Sobre o livro
de Pascal Bernardin, L’Empire écologique
Por Charles
Lagrave (Lectures Françaises, mars 1999)
Nossos leitores lembram-se talvez de
havermos explicado nestas crônicas (1), em diversas ocasiões, como estava em
vias de operar-se o triunfo mundial do marxismo: o aparente deslocamento do
campo comunista, fazendo cessar a oposição entre os dois blocos Leste e Oeste,
permitiu a sua fusão num "liberal-socialismo" que nos leva
diretamente a uma ditadura mundial. Essa síntese hegeliana não é o resultado de
uma evolução natural, mas o resultado de uma manobra deliberada, preparada de
longa data.
Alguns leitores talvez tenham pensado
que exagerávamos, que a situação não era tão grave e que todas essas coisas
eram bem inverossímeis. A esses — e aliás também aos demais — aconselho
insistentemente comprar e ler o quanto antes o novo livro de Pascal Bernardin: L’Empire
écologique ou la subversion de l’écologie par le mondialisme ("O
império ecológico ou a subversão da ecologia pelo mundialismo", Éditions
Notre-Dame des Grâces, 1998).
Na sua obra anterior, Machiavel
pédagogue, o autor, apoiado em enorme massa de documentos oficiais,
trazia-nos a prova de que um gigantesco empreendimento de lavagem cerebral vem
se realizando no ensino, desde várias décadas, por meio das técnicas mais
elaboradas de persuasão psicológica oculta. Do mesmo modo, no presente livro,
ele estabelece, graças a uma documentação igualmente inatacável, que idêntico
empreendimento de subversão das mentalidades está em ação sob a máscara da
ecologia e que a convergência entre comunismo e capitalismo, que parece ter
aproveitado somente a este último, é na verdade uma manobra cuidadosamente
preparada para assegurar a perenidade da revolução, impondo ao mundo inteiro
uma concepção totalitária do homem e da natureza. Esta revolução ideológica
total desembocará por fim numa "espiritualidade global", isto é, numa
nova civilização e numa nova religião que estarão a serviço de um socialismo
absoluto e universal: o governo mundial.
A subversão pedagógica tem por
objetivo "modificar os valores, as atitudes e os comportamentos, proceder
a uma revolução psicológica, ética e cultural. Para chegar a isso, utilizam-se técnicas
de manipulação psicológica e sociológica. Este processo, manifestamente
revolucionário e totalitário, não encontra nenhuma resistência entre as elites,
quer sejam de direita ou de esquerda. Concebido e conduzido por instituições
internacionais, ele concerne ao conjunto do planeta, e muito raros são os
países poupados. Ele inscreve-se no projeto mundialista de tomada do poder em
escala global pelas organizações internacionais. Nesta perspectiva, os diversos
governos nacionais não serão, ou já não são, senão simples executantes
encarregados de aplicar as diretrizes que tenham sido determinadas em escalão
mundial e de adaptá-las às condições locais, que, por outro lado, eles se
esforçam para uniformizar" (2).
A difusão dessas técnicas de
manipulação psicológica e sociológica no sistema educativo mundial não pode ser
um fenômeno espontâneo, mas, ao contrário, é um trabalho "cuidadosamente
planejado e rigorosamente executado" graças aos métodos desenvolvidos
pelos soviéticos. "É certo que antes da perestroika os comunistas
tinham criado as estruturas nacionais e internacionais que permitissem à
revolução prosseguir por meios menos visíveis do que aqueles usados na sua fase
bolchevique. Outra questão maior então surge imediatamente: pode essa
estratégia ter sido aplicada em outros domínios? Ou ainda: que é,
verdadeiramente, a perestroika? Um desmoronamento real do sistema
comunista, sob a pressão de suas ‘contradições internas’, ou uma incrível
virada estratégica elaborada cuidadosamente durante muitas décadas e executada
magistralmente?(3)" A esta questão crucial, Bernardin responde, apoiado em
textos irrefutáveis, eles mesmos "corroborados pelos acontecimentos
sobrevindos após a queda do muro de Berlim, [...] que a perestroika foi
um processo revolucionário de inspiração leninista e gramscista. Seu objetivo
principal é portanto a tomada do poder em escala planetária. Nesta perspectiva,
a convergência entre capitalismo e socialismo, que se realiza diante dos nossos
olhos, não é senão uma etapa que deve conduzir à instauração de um governo
mundial..." (4).
De fato, o verdadeiro pai da perestroika
é o teórico comunista italiano Antonio Gramsci (1891-1937), o qual havia
compreendido que a revolução bolchevique, querendo modificar em primeiro lugar
as condições da vida econômica, era demasiado violenta para obter a aprovação
de um consenso generalizado, e preconizava, em conseqüência, efetuar primeiro
uma revolução ideológica, isto é, mudar antes de tudo as maneiras habituais de
pensar. "Gramsci propõe realizar primeiro a instauração de uma nova
civilização. Os meios que ele propõe parecem fracos, mas na verdade são muito
poderosos. A revolução ideológica deve ser veiculada pelos intelectuais e por
uma ditadura pedagógica. Deve ser feita em nome de imperativos éticos e
respeitar a dignidade e os direitos do homem (isto é, utilizar métodos
não-aversivos). [...] A revolução ecológica formará a ossatura das revoluções —
ideológica, religiosa, ética e cultural — veiculadas pela ditadura pedagógica.
