“Contra o que
seja estúpido, absurdo, errôneo e mau, o liberalismo luta com as armas do
pensamento, não com a força bruta e a repressão.” Ludwig von Mises (Liberalismo
Segundo a Tradição Clássica)
Seja bem vindo, amigo!
Seja bem-vindo, amigo! Seja você também mais um subversivo! Não se entregue e nem se integre às mentiras do governo e nem da mídia! Seja livre, siga o seu instinto de liberdade! Laissez faire! Amém!
Translate
domingo, 31 de maio de 2015
sábado, 30 de maio de 2015
Liberais: defensores da liberdade, não fascistas ou reacionários!
É comum que, no
ambiente acadêmico nacional dos tempos atuais, tão dilacerado e deformado por
teorias obsoletas e pela ocupação de espaços pelos comunistas, ouçamos, da boca
de estudantes, professores e até mesmo de indivíduos cujos nomes servem como
referência intelectual para determinado assunto, jargões incongruentes que, com
um toque de habilidade retórica, são disfarçados de opiniões convictas acerca
das ideias capazes de promover uma sociedade próspera e livre.
Como todo
debatedor honesto sabe, uma crítica política deve ser composta de três lastros
fundamentais: teórico, histórico e linguístico. Nenhum destes lastros, que tem
como objetivo conferir veracidade aos argumentos, pode deixar de aparecer na
argumentação de um debatedor que deseje que suas ideias expostas tenham
respaldo e sejam tidas como honestas e verdadeiras pelo público. Isto serve não
somente para um debate comum, mas sim para o meio acadêmico como um todo.
O lastro
teórico diz respeito ao conhecimento que se deve ter de uma ideia ao
critica-la. Para criticar uma teoria deve-se primeiramente conhecer a causa da
sua existência, como ela foi criada e para que se destina.
O lastro
histórico concerne ao conhecimento necessário da experiência histórica da aplicação da teoria a ser
criticada. Uma crítica é lastreada pela história quando seu argumentador aponta
o sucesso ou o fracasso da aplicação da matéria criticada em cima de fatos
comprovados, nos apresentando por meio destes fatos os prós e contras do objeto
criticado e justificando sua opinião sobre o assunto com base neste
conhecimento.
Por fim, o
lastro linguístico consiste na apresentação da ideia como um todo e na
expressão da crítica de maneira escrita ou oral. É o mais importante dos três
porque sem o uso dos termos adequados e uma boa argumentação escrita ou
dialética, a ideia ficará confusa, inverossímil e até mesmo, dependendo do que
se critica, desonesta. Sem o lastro linguístico, os outros dois tornam-se
imperceptíveis ao interlocutor.
É importante
ressaltar que se alguma crítica não apresenta nenhum destes três lastros, ela
simplesmente está desprovida de qualquer fundamento argumentativo que deva ser
levado a sério.
Quando me
deparo com um professor ou com um estudante que tem seu repertório
teórico-ideológico moldado pelos ideais comunistas, já me preparo para me dar
conta da ausência de um dos três lastros fundamentais, ou até mesmo de todos os
três, em seu discurso argumentativo, visto que os mesmos montam seus discursos
apenas em cima da dialética, isto é, da arte do bem falar e do convencimento do
interlocutor através da fala.
Não importa o
quão absurdo seja o seu ataque ao liberalismo, ao conservadorismo ou ao
libertarianismo, não importam as expressões sem nexo e incongruentes que o
crítico usa. O que interessa, nesse caso, é apenas ser “do contra” e utilizar
jargões que promovam o efeito mental que se deseja no público e, na maior parte
das vezes, os jargões são profundamente desonestos, mostrando mais ignorância e
desespero do que real conhecimento sobre o assunto por parte dos comunistas. A
profundidade e o conhecimento são pouco encontrados nas suas argumentações.
Um típico
exemplo é o uso desenfreado dos termos “fascista” e “reacionário” para criticar
e rotular liberais. Qual liberal e qual conservador nunca foi chamado de
fascista e de reacionário no Brasil?
Primeiramente,
trata-se de uma crítica sordidamente desonesta. Quem chama um liberal de
fascista sabe que ele não o é, mas faz isso por puro automatismo cerebral
oriundo da convivência diária com deformações ideológicas ou, sendo generoso,
por pura ignorância.
Como um
indivíduo deseja tecer uma crítica ao pensamento liberal se já o rotula
linguisticamente de fascista? A ausência
de lastro linguístico, histórico e teórico é gritante, visto que não há na
teoria liberal nenhuma citação que endosse uma tese fascista, a história de
aplicação do liberalismo não tem absolutamente nada de fascista e o uso de um
termo que denomina uma ideologia coletivista, autoritária e estatista para
denominar outro que significa justamente o contrário é mais que delirante.
O mesmo ocorre
com o termo “reacionário”. De acordo com João Pereira Coutinho, o reacionário é
o “revolucionário do avesso”, ou seja, um sujeito que rejeita o presente e crê
que a salvação está em um passado utópico e romantizado que só existe na sua
cabeça.
O liberalismo e
o conservadorismo da linha britânica defendem que a sociedade seja pautada por
aquilo que se mostrou mais benéfico para o mundo através da experiência. Nesse
caso, podemos afirmar seguramente que o livre mercado, a propriedade privada,
as liberdades individuais e a moral judaico-cristã, tópicos estes defendidos
com veemência tanto pelo liberalismo, quanto pelo conservadorismo, foram os que
passaram no teste da experiência e se mostraram os mais benéficos para o
desenvolvimento e para o bem-estar dos indivíduos.
Portanto, o uso
do termo reacionário para denominar liberais e conservadores também é desonesto
e sem sentido. O que ambos os pensamentos são é prudentes, algo bem diferente
de imaginar um passado utópico e tê-lo como modelo. O comunismo e as demais
ideologias revolucionárias têm um infantilismo tosco de pensar que só porque
algo é novo é bom, só porque algo é “revolucionário” é melhor. A novíssima
Revolução Russa matou em seus primeiros meses mais do que a Igreja Católica
durante toda a inquisição. O comunismo em cem anos matou mais de cem milhões de
pessoas que eram seus próprios governados e em tempos de paz. Apenas uma
veemente defesa dos velhos valores liberais fez com que o campo comunista
desaparecesse da Europa e que milhares de cidadãos europeus conhecessem a
liberdade.
É lamentável
que no ambiente acadêmico do Brasil tais críticas infundamentadas e que
refletem uma ideologia atrasada e assassina sejam proeminentes e tenham
destaque. Isto é a prova de que a desonestidade intelectual sem limites da
esquerda tem respaldo e é aplaudida por aqueles que se dizem intelectuais, mas
em cujas teses e críticas não se encontra nenhum dos três lastros fundamentais
necessários para que elas sejam honestas e verossímeis. São intelectuais
orgânicos no sentido mais Gramscista e rasteiro do termo.
Defender as
ideias que representam a liberdade, a democracia e o progresso não é fascismo e
não é reacionarismo. É apenas estar do lado certo da historia; do lado onde os
indivíduos são um fim em si mesmos e não membros de uma massa coletiva; onde as
pessoas são livres para empreender e realizar seus sonhos e têm, como bem diz a
declaração de independência Americana, certos direitos inalienáveis, como a
liberdade, a vida e a busca pela felicidade.
Rafael Hollanda é estudante de direito
do Ibmec-RJ, membro fundador do Movimento Universidade Livre e fundador da ONG
Ideal Livre.
Fonte: LIBERTATUM
sexta-feira, 29 de maio de 2015
Frase libertária: Ludwig von Mises (20)
“Serão
necessários muitos anos de autoeducação até que o súdito possa transformar-se
em cidadão. Um homem livre deve ser capaz de suportar que seu concidadão aja e
viva de modo diferente de sua própria concepção de vida. Precisa livrar-se do
hábito de chamar a polícia, quando algo não lhe agrada.” Ludwig von Mises
(Liberalismo Segundo a Tradição Clássica)
Os subversivos também amam! - You've Lost That Lovin' Feelin
Johnny Rivers - tradução
The Righteous Brothers - Bill Medley e Bobby Hatfield
(Primeira gravação 1964 – Autores: Phil Spector , Barry Mann e Cynthia Weil)
Muitos preferem ouvi-la com Elvis Presley
Esta canção está classificada na trigésima quarta
posição na lista das 500 melhores músicas de todos os tempos pela revista
Rolling Stone, aqui
quinta-feira, 28 de maio de 2015
quarta-feira, 27 de maio de 2015
Frase libertária: Ludwig von Mises (19)
“Mas, quando a
memória ainda fresca dos crimes dos bolcheviques estiver empalidecida, o
programa dos socialistas, de novo, exercerá poder de atração sobre as massas,
porque os fascistas nada fazem para combatê-los, a não ser suprimir as ideias
socialistas e perseguir quem as divulgue. Se, de fato, quisessem combater o
socialismo, deveriam opor-lhe suas ideias. No entanto, há apenas uma ideia que
pode, efetivamente, opor-se ao socialismo, isto é, o liberalismo.” Ludwig vonMises (Liberalismo Segundo a Tradição Clássica)
Direito da posse de arma reduz criminalidade, afirma Harvard
Por Diversos autores
Os recentes acontecimentos em Ottawa, Canadá,
comprovam, pela enésima vez, que controle de armas serve apenas para deixar uma
população pacífica ainda mais vulnerável.O desarmamento não apenas deixa uma
população menos livre, como também a deixa menos segura. E não existe
liberdade individual se o indivíduo está proibido de se proteger contra
eventuais ataques físicos. Liberdade e autodefesa são conceitos
totalmente indivisíveis. Sem o segundo não há o primeiro.
Respeitar o direito de cada indivíduo
poder ter armas de fogo ainda é a melhor política de segurança, como os fatos
listados abaixo mostrarão. Já restringir, ou até mesmo proibir, o direito
de um indivíduo ter uma arma de fogo o deixa sem nenhuma defesa efetiva contra
criminosos violentos ou contra um governo tirânico.
A Universidade de Harvard, que não
tem nada de conservadora, divulgou recentemente um estudo que comprova
que, quanto mais armas os indivíduos de uma nação têm, menor é a
criminalidade. Em outras palavras, há uma robusta correlação positiva
entre mais armas e menos crimes. Isso é exatamente o oposto do que a
mídia quer nos fazer acreditar.
Mas o fato é que tal correlação faz
sentido, e o motivo é bem intuitivo: nenhum criminoso gostaria de levar um
tiro.
Se o governo de um país aprova um
estatuto do desarmamento, o que ele realmente está fazendo é diminuindo o medo
de criminosos levarem um tiro de cidadãos honestos e trabalhadores, e
aumentando a confiança desses criminosos em saber que suas eventuais vítimas —
que obedecem a lei — estão desarmadas.
A seguir, 20 fatos pouco conhecidos
que comprovam que, ao redor do mundo, mais armas deixam uma população mais
segura.
01) Um estudo publicado pela
Universidade de Harvard — Harvard Journal of Law & Public Policy —
relata que países que têm mais armas tendem a ter menos crimes
02) Ao longo dos últimos 20 anos, as
vendas de armas dispararam nos EUA, mas os homicídios relacionados a armas de
fogo caíram 39 por cento durante esse mesmo
período. Mais ainda: “outros crimes relacionados a armas de fogo” despencaram 69%.
