Por Yuri
Maltsev
O século XX
testemunhou o surgimento, o desenvolvimento e o colapso do mais trágico
experimento da história humana: o socialismo. Esse experimento resultou em
monstruosas perdas humanas, na destruição de economias potencialmente ricas e
em colossais desastres ecológicos. Tal experimento (teoricamente) acabou, mas a
devastação continuará afetando a vida e a saúde das inúmeras gerações
vindouras.
Mas a
verdadeira tragédia desse experimento é que Ludwig Von Mises e seus seguidores
— dentre as melhores mentes econômicas deste século — já haviam desmascarado e
explicitado toda a realidade do socialismo ainda em 1920. Entretanto, o alerta
deles foi completamente ignorado.
No presente
ensaio, “O Cálculo Econômico sob o Socialismo”, Mises examina as alegações mais
fundamentais do marxismo. Ao fazer isso, Mises expõe o socialismo como sendo um
esquema que, além de utópico, é ilógico, antieconômico e impraticável em sua
essência. Ele é “impossível” e destinado ao fracasso porque é desprovido da
fundamentação lógica da economia; o socialismo não fornece meio algum para se
fazer qualquer cálculo econômico objetivo — o que, por conseguinte, impede que
os recursos sejam alocados em suas aplicações mais produtivas. Em 1920,
entretanto, o entusiasmo pelo socialismo era tão forte, principalmente entre os
intelectuais ocidentais, que esta pequena e perspicaz obra-prima de Mises não
apenas não foi compreendida, como também foi deliberadamente distorcida pelos
seus críticos.
Porém, a
efetiva implementação do socialismo mostrou a total validade da análise de
Mises. O socialismo tentou substituir bilhões de decisões individuais feitas
por consumidores soberanos no mercado por um “planejamento econômico racional”
feito por uma comissão de iluminados investida do poder de determinar tudo o
que seria produzido e consumido, e quando, como e por quem se daria a produção e
o consumo. Isso gerou escassez generalizada, fome e frustração em massa. Quando
o governo soviético decidiu determinar 22 milhões de preços, 460.000 salários e
mais de 90 milhões de funções para os 110 milhões de funcionários do governo, o
caos e a escassez foram o inevitável resultado. O estado socialista destruiu a
ética inerente ao trabalho, privou as pessoas da oportunidade e da iniciativa
de empreender, e difundiu amplamente uma mentalidade assistencialista.
O socialismo
produziu monstros como Stalin e Mao Tsé-tung, e cometeu crimes até então sem
precedentes contra a humanidade, em todos os estados comunistas. A destruição
da Rússia e do Camboja, bem como a humilhação sofrida pela população da China e
do Leste Europeu, não foram causadas por “distorções do socialismo”, como os defensores
dessa doutrina gostam de argumentar; elas são, isto sim, a consequência
inevitável da destruição do mercado, que começou com a tentativa de se
substituir as decisões econômicas de indivíduos livres pela “sabedoria dos
planejadores”.
A verdadeira
natureza da economia centralmente planejada foi bem ilustrada por uma tirada
espirituosa feita há alguns anos pelo economista soviético Nikolai Fedorenko.
Ele disse que, com a ajuda dos melhores computadores, um plano econômico
totalmente detalhado, ponderado e examinado, o qual deveria ser implantado já
no ano seguinte, só poderia ficar pronto em 30.000 anos. Existem milhões de tipos
de produtos e centenas de milhares de empresas; são necessárias bilhões de
decisões relativas a insumos e produtos, e os planos devem abranger todas as
variáveis relativas à força de trabalho, à oferta de materiais, aos salários,
aos custos de produção, aos preços, aos “lucros planejados”, aos investimentos,
aos meios de transporte, ao armazenamento e à distribuição. E mais: essas
decisões se originam de diferentes partes da hierarquia planejadora. Mas essas
partes são, em regra, inconsistentes e contraditórias entre si, uma vez que cada
uma reflete os interesses conflitantes de diferentes estratos da burocracia. E
como o plano precisa ficar pronto até o início do ano seguinte, e não em 29.999
anos, ele será inevitavelmente irracional e assimétrico. E Mises provou que,
sem propriedade privada dos meios de produção, mesmo 30.000 anos de cálculos
computacionais não conseguiriam fazer o socialismo funcionar.
Assim que
destruíram a instituição da propriedade privada, os defensores do socialismo se
viram em um entrave teórico e prático. Consequentemente, eles recorreram à
criação de esquemas artificiais. Na economia soviética, o lucro é planejado como
função do custo. Os planejadores centrais fornecem “variáveis de controle” às
empresas, que as utilizam para determinar os “lucros planejados” em termos da porcentagem
dos custos. Assim, quanto mais você gastar, maiores serão seus lucros. Sob uma
monopolização de 100%, esse simples arranjo arruinou completamente as economias
da União Soviética, da Europa Oriental e de outros estados “socialistas” em um
grau comparável apenas às invasões bárbaras a Roma.
Hoje, as consequências desastrosas da
imposição dessa utopia na desventurada população dos estados comunistas já
estão claras até para seus líderes. Como Mises previu em sua introdução, a
despeito da “quimera de suas fantasias”, os pombos assados acabaram não voando diretamente
para dentro das bocas dos camaradas, ao contrário do que Charles Fourier havia
dito que ocorreria. E até mesmo de acordo com as estatísticas oficiais da URSS,
234 dos 277 bens de consumo básico incluídos pelo Comitê Estatal de
Estatísticas na “cesta básica” da população soviética estão “em falta” no
sistema de distribuição do estado.
Todavia, os
defensores ocidentais do socialismo ainda seguem repetindo a mesma ladainha
sobre a necessidade de se restringir os direitos de propriedade e substituir o
mercado pela “sabedoria” do planejamento central.
Em 1920, o
mundo negligenciou e rejeitou o alerta misesiano de que “o socialismo é a
abolição da racionalidade econômica”. Não podemos nos dar ao luxo de repetir
esse erro novamente. Temos de estar sempre alerta a todos os esquemas que
porventura possam nos levar a uma nova rodada de experimentos estatais sobre as
pessoas e sobre a economia.
“A propriedade
privada dos fatores materiais de produção”, enfatizou Mises, “não representa
uma restrição na liberdade de todas as outras pessoas poderem escolher o que
melhor lhes convém. Representa, ao contrário, o mecanismo que atribui ao homem
comum, na condição de consumidor, a supremacia em todos os campos econômicos. É
o meio pelo qual se estimula os indivíduos mais empreendedores de um país a
empenhar a melhor de suas habilidades a serviço de todas as pessoas”.
Que jamais
voltemos a ignorar as constatações deste grande pensador, pelo bem da liberdade
e das gerações futuras.
Yuri N.
Maltsev1 Abril de 1990
Yuri Maltsev N., membro sênior do
Mises Institute, trabalhou como economista na equipe reformas económicas de Mikhail Gorbachev antes
de desertar para os Estados Unidos. Ele é o editor de
Requiem para Marx.
Ele ensina economia na Carthage College.
Fonte: Mises Brasil - Compre este livro, valorize a obra e o autor.
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