Por Luís Miguel
Queirós - 06/08/2015
Publicou em 1968 aquele que é
considerado o primeiro trabalho historiográfico a dar a verdadeira dimensão do
terror estalinista, estimando as respectivas vítimas em 20 milhões.
O historiador e
poeta britânico Robert Conquest, autor de The Great Terror: Stalin's Purge
of the Thirties (1968), considerada a primeira investigação abrangente e
detalhada da repressão estalinista nos anos 30, morreu esta segunda-feira em Stanford,
na Califórnia, onde se radicara em 1981. Tinha 98 anos e a causa da morte terá
sido uma pneumonia.
Se os chamados
processos de Moscovo tinham provocado grandes discussões no Ocidente e
estiveram na base de livros como O Zero e O Infinito (1940), de Arthur
Koestler, ou 1984 (1949), de George Orwell, Conquest veio defender que
os pseudo-julgamentos de 1936-1938, que serviram a Estaline para executar uma
boa parte da elite do partido bolchevique, incluindo dirigentes como Zinoviev,
Kamenev ou Bukharin, deviam ser olhados como um mero pormenor no contexto da
era de terror imposta pelo ditador georgiano, que teria resultado na morte de
20 milhões de pessoas.
Muitas das
informações em que Conquest se baseou tinham sido tornadas públicas durante o
chamado “degelo” da era Kruchev, entre 1956 e 1964, mas recorrendo também a
testemunhos de sobreviventes russos e ucranianos no exílio e em documentação
oficial, como os resultados dos censos populacionais, o historiador
reconstituiu o quadro geral da chamada Grande Purga, mostrando o seu grau de
centralização e sugerindo que o número de vítimas poderia atingir 20 milhões de
pessoas, somando-se os que foram executados, os que morreram de fome, sobretudo
na Ucrânia, e os que pereceram nos campos de trabalho.
Publicado cinco
anos antes de aparecer o Arquipélago Gulag, de Soljenitsin, o livro de
Conquest foi traduzido em diversas línguas e tornou-se uma referência.
Em 1990, após a
queda do Muro de Berlim, e quando a glasnost de Gorbachov veio
facilitar a consulta dos arquivos soviéticos, Conquest publicou uma versão
revista e aumentada do seu livro de 1968, a que chamou The Great Terror: A
Reassessment [traduzível por O Grande Terror: Uma Reavaliação],
no qual defende que as novas informações disponíveis confirmavam, no essencial,
as suas intuições do final dos anos 60. O escritor inglês Kingsley Amis, grande
amigo de Conquest, sugeriu mesmo que o novo livro se chamasse I Told You
So, You Fucking Fools [algo como "Eu bem lhes disse, seus malditos
idiotas”].
No entanto, as
opiniões dividiram-se e alguns historiadores defenderam que a divulgação dos
arquivos soviéticos teria vindo demonstrar que as estimativas de Conquest
tinham empolado o número de vítimas do estalinismo. Outros continuam a
sustentar que 20 milhões é um cálculo credível. Em 2008, no prefácio a uma
edição comemorativa do 40.º aniversário da publicação original de The Great
Terror, o próprio Robert Conquest observa que “os números exactos nunca
serão conhecidos com absoluta certeza”, mas defende que o total de mortes
“dificilmente poderá ser inferior” a um limite mínimo que situa entre os treze
e quinze milhões.
Agente secreto
Nascido em 1917
em Great Malvern, na região inglesa de Worcestershire, George Conquest era
filho de uma britânica e de um americano que chegara à Europa como soldado,
servindo numa unidade de ambulâncias durante a I Guerra. Robert estudou no
prestigiado Winchester College, e depois nas universidades de Grenoble, em
França, e de Oxford, onde foi bolseiro de História Moderna e se licenciou no
curso de Filosofia, Política e Economia, vocacionado para a função pública,
tendo-se doutorado com uma tese sobre a história soviética.
Nos seus tempos
de estudante universitário, aproxima-se do Partido Comunista britânico, mas
virá a tornar-se um anti-comunista convicto. Quando deflagra a II Guerra,
integra um regimento de infantaria ligeira e, em 1942, casa-se com Joan
Watkins, com quem terá dois filhos. Dois anos mais tarde é colocado na Bulgária
como oficial de ligação junto das forças búlgaras que combatiam sob o comando
soviético. É neste contexto que conhece Tatiana Mihailova, que virá a tornar-se
a sua segunda mulher em 1951.
No final da
guerra regressa a Sófia, agora enquanto funcionário do Ministério dos Negócios
Estrangeiros, e já irremediavelmente desiludido com os ideais comunistas da
juventude, após ter assistido em primeira mão ao golpe de Estado que levou ao
poder o governo pró-soviético de Kimon Stoyanov.
Conquest
integra uma agência secreta dependente do Ministério dos Negócios Estrangeiros,
a Information Research Department (IRD), criada em 1948 pelo governo
trabalhista para contrariar a propaganda soviética. Um organismo pelo qual
chegou a passar Guy Burgess, um dos agentes duplos pró-soviéticos do famoso
grupo de Cambridge.
Fonte: Publico.pt/Portugal
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