03) Ainda segundo o estudo da Harvard,
os nove países europeus que apresentam a menor taxa de posse de armas
apresentam taxas de homicídios que, em conjunto, são três vezes maiores do que as dos outro nove
países europeus que apresentam a maior taxa de posse de armas.
04) Quase todas as chacinas cometidas
por indivíduos desajustados nos Estados Unidos desde 1950 ocorreram em estados
que possuem rígidas leis de controle de armas.
Com uma única exceção, todos os assassinatos
em massa cometidos nos EUA desde 1950 ocorreram em locais em que os cidadãos
são proibidos de portarem armas. Já a Europa, não obstante sua rígida
política de controle de armas, apresentou três dos seis piores episódios de
chacinas em escolas.
05) Os EUA são o país número 1 do mundo
em termos de posse de armas per capita, mas estão apenas na 28ª posição mundial em termos
de homicídios cometidos por armas de fogo para cada 100.000 pessoas.
06) A taxa de crimes violentos nos EUA
era de 757,7 por 100.000 pessoas em 1992. Já em
2011, ela despencou para 386,3 por 100.000 pessoas. Durante esse
mesmo período, a taxa de homicídios caiu de 9,3 por 100.000 para 4,7 por 100.000. E, também durante esse
período, como já dito acima, as vendas de armas dispararam.
07) A cada ano, aproximadamente 200.000 mulheres nos EUA
utilizam armas de fogo para se proteger de crimes sexuais.
08) Em termos gerais, as armas de fogo
são utilizadas com uma frequência 80 vezes maior
para impedir crimes do que para tirar vidas.
09) O número de fatalidades
involuntárias causadas por armas de fogo caiu 58% entre 1991 e 2011.
10) Apesar da extremamente rígida lei
desarmamentista em vigor no Reino Unido, sua taxa de crimes violentos é
aproximadamente 4 vezes superior à dos EUA. Em 2009, houve 2.034 crimes violentos para cada 100.000
habitantes do Reino Unido. Naquele mesmo ano, houve apenas 466 crimes violentos para cada 100.000
habitantes nos EUA.
11) O Reino Unido apresenta
aproximadamente 125% mais vítimas de estupro por 100.000
pessoas a cada ano do que os EUA.
12) Anualmente, o Reino Unido tem 133% mais vítimas de assaltos e de outras agressõesfísicas por 100.000 habitantes do que os EUA.
13) O Reino Unido apresenta a quarta maior taxa de arrombamentos e invasões deresidências de toda a União Europeia.
14) O Reino Unido apresenta a segunda maior taxa de criminalidade
de toda a União Europeia.
15) Na Austrália, os homicídios
cometidos por armas de fogo aumentaram 19% e os assaltos a mão armada aumentaram 69% após o governo instituir o desarmamento da população.
16) A cidade de Chicago havia aprovado
uma das mais rígidas leis de controle de armas dos
EUA. O que houve com a criminalidade? A taxa de homicídios foi 17% maior em 2012 em relação a 2011, e Chicago
passou a ser considerada a “mais mortífera dentre as cidades globais“.
Inacreditavelmente, no ano de 2012, a quantidade de homicídios em Chicago foi
aproximadamente igual à quantidade de homicídios ocorrida em todo o Japão.
17) Após essa catástrofe, a cidade de
Chicago recuou e, no início de 2014, voltou a permitir que seus cidadãos
andassem armados. Eis as consequências: o número de roubos
caiu 20%; o número de arrombamentos caiu também 20%; o de furto de veículos
caiu 26%; e, já no primeiro semestre, a taxa de homicídios da cidade recuou
para o menor nível dos últimos 56 anos.
18) Após a cidade de Kennesaw, no estado
americano da Geórgia, ter aprovado uma lei que obrigava cada casa a ter uma arma, a taxa de criminalidade caiu mais de 50% ao longo dos 23 anos
seguintes. A taxa de arrombamentos e invasões de domicílios despencou incríveis 89%.
19) Os governos ao redor do mundo
chacinaram mais de 170 milhões de seus próprios cidadãos
durante o século XX (Stalin, Hitler, Mao Tsé-Tung, Pol Pot etc.). A
esmagadora maioria desses cidadãos havia sido desarmada por esses mesmos governos antes de serem
assassinados.
20) No Brasil, 10 anos após a aprovação
do estatuto do desarmamento — considerado um dos mais rígidos do mundo —, o comércio legal de armas de fogo caiu 90%.
Mas as mortes por armas de fogo aumentaram 346% ao longo dos últimos 30
anos. Com quase 60 mil homicídios por ano, o Brasil já
é, em números absolutos, o país em que mais se mata.
Quantas dessas notícias você já viu
na mídia convencional, que dá voz apenas a desarmamentistas?
Armas são objetos inanimados, tão
inanimados quanto facas, tesouras e pedras. Costumes, tradições, valores
morais e regras de etiqueta — e não leis e regulações estatais — são o que
fazem uma sociedade ser civilizada. Restrições sobre a posse de objetos
inanimados não irão gerar civilização.
Essas normas comportamentais — as
quais são transmitidas pelo exemplo familiar, por palavras e também por
ensinamentos religiosos — representam todo um conjunto de sabedoria refinado
por anos de experiência, por processos de tentativa e erro, e pela busca
daquilo que funciona. O benefício de se ter costumes, tradições e valores
morais regulando o comportamento — em vez de atribuir essa função ao governo —
é que as pessoas passam a se comportar eticamente mesmo quando não há ninguém
vigiando. Em outras palavras, é a moralidade a primeira linha de defesa
de uma sociedade contra comportamentos bárbaros.
No entanto, em vez de se concentrar
naquilo que funciona, os progressistas desarmamentistas querem substituir moral
e ética por palavras bonitas e por leis de fácil apelo.
Por último, vale um raciocínio
lógico: quem é a favor do desarmamento não é contra armas, pois as armas serão
necessárias para se desarmar os cidadãos. Logo, um desarmamentista nunca
será contra armas — afinal, ele quer que a polícia utilize armas para confiscar
as armas dos cidadãos.
Consequentemente, um desarmamentista
é necessariamente a favor de armas. Mas ele quer que apenas o governo
(que, obviamente, é composto por pessoas honestas, confiáveis, morais e
virtuosas) tenha armas.
Conclusão: nunca existiu e nem nunca
existirá um genuíno ‘desarmamento’. Existe apenas armamento centralizado
nas mãos de uma pequena elite política e dos burocratas fardados que protegem
os interesses dessa elite.
Participaram
desse artigo:
Walter
Williams, professor honorário
de economia da George Mason University e autor de sete
livros. Suas colunas semanais são publicadas em mais de 140 jornais
americanos.
Ron Paul, médico e ex-congressista republicano
do Texas. Foi candidato a presidente dos Estados Unidos em 1988 pelo Partido
Libertário e candidato à nomeação para as eleições presidenciais de 2008 e 2012
pelo partido republicano.
É autor de diversos livros sobre a
Escola Austríaca de economia e a filosofia política libertária como Misese a Escola Austríaca: uma visão pessoal, Definindo
a liberdade, OFim do Fed – por que acabar com o Banco Central (2009), The Case for
Gold (1982), The Revolution: A Manifesto (2008), Pillars of Prosperity (2008) e
A Foreign Policy of Freedom (2007).
O doutor Paul foi um dos fundadores
do Ludwig von Mises Institute, em 1982, e no ano de 2013 fundou o Ron PaulInstitute for Peace and Prosperity e o The Ron PaulChannel.
Stefan
Molyneux, ex-empresário do
ramo de software, hoje se dedica inteiramente à filosofia. Já escreveu sete
livros, todos disponíveis em seu website.
Michael
Snyder, colunista do blog
EconomicCollapse.
Fonte: Epoch times (Artigo publicado em 04-04-2015)
Foto: Duas garotas da Suíça passeando de bicicletas com as suas armas.
Foto: Duas garotas da Suíça passeando de bicicletas com as suas armas.
Pare de acreditar no governo - Bruno Garschagen (Resenha)
O Brasil tem um
grande paradoxo a ser explicado: nosso povo desconfia dos políticos, classe que
goza de baixíssima credibilidade, mas ao mesmo tempo ama o Estado, visto como
abstração. Todas as soluções propostas para as mazelas criadas pelo
intervencionismo estatal acabam envolvendo ainda mais Estado. É como se ele
fosse formado por anjos celestiais, nunca pelos próprios políticos de carne e
osso, tão rejeitados pela população.
A fim de tentar
explicar esse enigma, Bruno Garschagen lança pela Record o livro “Pare de
acreditar no governo”, cuja orelha tive a honra de escrever. O autor vai buscar
na formação de nossa nação as origens do problema, em uma abordagem que dá
grande peso ao aspecto cultural da coisa. Com um estilo próprio e repleto de
ironia fina, Garschagen analisa essa insistente adoração do Estado pelo povo
brasileiro em diferentes épocas, uma adoração inabalável, apesar de revoltas
crescentes com os políticos que controlam o aparato estatal.
“O livro começa com
D. Manuel I e termina com Dilma Rousseff, comprovando que nada é tão ruim que
não possa piorar”, fulmina o autor. E claro, lá está a marca registrada de
nossa mentalidade já na primeira carta enviada após nosso descobrimento: “O
pedido de Caminha, o verdadeiro motivo para a elaboração da carta na qual a
narrativa do descobrimento foi um mero pretexto, inaugurou a nossa excêntrica
característica cultural de pedir favores ao governo para conseguir cargos e
privilégios, especialmente em se tratando de parentes”.
Desde Caminha, a
proximidade com o poder sempre foi um atalho para o sucesso por aqui, independentemente
do mérito ou do valor
Desde então, a
proximidade com o poder sempre foi um atalho para o sucesso por aqui,
independentemente do mérito ou do valor. Nosso “capitalismo de Estado”, ou de
compadrio, tem seu DNA já na economia das mercês, um modelo no qual o Estado
“distribuía privilégios e concessões a partir de acordos pactuados entre o rei,
o poder local e os seus súditos”. O BNDES de Luciano Coutinho é apenas o
coroamento desta velha tradição, tirando dos pobres para dar aos ricos, tudo
isso num governo de esquerda.
Outro responsável
pelas raízes dessa mentalidade intervencionista foi Pombal. Nele temos o ápice
da arrogância iluminista que julgava ser possível construir uma sociedade
próspera de cima para baixo: “O pombalismo foi o casamento do iluminismo
francês com o mercantilismo e o patrimonialismo, que passaram a coabitar e a se
retroalimentar em benefício das elites políticas e empresariais ligadas ao
governo”.
O tom altamente
crítico à nossa República também é visível ao longo da obra: “A República
nasceu maculada. Fruto de um golpe de Estado, jamais conseguiu superar as
virtudes construídas pela Monarquia. Com a República, o que era ruim não era
novo, e o que era novo era péssimo”.
Outras influências
nefastas nessa mentalidade estatizante foram Comte e seu positivismo, e Vargas
e seu castilhismo. Essa visão curiosamente não dependia do viés ideológico e
unia figuras bastante diferentes em torno de um denominador comum: “É curioso
observar, em retrospecto, que dois grandes adversários ideológicos e políticos,
o ditador Vargas e o comunista Luís Carlos Prestes, compartilhavam uma
concepção política bastante similar. Ambos olhavam para as parcelas mais pobres
da população e para os trabalhadores de cima para baixo, de maneira mais ou
menos paternalista, e viam no Estado o grande instrumento de ação social
fundamentado numa base autoritária”.
