Para a grande maioria dos militantes, o socialismo surge
como uma paixão universitária, uma forma de se sentir herói de alguma coisa. Um
heroísmo de discurso fácil e poético que também oferece, especialmente na área
de humanas, muitas festas, viagens, o afogo dos professores e a atenção das
meninas − qual delas nunca se derreteu pela fala mansa, pelo jeitão desleixado
e pelas ideias “paz e amor” do doidão da faculdade que sempre tinha um baseado
no bolso? Posar de socialista nessa fase é, essencialmente, uma estratégia de
qualificação social e sexual. Mas, como a maioria das paixões, o socialismo
dura pouco. O mais comum é o socialismo desaparecer do coração das pessoas na
medida em que elas assumem responsabilidades tais como pagar alugueis,
impostos, funcionários, encargos e fornecedores, para só depois disso poder
separar algum dinheiro para suas próprias despesas. Algumas pessoas rasgam a
fantasia socialista logo que entendem que o que move uma sociedade não são as
“boas intenções” estatais ou partidárias, mas, sim, os esforços e as ambições
individuais. Porém, existem aqueles que por conveniências profissionais
estendem a perversão socialista para além da época da estudante. Uns conseguem
uma sombrinha confortável em governos, em ONGs, em partidos, em sindicatos, em
“movimentos sociais” ou constroem carreira artística à custa dos programas e
financiamentos do governo, enquanto outros apenas prosseguem a repetição dos
clichês socialistas para manter amizades e para dar vazão a recalques e invejas
inconfessáveis.
Apesar de não serem a maioria da sociedade como tentam nos
fazer crer, são eles que viabilizam todos os ataques contra a liberdade. Por
isso que eu sempre comemoro quando descubro que algum deles se curou, despertou
para a realidade, afinal, um socialista desiludido é um cretino a menos na
sociedade.
Um desafio: Quem é o autor do texto abaixo?
“Uma esquerda no governo não poderia comprometer-se a fundo
com Cuba e Venezuela. Ainda que admirasse os dois modelos, o que é um alto grau
de miopia, deveria levar em conta uma posição nacional. Uma esquerda no governo
deveria abster-se de levar o capitalismo a um outro sistema, mas, sim, tirar o
melhor proveito de suas potencialidades e reduzir seus impactos negativos. O
capitalismo pode alcançar altos níveis de inovação e criatividade, como nos
Estados Unidos, ou mesmo uma respeitável rede de proteção, como na
Escandinávia. Não vejo como transitar do capitalismo para outro sistema
econômico, exceto através da decadência e destruição de seus alicerces. E isso
nem na Venezuela vai acontecer. O sonho bolivariano encarnou num homem que
esmaga os opositores e conversa com passarinhos. Quando vão despertar? Quando
encontrarem Nicolás Maduro cantando salsas e merengues nas pizzarias do seu
bairro?”
O autor é ninguém menos que Fernando Gabeira, em artigo
publicado em março desse ano. O mesmo Gabeira que já pegou em armas para lutar
pela implantação de uma ditadura comunista no Brasil.
Além de já ter lido seu livro O Que É Isso Companheiro?,
1988, que fala sobre suas experiências na luta contra o regime militar, faz
algum tempo que acompanho seus artigos, sempre muito bem escritos e
contextualizados, cuja acidez nas críticas ao petismo evidencia também sua
regeneração intelectual, mostrando-o cada vez mais distante daquilo que moldou
sua vida até pouco tempo atrás. Não sou tão ingênuo ao ponto de crer que
Gabeira converteu-se completamente ao liberalismo, que logo se juntará à luta
contra o Estado, mas é evidente que ele, assim como muitos outros esquerdistas
de outrora, hoje caminha na mesma direção que nós.
Além de Gabeira, outro que vale comemoração especial é
Ferreira Gullar, que já vem se manifestando há alguns anos em favor da
iniciativa privada – “O empresário é um poeta que, em vez de escrever poemas,
monta empresas”, já escreveu. Um trecho de um de seus artigos na Folha, em
2012, também representa muito bem sua virada à direita: “Sabe a razão pela qual
a empresa estatal dificilmente alcança alto rendimento? Porque o dono dela –
que é o povo – está ausente, não manda nela, não decide nada. Claro que não
pode dar certo. Já a empresa privada, não. Quem manda nela é o dono, quem
decide o que deve ser feito – quais salários pagar, por quanto vender o que
produz −, tudo é decidido pelo próprio dono. E mais que isso: é a grana dele
que está investida ali. Se a empresa der lucro, ele ganha, fica mais rico e a
amplia; se der prejuízo, ele perde, pode ir a falência.”. Tais palavras não
causariam surpresa alguma se saíssem da boca de um liberal, mas, nesse caso,
sairiam da boca de um ex-militante comunista!