As idéias de Gramsci são portanto indispensáveis para toda compreensão do
mundialismo e da perestroika" (5).
O
totalitarismo planetário
Após ter feito explodir
sucessivamente tudo o que era cristão, primeiro a Igreja no século XVI, depois
as monarquias católicas a partir de 1789, depois os impérios cristãos em 1918 e
por fim as sociedades cristãs. a Revolução universal prepara-se para reunificar
o mundo em torno de um novo paganismo que, como os paganismos antigos,
constituirá uma camuflagem da religião do demônio (6). Os povos se rejubilarão
de ter atingido a idade de ouro da humanidade enfim unificada, ao passo que
terão de fato caído sob o poder daquele que é "mentiroso e homicida desde
o princípio".
"A revolução ecológica em curso
efetua a síntese entre o liberalismo, o comunismo e o ‘humanismo’ maçônico que
se arraiga nos mistérios antigos e no culto da natureza. Ela permite lançar um
olhar novo sob os dois fenômenos políticos maiores deste fim de século: a
desaparição do comunismo e a emergência da Nova Ordem Mundial. Ela define-se
como a convergência das forças revolucionárias anticristãs, que sobem ao
assalto do último baluarte legado pela cristandade: a concepção inconsciente de
Deus, do homem e do mundo que define o nosso quadro intelectual. Mais ainda que
a revolução copernicana, essa mudança de paradigma (7) teria conseqüências
infinitas. A antropologia cristã contrarrestava as tendências totalitárias de
todo Estado, as quais, por definição, a perspectiva holística (8) enaltece. O
totalitarismo será então declinado em todas as suas dimensões: primeiro a
dimensão religiosa, depois as dimensões políticas e sociais. A destruição da
antropologia cristã acrescentará ainda um obstáculo maior à busca da verdadeira
fé: a perspectiva cristã se tornará estranha às gerações futuras. A destruição
do comunismo e a aparição da Nova Ordem Mundial marcam portanto a emergência de
um totalitarismo planetário inédito que muito deverá, no entanto, às concepções
pagãs. É um episódio maior da guerra de religião que o paganismo move contra o
cristianismo desde sua aparição" (9).
Esse totalitarismo planetário está
programado para se estabelecer em nome do bem-estar da humanidade, sem provocar
reação séria, pois quem desejaria lutar contra o bem? Ouçamos Gorbachov: "É
minha convicção que a raça humana entrou num estágio em que todos somos
dependentes uns dos outros. Nenhum país, nenhuma nação deveria ser considerada
isoladamente das outras, ainda menos oposta às outras. Eis o que o nosso
vocabulário comunista denomina internacionalismo, e isto significa nosso
voto de promover os valores humanos universais" (10). Ora, como
observa mui justamente Bernardin, "o interesse da humanidade substitui a
ditadura do proletariado, mas o indivíduo continua sempre esmagado ou negado" (11).
A síntese
dialética
Solve et coagula, dizem os iniciados para resumir sua estratégia:
eles começam por destruir tudo o que lhes constitui obstáculo, em seguida
passam a uma fase construtiva, não para restaurar o que abateram (mesmo se as
aparências levam a crer nisso), mas para construir algo de radicalmente
diferente. É esse movimento que Hegel sistematizou sob o nome de dialética: a
tese é o que os iniciados querem destruir, a antítese são os meios utilizados
para esse fim e a síntese é a nova construção estabelecida sobre as ruínas da
antiga — construção que aliás é sempre provisória, pois o movimento da
dialética não pode parar jamais. Com efeito, a Revolução é incapaz de atingir
um estado de equilíbrio durável, de tanto que viola a natureza humana: seu
triunfo quase absoluto, que chegará no fim dos tempos, será muito breve.