JK com seu
arrogante Plano de Metas, o regime militar com seu dirigismo estatal na
economia, até mesmo FH, “acusado” de ser um neoliberal pela esquerda, todos
beberam da fonte centralizadora, com diferentes gradações. FH, justiça seja
feita, privatizou importantes estatais, quebrou o monopólio de setores
estratégicos, abriu o país para o capital financeiro, aprovou a Lei de
Responsabilidade Fiscal e modernizou as agências reguladoras. Mas mesmo assim
lá estava o mesmo DNA que deposita no Estado o papel de locomotiva, se não da
economia, ao menos da “justiça social”.
O que veio em
seguida, desnecessário dizer, foi o auge desse câncer que nos assola há
séculos: “Lula e o PT conseguiram algo que parecia impossível: desmoralizaram
não apenas a corrupção, mas a política brasileira, incorporando e exercitando
vários elementos de caráter centralizador, do patrimonialismo ao positivismo
castilhista, do coronelismo ao varguismo, do autoritarismo militar ao
fisiologismo das oligarquias regionais. O lulopetismo é, no fundo, a
experiência bem-sucedida (no mau sentido) da tradição autoritária e
patrimonialista da política brasileira”.
Postado por:
Rodrigo Constantino
Fonte: O Globo,
26/5/2015
terça-feira, 26 de maio de 2015
Frase libertária: Ludwig von Mises (18)
“A história
fornece inúmeros e bons exemplos de que, a longo prazo, mesmo a mais impiedosa
política de repressão não é capaz de manter um governo no poder.” Ludwig vonMises (Liberalismo Segundo a Tradição Clássica)
As guerras norte-americanas: Por trás do pacifismo dos democratas (socialistas ou progressistas) há um verdadeiro banho de sangue.
Por Anon,
Os socialistas adoram impingir
com suas falácias que foram os governos republicanos os causadores das maiores
guerras nas quais os Estados Unidos estiveram envolvidos. Bem, eu não estou,
aqui, defendendo as guerras e nem os motivos que desencadearam esses conflitos,
e nem quem apertou primeiro o gatilho. Roll The Bones! Apenas colhi alguns
dados históricos e estou jogando todos eles, um a um, no ventilador da história! Anon,
SSXXI
Guerra de Secessão (Guerra
Civil Americana) (1861-1865)
Abraham Lincoln (1861 – 1865) Partido União Nacional.
Primeira guerra mundial (1914 a 1918)
Thomas
Woodrow Wilson (1913 – 1921) Partido Democrata
Segunda guerra mundial (1939
a 1945)
Franklin D. Roosevelt (1933 – 1945) Partido
Democrata
Harry S. Truman* (1945 – 1953) Partido
Democrata
Guerra do Vietnã (1959-1975)
John Fitzgerald Kennedy (1961...) Partido
Democrata
Lindon B. Johnson (1963 – 1969) Partido
Democrata
Richard Nixon (1969 – 1974) Partido
Republicano
Segunda Guerra do Afeganistão
(2001–2014)
George W. Bush (2001- 2009) Partido Republicano
Obama ( 2009 - até hoje) Partido
Democrata
Guerra do Iraque (2003 – 2011)
George W. Bush (2001- 2009) Partido Republicano
Obama ( 2009...) Partido Democrata
*Foi um governo democrata que utilizou,
pela primeira e segunda vez, duas bombas atômicas sobre as duas cidades
japonesas de Hiroshima e Nagasaki. Por isso não se esqueça de que por trás do
pacifismo dos democratas (socialistas ou progressistas) sempre houve um
verdadeiro banho de sangue.
A Nomenklatura - como vivem as classes privilegiadas na União Soviética - Michael S. Voslensky
Qualquer semelhança do que está
escrito neste texto com o que está acontecendo no Brasil e na maioria dos países
da América Latina não é mera coincidência. Anon, SSXXI
Resumo
do livro A Nomenklatura de Michael S. Voslensky:
Qual o
interesse em saber como vivia a classe privilegiada na União Soviética se ela
implodiu e a velha Rússia emergiu em seu lugar com novas características? Creio
que a resposta é simples: o modelo soviético não se diferencia muito dos demais
regimes políticos baseados no estatismo, incluindo o Brasil. É claro que não pretendo
comparar o fascismo benevolente brasileiro com a brutalidade do regime
soviético, mas demonstrar como todo socialismo revolucionário, ao assumir o
poder pela violência, se organiza eliminando fisicamente a elite anterior e
criando sua própria elite com tantos ou mais privilégios que seus antecessores.
E países como China, Cuba e Coréia do Norte estão aí para mostrar como a classe
dirigente, chamada por Voslensky de Nomenclatura, se consolida e age no poder.
Falar das possibilidades de mudanças desses regimes implica em conhecer melhor
o alicerce de todos eles e, também, nos conhecermos melhor pelo parentesco com
a nova elite bolivariana na AL. O leitor talvez não saiba, mas estão em curso
diversas propostas de cubanização do Brasil, como a reforma do sistema
político, a implantação dos médicos pé no chão, etc. Ou seja, nesta fase em que
vivemos, o comunismo como modo de organização é explicitado por uma elite cujo
poder confunde-se com a administração, dissemina-se gradualmente e permite-se
identificar por suas pegadas nas questões que propõe.
A
princípio, pode-se creditar o trabalho de Voslensky como fundamental pela sua
abordagem aos numerosos casos documentados dos modos de agir, pensar e se
comportar da Nomenclatura, de que foi membro. Voslensky atuou nas rebarbas do
regime e terminou se ‘exilando’ na Alemanha a partir de um convite para
integrar o corpo docente de uma Universidade. Em 1974, amaldiçoado pelos
russos, Voslensky perdeu sua cidadania, reconquistando-a em 1991 sob Gorbachev.
Seu trabalho pode ser considerado essencial para se conhecer, por dentro, a
funcionalidade do sistema russo.
Por
desconhecer internamente um sistema, seus analistas são levados a trabalhar
sobre sua visibilidade externa e suas tragédias. Percebe-se isso muito bem no Brasil.
Nossa imprensa, que se diz livre, apenas replica o que dizem os burocratas –
não sabe o que acontece dentro do Estado. Voslensky trata de ambas as coisas
com naturalidade, sem afetação nem panfletismo, e, com eficácia, consegue
abordar todas as arestas da Nomenclatura e demonstrar como uma nova classe se
forma e se enraíza na sociedade. A princípio, nos apresenta a nova classe como
uma classe escondida, que se nega a si mesma na hipocrisia de representar outra
classe. Com dados reveladores, discorre sobre o embrião dessa nova classe e sua
consolidação como uma aristocracia travestida de vanguarda proletária. Depois,
analisando detalhes da nova ‘administração’ – desde sua carreira até sua
hereditariedade, Voslensky está pronto para mostrar que essa classe serão os
novos exploradores do povo soviético, que, em nome de um novo sistema, irá
expropriá-lo de seus bens.
A
relação do novo sistema com a propriedade privada não é hereditária nem
escritural, mas de apropriação, concessão e uso, tornando-a um bem da
Nomenclatura, que não pode ser extorquida – a menos que o proprietário caia em
desgraça. Mas o aspecto mais singular é que o novo proprietário não sustenta a
propriedade ocupada, mas utiliza o Estado como fornecedor de mão de obra e de
recursos para sua manutenção e provimento.
Trata-se,
portanto, de um sistema mais próximo ao feudalismo do que ao capitalismo, como
já notamos em governos demagogos latino-americanos.
Voslensky
estruturou sua análise nos seguintes tópicos:
I – A
classe escondida
II – O
nascimento da nova classe dominante
III –
A classe dirigente da sociedade
IV – A
classe dos exploradores da sociedade
V - A
classe dos privilegiados
VI - A
ditadura da nomenclatura
VII –
A classe que aspira a hegemonia mundial
VIII –
Uma classe parasitária
Com
farta documentação de apoio às suas teses, Voslensky discorre em 443 páginas
todos os processos que tornaram o regime comunista soviético um dos mais
abomináveis da face da terra, sem jamais perder a fleuma do diplomata que foi e
do professor universitário que encerrou sua carreira na Alemanha, onde morreu
em 1997, aos 77 anos de idade, provavelmente lúcido o bastante para perceber
que seu trabalho não tinha sido em vão. O mundo que descrevera no final dos
anos 70, prevendo o fim do comunismo pelo empobrecimento progressivo da
sociedade, realmente terminou ocorrendo. Os avatares caricaturescos da velha
URSS, ainda existentes, são menos importantes do que a possibilidade de se
reviver os mesmos padrões de dominação social com um novo estatismo se formando
no quintal bolivariano da AL. No Brasil, são esses modelos que se tentam
introduzir no processo eleitoral e na organização social com nomes dissimulados
de ‘controles, democratização, etc’.
A
CLASSE ESCONDIDA
Citando
numerosas fontes, desde os primórdios da revolução de 1917 até os anos de 1970,
Voslensky nos fala que os escritores da época, especialmente os russos
emigrados dos anos 20, diziam que a nova classe dirigente russa era a classe
burocrática que detinha o real poder de mando. Entre eles, o livro de Milovan
Djilas mostrou-se fundamental para o entendimento dos mecanismos do poder de
uma ‘nova classe’ que se desenhava nos países socialistas. “Os dirigentes
constituem um grupo humano numeroso, que se distingue dos outros grupos da
sociedade soviética por seu lugar (preponderante) no sistema de produção
social; por sua relação com os meios de produção (o direito de dispor deles);
por seu papel (diretor) na organização social do trabalho e pela parte (importante)
da riqueza social de que se apropria” (p. 35). Esta é uma citação das ideias de
Lênin com as observações do autor entre parênteses. Esse grupo dirigente
constituía uma classe, uma classe que se escondia com o nome de outra — o
proletariado. Mas o próprio proletariado, por ser mais abrangente e disseminado
na sociedade, não tinha relação com a classe no poder. Poderia se argumentar
que a classe no poder seria a ‘representante’ do proletariado, seu partido
político. Voslensky demonstra que a falsidade da doutrina consiste exatamente
nisso, e, usando a terminologia marxista, compara as ideias de Marx e Engels
com as de Lênin para demonstrar que sendo o proletariado quase inexistente na
União Soviética, não poderia jamais representar a sociedade, cuja maioria era
camponesa. Portanto, a revolução não poderia ser a superação de um capitalismo
que era secundário e incipiente. Em outras palavras, a ‘hegemonia do
proletariado’ alcunhada por Lênin não passava de uma confusão indescritível (p.
55).
Com
isso, Voslensky demonstra que o poder revolucionário nada tendo de evolutivo,
no sentido de respeitar as liberdades e a democracia, porém tratou de
consolidar uma burocracia tentacular de dominação da sociedade, para viver às
suas expensas e ampliar seu poder através da violência progressiva. Com o nome
de ditadura do proletariado, o novo regime confiscava todos os recursos da
sociedade para si, representando a si próprio com o nome de outra classe. Ao se
inscreverem no partido, os candidatos se declaravam de origem operária, fato
que Voslensky ironiza dizendo que bastava olhar suas mãos para perceber que se
tratava de um engodo. Portanto, o que seria o novo governo? A resposta é
simples: uma ‘ditadura sobre o proletariado’, se evidentemente a classe fosse
preponderante. Não o sendo, era uma ‘ditadura sobre o povo’. A argumentação de
Voslensky baseia-se nos fatos históricos da constituição de Stalin de 1936,
quando a terminologia ‘ditadura do proletariado’ foi substituída por ‘governo
do povo’. Como pode uma ditadura acabar sem comemoração e sem data definida?
