indivíduos que seguem padrões similares para ascenderem da
pobreza à prosperidade. Mas o número desses indivíduos em cada grupo faz
uma grande diferença para a prosperidade ou a pobreza destes grupos como um
todo.
A agenda da esquerda — promover a inveja
e o ressentimento ao mesmo tempo em que vocifera exigindo ter
"direitos" sobre o que outras pessoas produziram — é um padrão que
tem se difundido em vários países ao redor do mundo.
Esta agenda raramente teve êxito em
retirar os pobres da pobreza. O que ela de fato logrou foi elevar a
esquerda a cargos de poder e a posições de autoexaltação — ao mesmo tempo em
que promovem políticas com resultados socialmente contraproducentes.
A arrogância
É difícil encontrar um esquerdista que
ainda não tenha inventado uma nova "solução" para os
"problemas" da sociedade. Com frequência, tem-se a impressão de
que existem mais soluções do que problemas. A realidade, no entanto, é
que vários dos problemas de hoje são resultado das soluções de ontem.
No cerne da visão de mundo da esquerda
jaz a tácita presunção de que pessoas imbuídas de elevados ideais e princípios
morais — como os esquerdistas — sabem como tomar decisões para outras pessoas
de forma melhor e mais eficaz do que estas próprias pessoas.
Esta presunção arbitrária e infundada
pode ser encontrada em praticamente todas as políticas e regulamentações
criadas ao longo dos anos, desde renovação urbana até serviços de saúde.
Pessoas que nunca gerenciaram nem sequer uma pequena farmácia — muito menos um
hospital — saem por aí jubilosamente prescrevendo regras sobre como deve
funcionar o sistema de saúde, impondo arbitrariamente seus caprichos e
especificidades a médicos, hospitais, empresas farmacêuticas e planos de saúde.
Uma das várias cruzadas internacionais
empreendidas por intrometidos de esquerda é a tentativa de limitar as horas de
trabalho de pessoas de outros países — especialmente países pobres — em
empresas operadas por corporações multinacionais. Um grupo de
monitoramento internacional se autoatribuiu a tarefa de garantir que as pessoas
na China não trabalhem mais do que as legalmente determinadas 49 horas por
semana.
Por que grupos de monitoramento
internacional, liderados por americanos e europeus abastados, imaginam ser
capazes de saber o que é melhor para pessoas que são muito mais pobres do que
eles, e que possuem muito menos opções, é um daqueles insondáveis mistérios que
permeiam a intelligentsia.
Na condição de alguém que saiu de casa
aos 17 anos de idade, sem ter se formado no colégio, sem experiência no mercado
de trabalho, e sem habilidades específicas, passei vários anos de minha vida
aprendendo da maneira mais difícil o que realmente é a pobreza. Um dos
momentos mais felizes durante aqueles anos ocorreu durante um breve período em
que trabalhei 60 horas por semana — 40 horas entregando telegramas durante o
dia e 20 horas trabalhando meio período em uma oficina de usinagem à noite.
Por que eu estava feliz? Porque
antes de encontrar estes dois empregos eu havia gasto semanas procurando
desesperadamente qualquer emprego. Minha escassa poupança já havia
evaporado e chegado literalmente ao meu último dólar quando finalmente
encontrei o emprego de meio período à noite em uma oficina de usinagem.
Passei vários dias tendo de caminhar
vários quilômetros da pensão em que morava no Harlem até a oficina de usinagem,
que ficava imediatamente abaixo da Ponte do Brooklyn, e tudo para poupar este último
dólar para poder comprar pão até finalmente chegar o dia de receber meu
primeiro salário.
Quando então encontrei um emprego de
período integral — entregar telegramas durante o dia —, o salário somado dos
dois empregos era mais do que tudo que eu já havia ganhado antes. Foi só
então que pude pagar a pensão, comer e utilizar o metrô para ir ao trabalho e
voltar.
Além de tudo isso, ainda conseguia
poupar um pouco para eventuais momentos difíceis. Ter me tornado capaz de
fazer isso era, para mim, o mais próximo do nirvana a que já havia
chegado. Para a minha sorte, naquela época não havia nenhum intrometido
de esquerda querendo me impedir de trabalhar mais horas do que eu gostaria.
Havia um salário mínimo, mas, como o
valor deste havia sido estipulado em 1938, e estávamos em 1949, seu valor já
havia se tornado insignificante em decorrência da inflação. Por causa
desta ausência de um salário mínimo efetivo, o desemprego entre adolescentes
negros no ano de 1949, que foi um ano de recessão, era apenas uma fração do que
viria a ser até mesmo durante os anos mais prósperos desde a década de 1960 até
hoje.
À medida que os moralmente ungidos
passaram a elevar o salário mínimo, a partir da década de 1950, o desemprego
entre os adolescentes negros disparou. Hoje, já estamos tão acostumados a
taxas tragicamente altas de desemprego neste grupo, que várias pessoas não
fazem a mais mínima ideia de que as coisas nem sempre foram assim — e muito
menos que foram as políticas da esquerda intrometida que geraram tais
consequências catastróficas.
Não sei o que teria sido de mim caso
tais políticas já estivessem em efeito em 1949 e houvessem me impedido de
encontrar um emprego antes de meu último dólar ser gasto.
Minha experiência pessoal é apenas um
pequeno exemplo do que ocorre quando suas opções são bastante limitadas.
Os prósperos intrometidos da esquerda estão constantemente promovendo políticas
— como encargos sociais e trabalhistas — que reduzem ainda mais as poucas
opções existentes para os pobres. Quando não reduzem empregos, tais
políticas afetam sobremaneira seus salários.
Parece que simplesmente não ocorre aos
intrometidos que as corporações multinacionais estão expandindo as opções para
os pobres dos países do terceiro mundo, ao passo que as políticas defendidas
pela esquerda estão reduzindo suas opções.
Os salários pagos pelas multinacionais
nos países pobres normalmente são muito mais altos do que os salários pagos
pelos empregadores locais. Ademais, a experiência que os empregados
ganham ao trabalhar em empresas modernas transforma-os em mão-de-obra mais
valiosa, e fez com que na China, por exemplo, os salários passassem a subir a
porcentagens de dois dígitos anualmente.
Nada é mais fácil para pessoas
diplomadas do que imaginar que elas sabem mais do que os pobres sobre o que é
melhor para eles próprios. Porém, como alguém certa vez disse, "um
tolo pode vestir seu casaco com mais facilidade do que se pedisse a ajuda de um
homem sábio para fazer isso por ele".
Thomas Sowell , um dos mais influentes
economistas americanos, é membro sênior da Hoover Institution da Universidade
de Stanford. Seu website: www.tsowell.com.
Tradução de Leandro Roque
Fonte: Mises Brasil
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