Por Leandro
Narloch (O caçador de mitos)
Tucanos dizem que
quem criou os programas de transferência de renda foi FHC; petistas insistem
que nada a existia no Brasil antes de Lula. Os dois partidos escondem a
verdadeira origem dos programas de renda mínima. A ideia que se tornou a
grande bandeira da esquerda nasceu com Friedrich von Hayek e Milton
Friedman – dois ganhadores do Nobel de Economia rejeitados pela própria
esquerda como os “os pais do neoliberalismo”.
A história é
desconhecida, mas não se trata de um segredo. Até Eduardo Suplicy admite a
influência neoliberal. No livro Renda de Cidadania, Suplicy afirma que
ele próprio se inspirou em estudos de economistas neoclássicos que conheceu na
década de 60, durante o mestrado em economia na Michigan State University.
Entre várias fontes de inspiração, como Karl Marx e Jesus, Suplicy menciona
Hayek e Friedman. Ele inclui no final do livro até mesmo uma entrevista com
Milton Friedman, realizada em 2000.
“Ser contra a
renda mínima só porque Friedman a defendeu é semelhante a ser contra o imposto
de renda só porque países capitalistas o aplicam”, escreveu Suplicy.
|
No Brasil de hoje,
a mordida do imposto começa com 7,5% sobre o que excede o salário de R$ 1900.
Na proposta de Friedman, quem tivesse o salário de R$ 1200 ganharia 7,5%
de R$ 700, ou R$ 52,50.
“As vantagens são
claras”, escreveu Friedman. “A prática explicita o custo que impõe à sociedade.
Opera fora do mercado. Como qualquer outra medida para mitigar a pobreza, reduz
o incentivo para que os pobres ajudem a si próprios, mas não o elimina
inteiramente.”
Os argumentos de
Hayek são mais teóricos, relacionados a sua visão de liberdade
humana. Hayek vê a propriedade privada e o livre mercado como as principais
armas contra a coerção e a submissão. Nesse raciocínio, quem não tem
propriedades ou renda fica vulnerável à coerção e ao abuso de poder. “A
garantia de uma renda mínima para todos, ou uma espécie de piso abaixo do
qual ninguém precisa descer, mesmo quando incapaz de se sustentar por si
mesmo, parece constituir uma proteção perfeitamente legítima contra um risco
comum a todos”, afirmou o austríaco.
Como uma ideia
liberal se tornou bandeira da esquerda?
A história ganha
coerência se voltarmos trinta anos. Nos anos 80, com o Muro de Berlim
ainda em pé, os militantes da esquerda defendiam reformas estruturais – luta de
classes, reforma agrária, fazendas de produção coletiva. Já os conservadores
diziam que o avanço do capitalismo livre das unhas do governo era o melhor
sistema para os pobres no longo prazo. O que, então, fazer com a miséria no
curto prazo? Atenuá-la com programas focados em atenuar a pobreza.
Não é à toa que a
maioria dos programas de transferência de renda surgiu logo depois da
queda do Muro de Berlim, quando ficou bem ridículo falar em luta de classes. A
expressão “redução da pobreza” ganhou as passarelas enquanto “revolução do
proletariado” ficou encostada no armário. Na América Latina, dezessete países
criaram programas desse tipo entre 1990 e 2010.
A ironia mais
saborosa dessa história é sobre o pioneiro dos programas de transferência na
América Latina. O Subsidio Único Familiar, implantado em 1981 pelo governo chileno,
dava dinheiro a mães pobres que mantivessem o filho na escola.
Pois é. O ditador
Augusto Pinochet foi o primeiro a implantar o programa que, décadas depois,
daria origem ao Bolsa Família.
Fonte: Veja
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente! Boa parte dos conhecimentos surgiu dos questionamentos.
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.