Analisando as incoerências, o autor consegue desmistificar todos os fatos
utilizando a própria linguagem e documentação do PCUS (Partido Comunista da
União Soviética).
Esse é
o lado surpreendente de ‘A Nomenklatura’. O próprio marxismo desmente os fatos
ocorridos na URSS. Mas não se pode dizer que isso tenha sido uma deformação do
marxismo. Aqui, teríamos que entrar com extensa argumentação para provar que o
desenvolvimento do capitalismo não geraria uma classe operária revolucionária,
mas seria seu próprio fim, como conhecemos nos dias atuais. Portanto, o
historicismo de Marx estava errado: a sequência pós-capitalista é a sociedade
tecnológica que conhecemos no Primeiro Mundo, e que está em franca expansão na
Ásia — o chamado capitalismo avançado, ou sociedade do conhecimento.
Assim,
na URSS, os revolucionários profissionais criaram a nomenclatura para preencher
a enorme quantidade de cargos do governo russo, usando o critério de
fidelidade, e não o de competência, como no Brasil. Embora o regime também
escolhesse pessoas competentes para cargos técnicos elevados, o padrão
administrativo se baseava no nosso conhecidíssimo nepotismo. “Durante os
numerosos anos em que vivi na URSS, raramente encontrei pessoas verdadeiramente
talhadas para o posto que ocupavam. E era precisamente com as pessoas
competentes que se causavam mais dificuldades: como não correspondiam ao
critério habitual de seleção de quadros, pareciam ocupar os postos que jamais
deveriam ocupar...” (p. 71-72). Era o que ele chamava de perfil político na
preferência da seleção, uma prática que conhecemos de cátedra no Brasil,
comprovando que mais além da ideologia existe uma plataforma comum: o
estatismo.
Voslensky
mostra como Stalin desenvolveu sua liderança nesse tipo de seleção. Ao
contrário de seus pares revolucionários, que se ocupavam com as diretrizes
gerais da revolução e das transformações necessárias, Stalin cultivava a
ordenação de fichas de pessoas em seus arquivos. Humoristas dos anos 20 chamavam
Stalin de camarada fichário (p. 72). Mas foi com essa diligência sobre pessoas
e cargos que ele criou uma enorme estrutura de apoio pessoal, chamada
Uchraspred, que significava ‘recenseamento e distribuição de cargos’, uma vez
que qualquer promoção passava pelo seu crivo. Bastante complexas, tais
estruturas continham diversas comissões ligadas ao Comitê Central. Só em 1922,
foram distribuídos 10 mil postos na administração soviética (p. 73), para
cargos de secretários de comitês regionais e distritais, e membros
correspondentes.
Percebendo
a crescente ‘burocratização do partido’, Trotsky alertou seus camaradas
revolucionários. Mas, após a morte de Lênin, com o carreirismo já estabelecido,
240 mil novos membros foram admitidos no partido. Com isso, o efetivo do
partido que vinha inchando escandalosamente passou de 386 mil para 736 mil. A
metade era de novos membros estranhos à velha guarda bolchevista, que mais
tarde permitiriam a Stalin eliminar os antigos revolucionários e ser o
verdadeiro dono da revolução.
Nos
anos 30, os expurgos marcaram outra mudança radical renovando a elite
dirigente. Voslensky, então um adolescente, testemunhou essa fase sangrenta.
Era a nova aristocracia contra a velha aristocracia dos revolucionários. Foi o
período em que famílias inteiras caíram em desgraça, e os campos de trabalhos
forçados da Sibéria se viram povoados por milhares de pessoas chegando em trens
apinhados correndo pela estepe siberiana, depois de dias de viagem trancados
nos vagões.
Os
detalhes dos expurgos têm um toque especial. Todos os analistas dessa fase
negra da Rússia contam a mesma história com seus próprios detalhes sobre os
personagens que conheceram ou pesquisaram. Voslensky não foi diferente. Mostra
como foram moídos todos os grandes revolucionários do passado, e como na era
Kruvchev era praticamente impossível se obter qualquer documento a partir do
assassinato de Kirov (1934), o então poderoso secretario do PC de Leningrado,
exatamente porque durante os expurgos nascera a nova classe dirigente que 20
anos depois comandaria todo o país e que ocuparia o lugar dos condenados.
O
autor resume então assim: “o processo de nascimento da nova classe dominante
soviética realizou-se em três etapas. Na primeira etapa, foi criada a
organização dos revolucionários profissionais, embrião da nova classe. A
segunda começou pela tomada do poder por essa organização em novembro de 1917:
formou-se uma direção em dois níveis, o nível superior da velha guarda
leninista e o nível inferior da Nomenclatura stalinista. A terceira etapa foi a
liquidação da velha guarda leninista pela Nomenclatura” (p. 86).
O
desejo do poder pelo poder é uma lição para os nossos dias na realidade
brasileira. Quando o poeta Evtuchenko exprimiu este estado de espírito: “pouco
importa que o poder seja dos sovietes, o importante é o poder”, estava nos
dando uma lição sobre o que aconteceu com o lulismo pós 2003.
A
CLASSE DIRIGENTE DA SOCIEDADE SOVIÉTICA
Neste
capítulo, Voslensky faz um retrato literário de um nomenclaturista hipotético,
Ivanov, e de sua luta cotidiana para ascender na organização. Mostra os
subterfúgios, as lealdades, as trocas de favores, a criação das redes de
contatos e de subordinados, o servilismo a que estão sujeitos os membros para
desfrutarem dos privilégios do Estado. Mostra como um candidato a um cargo
superior é escrutinado pelo comitê correspondente, a quantidade de assinaturas,
e o vai-e-vem de certidões que conferem sua aceitação. Essa papelada recebia
assinatura dos grandes figurões da KGB. O autor mostra em detalhes o
funcionamento do apparatchick burocrático, e repete o caráter escondido,
furtivo dos dirigentes, sua necessidade de esconder-se para não revelar sua
natureza aristocrática ao resto da população. Mas um funcionário que se eleva
ao primeiro escalão e que vai gozar dos privilégios para toda a vida, não
significa que não possa ser degolado. Sua estabilidade depende de seguir as
regras, de não atrair a desconfiança nem a ira dos superiores. E traça a
crônica dos destinos de algumas personagens importantes da era pós-Stalin, que
ele mesmo conheceu, por seus afazeres desconformes com as expectativas do
Comitê Central.
Mostrando
que “a vanguarda da classe operária” (Lênin), “a mais alta forma de organização
da classe operária” (Stalin) eram um mito, pois a nova classe não tinha origem
operária coisa nenhuma, o autor prova que esse mito era semelhante ao da origem
ariana apregoada pelos nazistas, que na verdade era também fajuta. Mesmo quando
um nomenclaturista provava sua origem no campesinato ou no proletariado, ele
não tinha vínculo algum com essas classes, e a maioria deles desprezava sua
origem operária e camponesa.
Voslensky
cita o que o escritor Konstantin Paustovski escreveu sobre uma turnê de
turistas soviéticos pela Europa de trem: “Os operários, os engenheiros, os
artistas viajavam de segunda e terceira classes; a Nomenclatura viajava de
primeira. Não é preciso dizer-lhes que a Nomenclatura não tinha nenhum contato
com a segunda e terceira classes, pois, além do mais, não poderia tê-lo;
estavam prevenidos contra tudo, exceto contra os de sua própria situação. Eram
espantosos pela incultura. Tinham uma concepção toda particular daquele que
fizera a honra e a glória de nosso país. Diante de uma pintura do Juízo Final,
um nomenclaturista perguntou: ‘É o julgamento de Mussolini?’ e, olhando a
Acrópole, um outro indagou: ‘Como o proletariado pode permitir que se
construísse coisa semelhante?’ Um terceiro, que ouviu alguém admirar o azul do
Mediterrâneo, perguntou brutalmente: ‘será que nosso mar é menos belo?’ Essas
bestas ferozes, esses exploradores, esse cínicos obscurantistas, diziam
palavras ostensivamente anti-semitas que não seriam renegadas por verdadeiros
nazistas. Aprenderam a ver no povo apenas o adubo que fertiliza suas próprias
carreiras: intriga, calúnia, assassínio — eis suas armas... Os nomenclaturistas
se escondem atrás de slogans, discursos blasfematórios em que afirmam agir pelo
bem do povo” (p. 115-116). É o que ele chama de a classe dos desclassificados,
dos que galgam os mais altos níveis da sociedade sem nenhum mérito, nenhum
preparo, nenhuma condição intelectual.
Nos 3
escalões de comando, havia 3 milhões de privilegiados. Mas o partido comunista
tinha 17 milhões de indivíduos. O que mostra que nem todos do partido estavam
desfrutando dos privilégios. Voslensky apresenta os números dessa aritmética em
diversos períodos históricos, conforme sua coleta de dados. Depois, mostra como
funciona o nepotismo com nomes conhecidos do regime. Mas como se tratava de
viver sob a doutrina de uma sociedade sem classes, o autor nos oferece o quadro
real do que vem a ser essa sociedade.
A
CLASSE DOS EXPLORADORES DA SOCIEDADE SOVIÉTICA
Neste
capítulo, Voslensky analisa como funciona o sistema de propriedade no regime
socialista. Fazendo uma revisão do assunto na obra de Marx, ele demonstra que
mais uma vez os escritos de Marx foram modificados na URSS. O artigo 10 da
Constituição soviética dizia: “o sistema econômico da URSS se funda na
propriedade socialista dos meios de produção sob a forma da propriedade do
Estado (de todo o povo) e da propriedade colcoziana e cooperativa. Os bens dos
sindicatos e das outras organizações sociais, necessários à realização de suas
tarefas estatutárias, são também propriedade socialista”.
Depois
de examinar o conceito de propriedade privada, chega à questão da propriedade
estatal. Se o Estado é um aparelho da classe dominante, ele passa a ser a
propriedade da nomenclatura de fato, mas não de direito. No caso, o direito à
propriedade individual foi abolido, mas se a propriedade continua existindo,
ela então passa a ser ‘social’ no nome e ‘particular’ nos benefícios. Assim, os
chefes de fábricas são a classe dirigente que recebe salários executivos e
dispõe do resto do aparelho do Estado para si na condição de vitaliciedade na
nomenclatura. A propriedade é, portanto, condicionada à posição do membro na
estrutura.
Como a
doutrina marxista dizia “o estado é o aparelho de dominação da classe
dominante”, no regime socialista esta dominação pertence aos seus dirigentes,
sendo a nova classe que se esconde em nome de todo o povo, mas que utiliza esse
subterfúgio para impor uma exploração cruel ao resto da população. Isso pode
ser comprovado nas diferenças de salários, e no estilo de vida de governantes e
governados. O autor discute minuciosamente cada tipo de propriedade, seus
estatutos, e depois conclui que nada do que está escrito implica em
conformidade com a disposição estatutária. Por exemplo, um sindicato pode ter
uma propriedade, mas os membros filiados não podem vendê-la, repassar ou
extinguir. Somente a hierarquia dos dirigentes do partido tem esse poder.