Avaliando de forma cética os comportamentos dos próprios
partidos e movimentos que defendiam, Gabeira e Gullar curaram-se. Enxergando
tantas incoerências e tantos absurdos, Gabeira e Gullar tomaram por conta e
risco próprios a iniciativa de caminhar no sentido contrário ao da esquerda.
Paralelo e eles e a tantos outros, temos as pessoas que romperam com o
socialismo logo que vivenciaram a “besta capitalista”. Pessoas comuns que por
ignorância criticavam o capitalismo ou personalidades da cena artística que
apenas surfavam a onda revolucionária. Caso exemplar é o do respeitadíssimo
Sergio Motta, que fez questão de explicar de forma clara e corajosa, numa
entrevista concedida a Juca Kfuri, o que o levou a abandonar o socialismo e a
defender o capitalismo logo que foi morar nos Estados Unidos.
O livro Por Que Virei À Direita, que reúne ensaios de João
Pereira Coutinho, Luiz Felipe Pondé e Denis Rosenfield nos oferece visões mais
profundas sobre o reposicionamento político-ideológico que podemos oferecer a
nós mesmos. Coutinho escreve: “A utopia política é uma chantagem sobre o tempo
presente com a alegada superioridade de um tempo passado – ou futuro”. Para
Coutinho, o grande pecado socialista é sua arrogância ao enxergar e tratar a
sociedade, especialmente os mais pobres, como um imenso e homogêneo rebanho que
deve ser feliz com qualquer ração lhes seja oferecida. Já Pondé justifica seu
posicionamento como reação à ignorância, à mediocridade, à covardia e à
hipocrisia daqueles que levantam as bandeiras vermelhas. “Minha primeira
intuição contrária ao chamado ‘pensamento progressista’ foi que este, por má fé
ou ignorância, desconhecia seu objetivo: o ser humano”, escreve o filósofo.
Denis Rosenfield justifica sua “virada à direita” a partir
de suas experiências cotidianas, especialmente depois que passou a acompanhar
as estratégias de manipulação social empenhadas pelos petistas em Porto Alegre.
Rosenfield relata como se apropriam de iniciativas honestas para transformá-las
em ferramentas políticas e ideológicas, substituindo, nos conselhos
participativos, representantes da sociedade por militantes do partido,
evidenciando a utilização dos processos democráticos para usurpar a própria
democracia.
Creio que cada pessoa deve sua cura do socialismo a
experiências particulares. Eu nunca fui de esquerda, apesar de ter passado
muitos e longos anos num ambiente acadêmico predominantemente socialista. Nunca
fui de esquerda, mas também, até poucos anos atrás, não militava por qualquer outra
causa. O que me levou a dedicar boa parte de meu tempo ao estudo e difusão das
ideias liberais foi o asco diante da hipocrisia e da demagogia de muitos amigos
e conhecidos dos tempos de faculdade. Asco ao ver tantos defendendo todo tipo
de absurdo em nome da preservação de pessoas, de partidos, de movimentos e de
governos que representam suas convicções ideológicas. Asco ao ver tantos sendo
contra o capitalismo enquanto usufruem cotidianamente de seus benefícios – em
vez de trabalharem para que o capitalismo beneficie mais pessoas, lutam por sua
destruição.
Do pobre recalcado que cobra que a sociedade seja rebaixada
a seu nível intelectual e produtivo ao rico pervertido que compra um barraco na
favela apenas para ter um lugar “descolado” para cheirar cocaína e transar com
as meninas, dos burgueses que ruminam discursos anti-burguesia aos que fizeram
do socialismo uma profissão, todos eles me motivaram a buscar na literatura a
sustentação para minhas intuições; primeiramente, para eu me distanciar também
intelectualmente de todas as incoerências que condeno, depois, como desabafo,
pois é, sim, um tanto dolorido viver entre tanta hipocrisia, entre tanta
cretinice.
A verdade é que a cura do socialismo começa ao enxergar o
que ele mesmo cria e alimenta, mas a plena libertação dessa enfermidade
intelectual – talvez espiritual – seja o exercício da maior coragem que cada um
de nós possa ter dentro de si, afinal, rejeitar o socialismo e, principalmente,
manifestar-se contrário a ele, nos torna inimigos de muitos, alvo de canalhices
proporcionais ao alcance de nossas opiniões.
Mas as recompensas são muitas… A cada dia, descobrimos outras pessoas
que também se libertaram ou que nunca se deixaram acorrentar pela cultura
socialista.
Fonte: Libertatum
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