Bernardin dá-nos uma boa análise da
atual síntese dialética destinada a alcançar uma falsa paz universal que não
será senão uma ditadura assustadora: "A sociedade ainda cristã, tal como
existia antes dos movimentos revolucionários, se organizava em torno de um
princípio transcendente que lhe dava sua unidade tanto ‘nacional’ quanto
‘internacional’, se remontarmos à época em que toda a cristandade reconhecia a
autoridade suprema do Papa. A luta das classes, aí, não era senão, no máximo,
um elemento secundário. Vieram em seguida os movimentos revolucionários,
culminando com o comunismo que exacerbou o antagonismo de classes no interior
das nações e dividiu o mundo em dois blocos inimigos. Ele forneceu a antítese,
uma sociedade atéia e fragmentada na qual, em vez de procurar melhorar
verdadeiramente a condição operária, se eliminou a burguesia ou pelo menos se
alimentou o ódio em relação a ela. A síntese desses dois momentos é a
perestroika (e o mundialismo) que, renunciando a à luta de classes para tender
na direção de um ‘Estado de todo o povo’, quer recriar uma sociedade unificada,
interiormente e exteriormente, tanto no nível nacional quanto na escala
internacional. Mas, a meio caminho, no curso desse processo dialético,
perderam-se a cristandade e Deus... Temos aqui um exemplo típico daquilo que se
deve chamar, malgrado todos os legítimos argumentos teológicos opostos, a
dialética do bem e do mal. Uma situação má, no caso a divisão das sociedades e
do planeta, é provocada pelos revolucionários (antítese). As tensões nacionais
e internacionais que ela engendra clamam por um retorno ao bem, à unidade
social e ao apaziguamento dos conflitos internacionais. Mas a síntese proposta
sob o disfarce de retorno à normalidade, e que busca efetivamente voltar à
unidade social, não é de maneira alguma semelhante à situação inicial: o
mundialismo e o ‘Estado de todo o povo’ não são senão a forma mais completa e
acabada do totalitarismo integral. Trocou-se a unidade social pelo
totalitarismo, a unidade pela totalidade" (12).
Esse totalitarismo tem por objetivo
despojar o homem de sua dignidade de criatura de Deus e torná-lo pura e
simplesmente um animal:
"Desembaraçadas dos últimos
resíduos de cristianismo as mentalidades, será então possível voltar ao culto
da Terra — sob uma forma modernizada, naturalmente. A ecologia se tornará o
princípio organizador da futura civilização, sobre o qual se edificará a
espiritualidade global, pura negação da graça e do sobrenatural cristão,
retorno ao eterno naturalismo, ao paganismo. Pois, uma vez efetuada essa
mudança de paradigma, uma vez decaído o homem de sua dignidade de ente criado e
desejado pelo próprio Deus, o indivíduo necessariamente desaparece por trás da
coletividade, cujo assentamento ecológico é o que mais importa conservar: a
Terra, então elevada ao nível de Deusa-mãe. As conseqüências desse rebaixamento
então se desdobram, inelutáveis: totalitarismo, eutanásia, eugenismo, aborto,
etc. A oposição dos ecologistas não poderá impedir que o homem, rebaixado ao
nível dos animais, sofra também ele manipulações genéticas e clonagem" (13).
Dada a importância da obra,
voltaremos a falar de L’Empire écologique, mas desde já podemos dizer
aos leitores que, se tiverem de comprar não mais de um livro em 1999, será
preciso absolutamente que seja esse. A obra de Bernardin, pela sua amplitude,
ultrapassa em medida bem vasta os assuntos que citamos; seu conjunto constitui
uma admirável demonstração, magistralmente sustentada, do objetivo que o autor
se propôs: "descrever a etapa atual da Revolução, que deve desembocar na
edificação do Império ecológico, da Cidade terrestre; e mostrar como esta,
querendo se elevar até o céu, busca realizar neste mundo a Cidade celeste" (14).
Nós, cristãos, bem sabemos que é impossível restabelecer o paraíso terrestre,
mas que, em contrapartida, o inferno terrestre é sempre, e a qualquer momento,
perfeitamente realizável. Que Deus, em Sua misericórdia, se digne de nos poupar
essa provação, ou pelo menos de encurtá-la o mais possível!
Ch. Lagrave.
Tradução de Olavo de Carvalho
Nota
do Tradutor. — Como as conclusões do
livro aqui comentado parecem aproximar-se em mais de um aspecto (se bem que não
em todos) a algumas de O Jardim das Aflições (Rio, Diadorim, 1995),
julguei que seria interessante reproduzir nesta homepage o artigo
publicado em Lectures Françaises, revista que não está na Internet. — O.
de C.
NOTAS
- O autor refere-se à coluna "Réflexions sur la Politique" que escreve mensalmente em Lectures Françaises. [N. do T.]
- Pascal Bernardin, L’Empire écologique, p. 8.
- Id., p. 9.
- Ibid., p. 69.
- Ibid., pp. 54-55.
- "Os deuses dos pagãos são demônios", escrevia São Paulo.
- A palavra paradigma é aqui tomada no sentido de "maneira habitual de ver as coisas".
- Holístico ou holista é adaptação de uma palavra inglesa que significa global. O princípio holista implica especialmente a unidade dos contraditórios, o que destrói o fundamento mesmo de todo pensamento lógico. Aplicado à sociedade, esse princípio nega o indivíduo e não leva em consideração senão a comunidade, tal como numa formigueira ou cupinzeiro.
- Ibid., p. 12.
- Cit. ibid., p. 62.
- Ibid., p. 61.
- Ibid., pp. 63-64.
- Ibid., p. 573.
- Ibid., p. 570.
Execelente irei comprar o livro.
ResponderExcluir