“A
‘lei econômica fundamental do socialismo’ formulada por Stalin pode ser
considerada a afirmação mais fantasiosa da ‘economia política do socialismo
oficial’. Esta lei garante ‘a satisfação máxima das necessidades materiais e
culturais, sempre crescentes, de toda a população pelo crescimento e aperfeiçoamento
constantes da produção socialista baseada na técnica mais evoluída’ “ (p. 152).
Triunfado
o socialismo, a satisfação das necessidades da sociedade começa a cair. A
produção diminui, a escassez aumenta. Comparem, por exemplo, o carro-chefe da
produção cubana, a cana de açúcar, cuja produção em 1970 era de 8 milhões de
ton/ano mas em 2010 de apenas 2 milhões de ton/ano. Na União Soviética ocorreu
a mesma coisa. Portanto, a única certeza que se tem é que a satisfação das
necessidades da sociedade não é o fundamento da lei econômica do ‘socialismo
real’.
“No
processo de produção, que fim persegue a população ativa? Procura perpetuar o
poder da classe dominante? Não, sua finalidade é muito simples e compreensível:
produzir para o consumo, não para o da Nomenclatura, mas para o da população
trabalhadora. Os homens desejam uma oferta de produtos que não satisfaça
somente os privilegiados nas suas lojas especiais: querem um habitat em lugar
de casernas e datchas do Estado; automóveis para o comum dos mortais em lugar
dos carros de combate e das limusines governamentais; querem manteiga em lugar
de canhões. Querem que o processo de produção sirva à satisfação de suas
necessidades” (p. 154).
Então,
como explicar que um país autossuficiente em alimentos possa produzir somente
20% dos alimentos que consome depois de 50 anos de socialismo, como é o caso de
Cuba? A única explicação possível é que o socialismo é um sistema voltado para
a classe que assumiu o poder, em oposição ao resto da sociedade. Sua função é
explorar ao máximo a sociedade, confiscando para si todos os recursos
disponíveis em nome da governabilidade.
Mas a
propaganda oficial diz exatamente o contrário. Do ponto de vista da explicação
da economia capitalista, os teóricos do socialismo afirmam todos sem distinção
que a economia capitalista funciona da seguinte forma: um capitalista decide
produzir um bem. Todo o capital é investido na produção desse bem. Os demais
capitalistas, pressentindo o negócio, investem também na produção do mesmo bem.
Logo, o mercado se satura, os depósitos se enchem de mercadorias que ninguém
compra, a produção entra em crise, os bancos quebram, e os empregados vão para
a rua. No socialismo real, isso não acontece porque a economia é planificada.
Nada é desperdiçado na superprodução, porque esta não foi planejada para o
lucro. Este argumento domina a maior parte dos debates entre a juventude
socialista, que vê com horror a abundância por tratar-se de um consumismo que
esgota os recursos naturais do planeta. O resultado é a crença em uma ideologia
que vai deixar os recursos naturais onde se encontram e produzir a privação, a
escassez e o tormento da população desassistida de todos os benefícios da
tecnologia e do progresso material do homem.
De
fato, assistimos hoje em dia a uma retomada dos princípios fundamentais da
economia socialista através da ecologia. Não haveria um renascimento tão forte
do socialismo planificado se não se vendesse com sucesso a ideia do esgotamento
dos recursos naturais do planeta. Quando eu era jovem, na primeira crise do
petróleo de 1973, dizia-se que o petróleo iria acabar no máximo em 30 anos. A
cada crise, o argumento retorna com uma força avassaladora. E, no entanto, as
reservas conhecidas aumentam cada vez mais, e apesar do planeta já estar consumindo
pouco menos de 100 milhões de barris diários, os primeiros protótipos de carros
híbridos começaram a aparecer com capacidade de percorrer 100 quilômetros com
um litro de gasolina, muito antes de o petróleo acabar.
Ora, a
força do capitalismo está em sua anarquia, no fato de sua economia não dispor
de uma autoridade diretora. A economia capitalista funciona como uma centopeia
que move suas patas em harmonia sem que o cérebro tenha que comandar uma a uma.
Mas, se uma delas ‘emperra’, o cérebro logo toma conhecimento e age
correspondentemente. Portanto, não existe uma planificação, ou seja, uma
análise refletida sobre cada um dos mecanismos de ação dos mercados, e se tal
ocorresse, ele entraria em colapso, pois qualquer órgão planejador é menos
eficaz do que a interconexão dos elos de cada um dos produtores em ação. E
quando o mercado enfrenta problemas, ele é mais ágil e eficaz para se
redesenhar do que qualquer burocracia, por melhor que seja, tanto mais se
escolhida por critérios políticos.
Quando
Lênin discorreu sobre o Imperialismo em sua obra clássica, ele afirmava que o
colapso do capitalismo viria da monopolização da economia, que criando
oligopólios cada vez maiores, “engendra inelutavelmente uma tendência à
estagnação e à putrefação. Na medida em que se estabelecem preços de monopólio,
isto faz desaparecer os estimulantes do progresso técnico, e, em seguida,
qualquer outro progresso; e torna-se, então, possível, no plano econômico,
frear artificialmente o progresso técnico” (p. 159). Voslensky cita Lênin para
concluir que é exatamente o que ocorre no socialismo. Basta, portanto, ler a
obra de Lênin e colocar a palavra socialismo no lugar de capitalismo que as
peças se encaixam. Pois o socialismo é a realização final dos monopólios
estatais e da estagnação e putrefação da economia.
A
tônica de analisar os clássicos do marxismo e depois mostrar que a crítica ao
capitalismo feita por marxistas é, em última análise, uma crítica ao próprio
socialismo real, confere a originalidade da obra de Voslensky. Mas isso não nos
deveria surpreender. A essência da mentalidade marxista consiste em atribuir os
maiores defeitos aos outros e depois praticá-los insensivelmente, não por
sadismo, nem por arrogância, mas por negarem a lei mais básica da natureza
humana: o direito à propriedade individual e de todas as formas de
empreendimento e sobrevivência sem a tutela do Estado. A mentalidade marxista
difere da mentalidade liberal comum por entender que os fatores da produção
possam ser intelectualizados e controlados por um órgão neutro e eficaz. Para
que isso ocorra, é preciso que a mente esteja carregada de altruísmo e de
vontade de ação para o bem comum. Aceita a premissa, a razão humana tropeça na
natureza e o resultado é o artificialismo da sociedade na disjunção de todas as
suas partes. O planejamento dos bens de consumo torna-se a prisão do homem na
escassez.
E o
que fazer quando o fracasso é inelutável na produção? A nomenclatura recorre
então a diversas técnicas de dissimulação que o autor chama de pripiski, a palavra
russa para embuste. “Inclui-se, conscientemente, nas contas das cifras inexatas
o correspondente aos produtos que não foram fabricados. Esta técnica se baseia
na acepção clara e límpida do caráter inteiramente teórico e burocrático da
planificação e da contabilidade: os gabinetes do Gosplan e dos ministérios
prevêem disposições teóricas sem conhecer a realidade; o resultado, da mesma
maneira, não tem nenhuma relação com a produção real” (p. 166).
Mas a
crônica dos embustes vai longe. O autor comenta anúncios solenes de
primeiros-secretários falando sobre o aumento de 280% na produção de carne, ou
a maior colheita vindoura de algodão, que depois se revelaram “pripiski”. A
farsa de Alexey Stakhanov (que teria extraído 102 toneladas de carvão sozinho
em 5:45 hs em 1935, 14 vezes sua cota) com sua vertiginosa produtividade era
“pripiski”. Na Geórgia de Stalin, que desfrutava de privilégios inalcançáveis
para as demais repúblicas, onde os cidadãos se vestiam muito melhor do que no
resto do país, e gastavam muito acima das possibilidades de um trabalhador
soviético, havia “uma corrupção tão grande que tudo podia ser comprado ali: um
diploma ou um lugar na universidade, até mesmo um certificado do título de
‘herói da União Soviética’. Isto continuou após a morte de Stalin, cujo culto
foi oficialmente mantido na Geórgia. Tanto os georgianos consideravam sua
república como uma região à parte, que os recém-chegados, que se espantavam com
os costumes incomuns da província recebiam de volta a pergunta: ‘A Geórgia não lhe
agrada? Então, volte para a União Soviética’ “ (p. 167).
Naturalmente,
os relatórios sobre a produção que satisfaziam e até mesmo ultrapassavam os
planos quinquenais eram todos falsos. Um pesquisador ucraniano chamado
Naum Jasny analisou dados estatísticos publicados na URSS e revelou numerosas
falsificações. Quando se anunciava um aumento de salário no ano, Naum descobria
que na verdade havia uma redução. Isto em 1948. O próprio Kruvchev denunciou a
falsificação de dados da era Stalin, mas não adiantou: era uma atividade
inerente à Nomenclatura e continuou em seu tempo.
Para
Voslensky, a necessidade de manter o poder implica em uma sociedade na qual a
precedência seja dada à indústria pesada, e não à de bens de consumo. De fato,
a indústria bélica soviética sempre esteve sob intenso incentivo do governo russo.
Era a fonte de seu poder e de sua permanência. Mesmo assim, a falsificação de
dados e relatórios, a queixa de engenheiros testemunhada pelo autor atesta que
também ali a situação era aflitiva. Isso não impedia que a indústria pesada
desfrutasse de uma enorme propaganda, especialmente notável na construção de
foguetes durante a corrida espacial. O livro ‘Escolhi a Liberdade’ de
Kravchenko, um engenheiro chefe de fábrica e dissidente, atesta este argumento.
Porém,
o fator mais humilhante de todo o sistema diz respeito aos salários dos
trabalhadores. A nova sociedade, onde todos estariam livres da exploração
capitalista, terminou se revelando uma tirania da nomenclatura. Em 1980
atingiu, sem os descontos de impostos, 167 rublos por mês. Uma quantia capaz de
manter apenas um homem por mês, e ainda assim dificilmente. Mas esse era o
salário médio dos trabalhadores. Na prática, o salário verdadeiro do
trabalhador mais simples, como pedreiro, faxineira, etc, era apenas de 100
rublos/mês. Mas a propaganda dizia que primeiro era preciso produzir mais para
depois distribuir o bolo. E como poderiam fazer para produzir mais se o próprio
sistema não permitia a produção de excedentes?
Comparando
com os salários de outros trabalhadores, os 170 rublos/mês era 1/3 do salário
médio de um operário francês. Esta era a situação em 1980, 60 anos depois da
implantação do socialismo na Rússia. Ora, na Rússia mulheres também trabalham e
até as crianças eventualmente. Isso era comemorado como emancipação feminina,
mas o autor descobriu que no seu tempo, Marx chamava isso de exploração
suplementar.
O
trabalho infantil merece um comentário. Os marxistas sempre condenaram o
trabalho infantil nos regimes capitalistas. Mas na Rússia, desde os anos 20,
foram abertas escolas de aprendizes. “Numerosas crianças, órfãos ou
desabrigados (pela prisão e envio dos pais aos campos de concentração), foram
assim utilizadas como força de trabalho barata, sob o pretexto de que recebiam,
destarte, uma educação de acordo como os princípios do pedagogo e tchekista
Anton Makarenko. Sob Stalin, criaram-se escolas de trabalho manual, onde
reinava uma disciplina militar, e as crianças tinham de usar um uniforme negro.
Ali, eram matriculadas à força crianças em atraso na escolaridade, ou
indisciplinadas” (p. 184-185).
Quanto
ao nível de vida comparativo, Voslensky afirma que a Nomenclatura simplesmente
desistiu de comparar o nível de vida médio da população das duas Alemanhas, das
duas Coréias, etc. Porém, um conjunto de medidas foram tomadas para compensar a
baixa produtividade de uma população assalariada explorada como baixar os
custos de alguns itens: alugueis, pães e massas, e transportes urbanos. Mas os
ocidentais que viajavam a Moscou sempre reclamaram dos custos elevados de
mercadorias quando comparados com o Ocidente, especialmente os bens de consumo
duráveis utilizados pela nomenclatura. Mas por que seriam altos os custos dos
alugueis se na União Soviética era autorizada apenas uma área de 9 m2 por
pessoa? Um casal com um filho tinha direito a um apartamento de 27 m2, embora
tivesse direito a requisitar área maior. Mas seria atendido em uma sociedade do
tipo QI (quem indica)?
“É
certo que na URSS o pão, as massas e batatas, o leite, os legumes, o milho, e
outros produtos básicos são baratos. Por outro lado, a carne, o peixe, as aves,
as frutas, o chocolate, o café, os condimentos são caros e raros. Como não se
pode comer pão, tendo por sobremesa massas e batatas, 80% do orçamento de uma
família soviética média são para a alimentação.
É
certo que a medicina é gratuita. As policlínicas e os hospitais postos à
disposição da população nunca estão vazios: é preciso ficar na fila durante
horas para ser atendido por um médico. Os médicos das policlínicas devem
observar uma norma: 15 minutos por paciente, e a metade do tempo é dedicada a
encher e assinar a carteira de saúde. Também se tornou habitual granjear a
atenção do médico e da enfermeira com presentes e mesmo pagar-lhes; a
gratuidade do atendimento não é de fato, assegurada. Não seria melhor retirar dos
salários a contribuição necessária para o seguro-doença, o que permitiria a
cada um escolher seu médico?” (p. 188).
Eis aí
como o regime da Nomenclatura se assemelha lá e cá. Eis como todos os regimes
estatais têm os mesmos traços. Mas, por outro lado, quem pertence à classe
nomenclaturista tem uma situação totalmente diferente.
A
CLASSE DOS PRIVILEGIADOS
Quando
se analisam os salários e o padrão de vida da nomenclatura notamos uma
diferença abismal em estilo de vida e comportamento, se comparados com o resto
da população. E essa diferença é que serve de parâmetro para a afirmação de que
os regimes comunistas são baseados em uma classe dirigente do aparelho estatal,
que se confunde com o partido, embora o partido comunista seja sempre maior do
que o Estado, e que vive às expensas da sociedade, isto é, contra ela e de seu
saque permanente. Tratava-se de um novo modelo de elite com as mesmas
características em todos os países comunistas.
Lênin
deixou claro em seu testamento que os quadros dirigentes não deveriam ter uma
remuneração superior à dos operários qualificados. Somente os “técnicos
burgueses” poderiam receber salários mais elevados “devido à sua natureza venal
e durante o tempo em que fossem úteis” (p. 212). Naturalmente que essas
recomendações não foram seguidas. Segundo os estudos do autor, um chefe de
setor na burocracia soviética recebia 450 rublos/mês, com direito a 30 dias de
férias em local gratuito. O assalariado só tinha direito a 2 semanas por ano.
Além disso, o chefe de setor (posição ocupada por Voslensky na burocracia)
recebia o 13º salário, a um vale-alimentação para usar na cantina do Kremlin,
que era um local onde a elite desaparecia atrás de uma porta envidraçada de
aparência comum com uma placa ‘escritório de permissões’, na rua Granovskogo.
Ao sair, carregavam embrulhos de papel pardo direto para os carros com os
motoristas particulares esperando. Esse local fornecia até mesmo viandas para
os nomenclaturistas.
Desnecessário
dizer que eram rações tão fartas que serviam para alimentar toda a família.
Calculando o valor da bolsa-alimentação e acrescentando ao salário, o autor
chegou a 750 rublos por mês, isto é, 5 vezes o salário de um operário (p. 214).
Na
burocracia existem adicionais que não são encontrados no trabalho de fábrica. 10%
de aumento pelo conhecimento de uma língua estrangeira, por duas línguas: 20%,
mesmo que jamais se faça uso delas em serviço. Uma situação semelhante existe
no Judiciário brasileiro, uma das nossas nomenclaturas mais privilegiadas do
país.
Na
nomenclatura, a maior mordomia era que um chefe de setor encontrava todos os
produtos de que necessitava em lojas especiais, ao passo que o cidadão comum
tinha que procurá-los incansavelmente no comércio oficial, quase sempre
desabastecido. Curioso era o imposto de renda, que para qualquer cidadão com
rendimentos acima de 200 rublos era de 13%, ou seja, um país socialista que não
praticava o imposto de renda progressivo. Como se trata de uma ideologia
invertida, esses 13% eram aplicados com o argumento do, pasmem, ‘igualitarismo’.
Stalin inventou uma fonte de renda especial para seus apaniguados, chamada ‘o
pacote’, que era um envelope com um maço de notas, não muito, mas uma espécie
de bolsa-pai dos povos, sem descontos e sem contabilidade. Os subordinados
adoravam receber o envelope secretíssimo, pois assim podiam avaliar em que
estado se encontravam com o comandante.
Interessante
destacar como a sociedade cria a desigualdade social através de subterfúgios
com o nome “social”. Por exemplo, na Rússia, existiam “fundos de consumo
social” que encobriam “certa quantidade de serviços gratuitos, com a inscrição
em uma estação de tratamento ou casa de férias, alojamentos colocados à
disposição, inscrição numa creche, num jardim de infância ou num campo de
pioneiros, utilização de cantinas, hospitais, ou de clínicas” (p. 216). Esses
benefícios eram tratados na burocracia como se pertencessem a todo o povo
soviético, mas na verdade eram destinados somente aos membros da nomenclatura.
Com tal facilidade, o aparelho do partido falava em termos de “parte invisível
do salário”, como se fosse estendida a toda a sociedade.
Outra
forma de ganhos adicionais era através dos poucos que tinham autorização para
viajar ao estrangeiro, voltar com as malas carregadas de presentes para os
parentes, mas que na verdade eram destinados à venda em um mercado interno
altamente carente de produtos tecnológicos. Nada demais para os brasileiros da
alta nomenclatura que possuem passaporte diferenciado e alfândega livre nos
aeroportos. Tal situação levou a Rússia a ser talvez a primeira nação do mundo
a criar os ‘free-shops’, naturalmente que com outra denominação. Eram lojas
dentro de Moscou que não aceitavam o rublo como moeda de troca. Ou o cliente
pagava com moeda estrangeira, acessível somente aos burocratas, ou com
certificados que podiam ser convertidos em moeda estrangeira. Tratava-se de
moeda estrangeira não utilizada em viagem que eram trocadas por esses papeis
nas agências de comércio exterior soviéticas.
E
ainda existia o adicional da propina. A corrupção frutifica no adubo da
burocracia triunfante. Não se podendo exercer controles ilimitados sobre a
burocracia, o propinoduto é azeitado no toma lá dá cá. O paraíso da corrupção
era a Geórgia. Mas como esses dados não eram revelados, vindo à tona apenas
quando da destituição do secretário do partido local, nunca se soube a real
extensão do problema. No Azerbaidjão, se teve notícias de um cargo de
procurador de distrito ser vendido por 30 mil rublos. Notícias semelhantes
temos no Brasil, onde fiscais de rua do ICMS em São Paulo vendem seus postos
antes de se aposentar. Nota-se que um membro do Partido podia comprar o posto e
tornar-se o guardião da legalidade socialista na sua província. Mas, para ser o
chefe de distrito da milícia, era preciso desembolsar 50 mil rublos. Com esse
dinheiro era possível ser presidente de um colcoze (cooperativa de produção
agrícola), ainda que fosse um posto eletivo. Como já sabemos do Brasil, os
membros do colcoze davam seu sufrágio a pessoas ‘recomendadas’. O posto do
diretor do sovcoze (equivalente à confederação de sindicatos ou cooperativas)
valia mais: 80 mil rublos. Porém, o primeiro secretário do comitê do distrito
do Azerbaijão custava 100 mil rublos e o segundo secretário 20 mil rublos, pois
eram a nata da província, e esse dinheiro era distribuído entre os membros do
C.C. em Baku. E assim segue o autor, fornecendo os preços dos cargos públicos
da sociedade, onde um diretor de teatro conseguia o cargo com uma propina de 10
a 30 mil rublos; um Instituto de Pesquisas poderia ser dirigido por alguém
disposto a pagar 40 mil rublos. Um membro da Academia de Ciências do
Azerbaidjão poderia ostentar o honorável título por 50 mil rublos. Nas
Universidades ‘públicas’, do reitor ao estudante, havia taxas para conseguir
uma vaga ou posto. Esses valores não são suposições, mas pertencem a um
relatório confidencial apresentado por um membro do C.C. do PC do Azerbaidjão
em 1970.
Estabelecido
o propinoduto, as iniciativas para acabar com a corrupção apenas atenuavam
momentaneamente a voracidade da venda de cargos. Depois de algum tempo, os
funcionários nomeados para acabar com a corrupção terminavam imitando os
demitidos, o que demonstra que certas práticas são inerentes à burocracia e ao
sistema, e jamais acabarão se não se mudar todo o sistema. Pessoas da
nomenclatura conseguiam retirar parentes da prisão com correntes de ouro, relógios
e coisas do gênero.
Um
país, como a URSS, com permanente escassez de alimentos publicou, no
pós-guerra, uma obra intitulada Uma Alimentação Sadia e Digestiva que, não
obstante, tornou-se a bíblia dos gourmets da nomenclatura. Mas, como se alimentavam
os membros da cúpula do partido? “Os restaurantes do PCUS abrem às 11 horas,
servindo um almoço leve, com caviar, salmão e esturjão. Bebe-se cumis, uma
batida à base de leite de jumento. Um iogurte cremoso e açucarado não poderia
faltar. A cantina abre à uma da tarde. Uma orquestra barulhenta recebia
fregueses levemente embriagados arrastando os pés. Funcionários da KGB
controlavam a entrada, e garçonetes especialmente escolhidas iam e vinham com
os pedidos dos nomenclaturistas espalhados pelas salas. Um buffet reservado
permite a compra de produtos alimentícios que não se viam mais nas lojas desde
1928. Embora os pratos não fossem excessivos, era possível pedir quatro e até
cinco pratos, pagando-se o mesmo preço de uma refeição miserável e indigesta das
cantinas comuns, onde, à mesma hora, filas de trabalhadores esperavam para
comer durante o descanso do meio-dia. Embora o prédio do C.C. e o restaurante
estivessem apenas há 10 minutos a pé, a nomenclatura não dispensava os carros
oficiais para não se misturar com o povo que costumava apinhar-se em praças
próximas. Para democratizar o ambiente, era permitida a entrada, uma hora antes
do fechamento, dos quadros da Escola Superior do Partido e dos colaboradores da
Academia de Ciências Sociais” (p. 226).
A refeição
é inteiramente gratuita no Hotel do Departamento Internacional do C.C... Os
visitantes estrangeiros podem instalar-se no restaurante do Hotel, pedir tudo o
que lhe agrade, mandar trazer vinho, conhaque e outras bebidas fortes, tudo de
graça. O mesmo sistema se aplica a todas as ‘casas de hóspedes’ do CC nos
países socialistas e no interior do país (p. 227). Além disso, existem os
banquetes reservados aos dignitários do regime com sua riqueza e abundância de
pratos, tudo fornecido gratuitamente com os mais altos cuidados dietéticos.
Enquanto isso, os cidadãos soviéticos comuns são obrigados a fazer filar para
conseguir, a preço de ouro, produtos alimentícios de qualidade medíocre, no
abismo que separa a nomenclatura do resto da população (p. 227).
Outra
grande diferença social ocorre na questão da moradia. São conhecidos os
problemas graves de moradia, e o empilhamento de famílias nos apartamentos com
um único banheiro para dezenas de pessoas. Mesmo com a grande movida no setor
de construção nos anos 60 da era Kruvchev, o problema não foi resolvido em 2
décadas. Embora a norma habitacional reserve 9 m2 por pessoa, ela não é
seguida. Segundo as estatísticas, a divisão total do número de área residencial
construída pelo número de habitantes correspondia a apenas 7 m2/ habitante em
1975. As listas de espera por um apartamento são uma fila sem fim. E em Moscou?
Se na capital as estatísticas fornecem uma área de 15 m2/habitante, isso se
deve ao fato da grande quantidade de nomenclaturistas habitando ali.
Na
nomenclatura, conseguir um apartamento de 100 m2 por um preço ridículo é comum,
e além disso uma datcha, comprar um carro sem dificuldade, ou mesmo tê-lo
gratuitamente com um motorista de graça, e regalar com isso a família,
aproveitar gratuitamente de bons hospitais e repousar, sem despesas, a cada
ano, numa casa de repouso. O mais importante na diferença é como são
dissimulados os gostos pelo luxo e pela ostentação. Dizendo que precisam
receber convidados estrangeiros, os nomenclaturistas dispõem de belas e sólidas
construções, com elevadores e largas escadarias, cômodos espaçosos e móveis
importados da Finlândia só para eles. Mas quem recebe estrangeiros em casa em
um regime ameaçador?
Como
se todos esses privilégios não bastassem, um chefe de setor não recebe apenas
uma moradia, mas também uma casa de campo para repouso, a famosa datcha. Quem
pode ter uma datcha? Pelas leis todo o cidadão pode comprar um pedaço de terra
na periferia e construir ali sua casa ou comprar uma casa através de uma
cooperativa. Só que um operário precisaria economizar todo o salário durante
dez anos. Mas, como era uma sociedade de classes, a distorção é evidente por si
mesma. Diz o autor que se tratava de um privilégio reservado inicialmente aos
intelectuais que foi depois estendido a toda a burocracia, pois na URSS os
burocratas também eram considerados intelectuais, assim como nos EUA todo
jornalista é considerado escritor.
Por
uma sina do destino, um chefe de setor não precisa pagar pela datcha. Ela não
lhe pertence como propriedade pessoal. Ele simplesmente a recebe e passa a
ocupá-la vitaliciamente. A vantagem do sistema é que esta condição permite a
manutenção e limpeza também fornecidas gratuitamente pela estrutura do Estado.
Às vezes, cobrava-se um aluguel simbólico, especialmente nos condomínios de
férias à beira de lagos e praias turísticas. Nenhum habitante troca uma lâmpada
queimada ou ajusta um parafuso frouxo. Incomoda-se a administração pelos
mínimos detalhes. As mulheres não plantam uma flor para embelezar tais ambientes.
Tudo tem que ser feito pela administração. “Os nomenclaturistas se estiram em
suas redes, passeiam, jogam tênis ou vôlei, comem e bebem na varanda, vão ao
cinema” (p. 232). Do outro lado da cerca opaca do condomínio, na casa dos
comuns mortais, os habitantes passam seu tempo cavando, pregando, trabalhando
da manhã até a noite. Mas considerando que muitos burocratas tinham origem
camponesa, muito provavelmente gostavam de jardinagem, mas não o faziam, pois
sua posição social não o permitia: noblesse oblige. Entretanto, se um chefe da
nomenclatura compra uma casa, ele coloca em nome de seus pais, se compra um
carro, coloca em nome dos filhos maiores ou do irmão. Algo que já conhecemos
por aqui, sem a necessidade de comentários.
Quem
lembrar-se da época da telefonia estatal no Brasil terá suas recordações
tumultuadas por pesadelos: era preciso esperar de 2 a 4 anos para conseguir um
aparelho na empresa estatal, ou dispor de um bom pistolão. Caso contrário,
havia o mercado paralelo que funcionava impulsionado pela corrupção. Ora, um
dos símbolos de status na URSS era justamente o(s) telefone(s). Um
nomenclaturista não se contentava com uma só linha: uma para a comunicação
interna e outra para a externa. E, conforme o degrau na pirâmide, mais
aparelhos para funções governamentais importantes. Assim, era comum uma mesinha
ao lado da mesa de trabalho cheia de telefones. Esses aparelhos, chamados
‘Vertuchkas’, cresceram com a burocracia a ponto de serem impressos guias
telefônicos especiais só para a nomenclatura. A luta por um telefone no
automóvel foi encarniçada, especialmente numa época paranóica com a espionagem
e com as dificuldades técnicas para atender a todos os requisitantes. Mesmo
assim, a nomenclatura venceu as resistências e dispôs dessa facilidade nos
carros dos funcionários.
Segundo
Voslensky uma das características da postura do nomenclaturista consistia na
aparência de estar sempre ocupado e morrendo de tanto trabalhar. Esse tipo de
manifestação terminava sendo a psicologia do ambiente para justificar sua
vacuidade, semelhante ao ouvido dos membros do nosso judiciário para justificar
os 60 dias de férias por ano. Quando alguém falava para o outro sobre a sua boa
aparência, a resposta era sempre a mesma: “As aparências enganam” (p. 243).
Como a
nomenclatura utilizava os meios de transportes se eles eram comuns a todos? Em
primeiro lugar, apesar dos aeroportos e estações ferroviárias cheios, todos os
trens e aviões trabalhavam com uma reserva de lugares para os ‘passageiros de
última hora’. Enquanto isso, a população fazia fila ante os guichês às vezes
por dias seguidos. Como conta o autor:
“Nosso
chefe de setor tem sua passagem no bolso (obtida na seção de Transportes do CC
só para os membros, funcionando como uma agência de viagem), um Volga negro o
leva para a estação ou para o aeroporto. Ele não se dirige para o edifício
central, mas para uma sala reservada chamada ‘Sala dos Deputados do Soviete
Supremo’. Invenção original que cumula de legítimo orgulho os funcionários
encarregados de zelar pelos nomenclaturistas. Isso lhes pode parecer possuir um
arzinho democrático, bem no espírito da Constituição: não é uma sala para
‘altas personalidades’, mas uma peça simples, reservada aos representantes do
povo, aos quais todos nós damos os nossos votos. Mas quem duvida que, na maior
parte do tempo, não são deputados que se vão instalar naquela sala, de móveis
requintados, e tapetes macios, à qual se destina um pessoal especial,
principalmente os funcionários da Nomenclatura? Além do mais, o número de deputados
em viagem não é de tal ordem que justifique a manutenção de uma vasta rede de
tais salas. E, depois, era preciso resolver outro problema: como fazer com que
estrangeiros, perfeitamente conscientes de não serem deputados no Soviete
Supremo, fossem admitidos naqueles locais? Escreveu-se simplesmente, em inglês,
‘VIP Hall’ sobre a placa que assinalava em russo a existência daquela sala.
Que, depois, iria ofuscar-se em ser tratado de ‘very important person’?
Guiado
por um pessoal amável – bem diferente daquele que, nas outras salas, trata
asperamente os usuários –, nosso chefe de setor atinge diretamente o trem ou o
avião, alguns minutos antes que os outros viajantes sejam chamados para lá – é
preciso evitar que ele encontre o povo nas plataformas ou nos corredores de
embarque. No vagão-leito de primeira classe, ou na primeira classe do avião,
encontra seus pares. Na aterragem, a escada móvel é colocada, inicialmente, na
altura da primeira classe. Ele desce para a pista, inteiramente desembaraçado,
e as autoridades locais vêm recebê-lo. Só depois disso deixam-se descer os
outros passageiros. No desembarque do trem, ele é, infelizmente, obrigado a se
misturar com o povo – mas não é um grande trajeto a fazer na plataforma:
basta-lhe atingir a ‘Sala dos Deputados’ da estação de chegada. Na saída
reservada, um carro do C.C. do comitê da região ou da cidade do Partido espera
para levá-lo a uma residência reservada para ele. Eis um lugar ideal para
preparar a locução aos membros do Partido, abordando um tema clássico, como,
por exemplo: ‘A União do Partido e do Povo’ “ (p. 245-246).
Uma
análise percuciente sobre as diferenças de classe é feita sobre a educação. Lá
também os aspirantes à Academia de Ciências Sociais, se menos dotados, não
estão com tudo perdido: a seleção por critérios políticos se encarrega de
arrumar uma vaga para eles. O mesmo vale para as entradas de teatro, com as
reservas sempre atentas à disposição dos funcionários do governo. Enfim, toda a
sociedade está organizada para as diferenças de classe. E essas diferenças não
são duais. Ao contrário, fazem parte de uma pirâmide que torna uma pessoa tanto
mais privilegiada quanto maior sua ascendência na hierarquia funcional do
governo-partido. Não vou falar sobre o estilo de vida de Stalin, Beria, Molotov
e tantos dirigentes do partido. Segundo Voslensky, eles viviam como os
milionários americanos. Desde a primavera de 1922, Lênin tinha 6 carros na
garagem. A alienação de Stalin era tal, que sua filha Svetlana (“Vinte Cartas a
Um Amigo”) dizia que seu pai quando se referia aos preços das mercadorias
falava com os preços de antes da Revolução. A construção de datchas não foi
interrompida. A de Pitsunda, na orla do Mar Negro, construída para Kruvchev,
possuía um ancoradouro particular onde o líder russo desembarcava para
descansar pisando em um tapete vermelho sobre a areia. E as datchas numerosas
dos altos figurões eram mantidas por pessoal permanente sob constante aviso da
iminência da chegada de seu amo, mesmo que tal ocorresse apenas uma vez ao ano.
Voslensky
mostra em um capítulo a vida solitária dos dirigentes e sua total alienação com
a vida do povo. O isolamento acabava por embotar a consciência. O paliativo
usado por Stalin era a projeção de filmes soviéticos mostrando a vida do povo.
Kruvchev zombou de Stalin no famoso XX Congresso após sua morte. Mas Voslensky
garante que nem um nem outro conheciam na realidade como vivia o povo. Isso não
nos surpreende. Segundo Paul Johnson, Marx que escreveu sobre as condições de
vida da classe operária na Inglaterra nunca entrou em uma mina de carvão,
apesar de ter sido convidado diversas vezes para isso. Não era preciso: a
teoria já explicava tudo. “Pode-se caracterizar de maneira mais marcante uma
classe de indivíduos que consegue viver como estranhos no país que governam?”
(p. 267). Mas essa constatação não pode ser pública e revelada. Ao contrário,
sua realidade está na capacidade de ser invocada para a destruição de um
adversário, quando este é acusado de “falta de ligação com as massas”.
A
DITADURA DA NOMENCLATURA
Nos
altos escalões hierárquicos, a nomenclatura funcionava como se fosse uma teia
de clãs ordenada em pirâmide. Os mais poderosos nomeavam seus vassalos, que
mantinham fidelidade irrestrita às suas ordens. Como em uma partida de xadrez,
a nomeação de um postulante a um cargo mais elevado representava “um lance
complexo, uma prova de fôlego prolongada. Não são as qualidades políticas do
postulante (menos ainda suas competências funcionais) que são determinantes,
mas as manobras políticas” (p. 280). Mas para reduzir o Politburo e o
Secretariado do C.C. ao papel de auxiliares do Secretário-Geral só mesmo com a
concentração de poderes, momento em que a direção coletiva passa à autocracia
aparente dele. Basta analisar o que ocorreu com Stalin, Kruvchev e depois
Brejnev. Não era incomum, durante a entrega de medalhas e comendas aos
subordinados ouvir dos premiados expressões do tipo: “Queridíssimo camarada...
sempre senti muito orgulho, e o sentirei para sempre, de ter passado quase a
totalidade de minha vida sob sua direção” (p. 282).
“Com
isso, a luta pelo poder não ocorre através dos discursos inflamados das
democracias ocidentais. Ao contrário, é uma rede de intrigas sutil em que a
retórica só intervém na última fase, quando se trata de apagar, com formalidade
política, os erros de que se tornou culpado o adversário já vencido. Enquanto a
armadilha não estiver funcionando, não se tornando pública, esforça-se em
adormecer a desconfiança do rival através de demonstrações renovadas de
amizade” (p. 284).
Voslensky
narra em detalhes a luta pelo poder entre Brejnev e Chelepine no golpe de
gabinete que destituiu Kruvchev. Como vitorioso, Brejnev destituiu o clã
Chelepine com movimentação de cargos, reestruturação de funções, e,
naturalmente, com renomeação para postos distantes de Moscou.
Na
questão do poder de repressão da KGB, os relatos do autor são particularmente
interessantes. Ele não destoa dos demais escritores emigrados, apenas conta
detalhes do que conheceu pessoalmente. Podemos assim saber que Beria tinha uma
prisão em sua própria residência, com sala de tortura no subsolo para jovens
aterrorizadas com suas seções de sadomasoquismo. A crônica dos tchekistas
(primeiros membros da polícia política leninista) é sempre demonstrativa do que
acontecia nos porões do regime com os dissidentes – um espetáculo de horrores
com organização e procedimentos que não se devem subestimar, por ser um legado
da polícia czarista aperfeiçoado com requintes que deixariam a SS nazista
invejosa de seus resultados. Dentro da Lubianka (a famosa prisão de Moscou para
onde eram encaminhados os suspeitos), qualquer policialzinho de quepe se dava
ares de Gengis Khan. Pelo resto do país, a crônica do ex-ministro exilado em
1917 Pavel (Paul) Miliukov é digna de registro:
“Cada
destacamento da Tcheka tinha sua tortura preferida. Em Kharkov, os tchequistas
escalpelavam os prisioneiros, ou descobriam os ossos de suas mãos
arrancando-lhes as “luvas”. Em Voronej, colocavam suas vítimas em barricas
cheias de pregos no interior, e começavam, então, a fazê-las rolar. Ainda em
Voronej, aplicavam um ferro em forma de estrela de cinco pontas, em brasa, na
testa do supliciado, e colocavam nas cabeças dos padres coroas feitas de arame
farpado. Em Tsarytsin e Kamychin, cortavam os prisioneiros com serra. Em
Poltava e Krementchuck, faziam-lhes sofrer o suplício da empalação. Em
Lekaterinoslav, crucificavam-nos ou lapidavam-nos. Em Kiev, fechavam suas
vítimas em caixões contendo cadáveres em decomposição, enterravam-nos vivos e
os desenterravam no fim de meia hora” (p. 306).
Este é
o relato dos primeiros anos da guerra civil que consolidaram o poder dos
bolcheviques. Com semelhante legado, não se poderia esperar coisas muito
edificantes sobre o respeito aos direitos humanos nos anos de consolidação do
regime. De fato, a Rússia foi um dos poucos países que se conhece onde o Culto
da Delação foi incentivado pelo aparelho de Estado, promovendo a destruição de
famílias e a paranóia generalizada.
UMA
CLASSE QUE ASPIRA À HEGEMONIA MUNDIAL
Procurando
demonstrar que a natureza russa sempre foi a conquista territorial, já
analisada por Marx no tempo do Czarismo, e a ocultação de documentos do tempo
do Império para não permitir comparações com o presente comunista, Voslensky
trata o internacionalismo russo como sendo uma fusão da teoria marxista com o
expansionismo russo. Mas a questão da agressividade diz respeito à realpolitik
já demais conhecida por nós. Mesmo com a guerra fria, o autor insiste que a
Rússia, não obstante sua falta de escrúpulos em mandar para o matadouro milhões
de seus concidadãos, não cometeria a insensatez de se envolver em um conflito
onde sua ameaça fosse evidente, como no caso de uma guerra atômica.
Paradoxalmente, sua natureza de classe exploradora e parasitária é que a
protegia do aventureirismo no terreno de uma conflagração mundial. A fórmula é
expressa com a seguinte observação: a nomenclatura não quer a guerra, ela quer
a vitória. Isto significa uma estratégia de vencer sem combater, ou seja, de
subversão e levantes, de golpes e insurreições.
A
cronologia desses ataques evidencia a fórmula: 1920, a Polônia; 1939, a
Finlândia e de novo a Polônia; 1940: Letônia, Lituânia e Estônia; 1944, a
Bulgária; 1945, o Japão; 1956, a Hungria; 1968, Tchecoslováquia; 1979,
Afeganistão. Sem falar no caso de Cuba, na Intentona Comunista no Brasil, na
China e Coréia, e na guerra civil espanhola.
Essas
ações foram conduzidas sob o manto da chamada “coexistência pacífica”, uma
abordagem propagandística para o reconhecimento de 2 sistemas mundiais e da
necessidade de convivência. Assim, a détente internacional (a distensão) foi
uma maneira que descobriram para camuflar um conceito nebuloso para fins de
discursos políticos vazios. Voslensky enfatiza a necessidade soviética de
garantir a supremacia militar como meta de sobrevivência. Mas termina
reprovando a embriaguez chauvinista e hegemônica que só tem feito paralisar a
sociedade soviética em função de falsas conquistas e de um messianismo
ideológico superado.
A
liberdade e as boas condições de vida dos habitantes de um país são mais
importantes que o sentimento de grandeza de seus regimes. E pergunta se o Japão
militarista dos anos 30 e 40 seria maior do que o atual. Ou se os alemães
desejariam trocar seu estilo de vida atual pelo sentimento de
pseudograndeza
do Terceiro Reich. Isso lhe permite concluir que a tentativa hegemônica dos
nomenclaturistas estava fadada ao fracasso.
UMA
CLASSE PARASITÁRIA
A
nomenclatura é a classe em que o poder permite a ascensão à riqueza e não a
riqueza ao poder como no capitalismo. Eis aí uma explicação para o horror
causado pelo capitalismo na esquerda brasileira, e também porque ela está
sempre cercando o poder. O horror à privatização vem desse conhecimento, ou
dessa subjetividade como eles costumam dizer. Se o parasitismo é intrínseco ao
socialismo de Estado, Voslensky termina profetizando que sendo o regime por
natureza parasitário, todo o esforço de sobrevivência terminaria em vão, e o
Ocidente não só ultrapassaria a capacidade soviética em todos os aspectos pelo
seu próprio modelo de avanço tecnológico, como seria capaz de ser um fator
determinante na desintegração da URSS em 1992.
Uma
classe parasitária leva a sociedade para a desintegração quando ela começa a se
tornar mais cara. A parte do produto nacional que ela se outorga começa a
aumentar, enquanto, simultaneamente, o nível de contribuição para este produto
começa a baixar. No Brasil conhecemos muito bem o que ocorre com as estatais e
o próprio governo. Em determinado momento, as receitas de impostos não
sustentam mais o funcionalismo, as sinecuras e os privilégios da oligarquia.
Começa a inflação, a balança comercial acusa déficits insustentáveis e empréstimos
internacionais são necessários para equilibrar os gastos. O resto da história é
conhecido dos brasileiros.
Podemos
argumentar que um dos senões à sua obra são suas respostas para as causas do
parasitismo. Para Voslensky, o parasitismo é a natureza íntima da própria
classe. Mas sabemos muito bem que o parasitismo está intimamente relacionado
com o mundo feudal, e com o poder aristocrático, oligárquico e tirânico. O
parasitismo é um componente do burocratismo estatal que convive tanto mais
nocivamente na sociedade quanto maior sua presença na estrutura social. Por
isso, o livro ‘A Nomenklatura’ tem importância entre nós. A pergunta se podemos
ou não evoluir para o socialismo do tipo soviético pode ser respondida
afirmativamente, mas nunca com esse nome porque nem mesmo seus promotores o
desejam. Já estamos no meio do caminho e avançando cada vez mais. As propostas
sociais de reforma política defendidas pelos grupos socialistas e marxistas no
Brasil indicam claramente esta direção. Nossa distância do bolchevismo
encurta-se a cada dia à medida que reforçamos a estrutura estatal, os
cartórios, monopólios, sindicatos, organizações sociais saqueadoras da riqueza
do país, seja na forma assistencial ou na forma de corrupção, e que permitimos
um sistema de ensino calamitoso porque ideologicamente dominado por
esquerdistas obscuros.
O
único distanciamento possível do bolchevismo brasileiro está no caminho da
sociedade do conhecimento, tendo como modelo de convergência os países
asiáticos que se baseiam em sistemas produtivos, de capitalismo avançado,
canalizando as energias humanas para o ativismo, administração, criatividade e
invenção.
Sob a
imposição do capitalismo, os homens começaram a se mostrar atarefados,
enérgicos, vigilantes, ordeiros e cuidadosos com suas coisas. Perderam o lustro
intelectual, o brilho erudito, mas ganharam o bem-estar e a tecnologia. E a
moderna sociedade capitalista, a sociedade da informação, está novamente
colocando os seres humanos em uma nova ordem social, onde a cooperação e a participação
têm um alcance muito maior do que tudo o que já foi pensado racionalmente sobre
avanços sociais no passado. O brilho voltará com sua diversidade, e o
conhecimento será cada vez mais valorizado e determinante na vida social. Só
não embarcam nesta viagem os países preparados para frustrá-la.
"Retirado en la paz de
estos desiertos, com pocos, pero doctos, libros juntos, vivo en conversación
com los difuntos y escucho com mis ojos a los muertos" Quevedo
A
NOMENKLATURA – Michael S. Voslensky – Record – 4ª edição, c. 1980. Disponível
no site da estante virtual com preço entre R$6 e 12 reais.
Fonte: Blog do Carlos U Pozzobon
Assinar:
Postagens (Atom)